Falta de terapia pode causar reincidência de crimes como abuso sexual, dizem especialistas

14/04/2010 - 19h56

Gilberto Costa
Repórter da Agência Brasil

Brasília – A omissão e a negligência do Estado no atendimento psiquiátrico e psicológico e no acompanhamento social de pessoas presas e ex-detentas podem expor a sociedade a novos crimes, como aconteceu no caso do pedreiro Adimar de Jesus Silva, responsável pelo assassinato de seis jovens em Luziânia (GO). A opinião é de especialistas na área penal e no tratamento psicológico de autores de violência sexual.

Adimar, beneficiado pela progressão de pena, é reincidente e não teve tratamento psicológico durante a prisão ou depois de voltar ao convívio social. “O atendimento psicoterapêutico se faz necessário para evitar reincidência. Só o confinamento não resolve problemas como o da compulsão. É preciso construir nova identidade e um novo projeto de vida. A função da prisão seria essa, mas não é o que ocorre”, afirma a psicóloga Mônica Barcelos Café, da Universidade Católica de Goiás, que desde 2005 presta atendimento a autores de violência sexual e pesquisa o tema.

A mesma opinião tem Karen Esber, pesquisadora e psicóloga da Secretaria de Saúde de Goiás. “É preciso pensar em algo diferente ao mero confinamento. Os gestores públicos precisam entender que é direito das vítimas e das potenciais vítimas fornecer tratamento aos autores de violência sexual”. As duas psicólogas destacam a responsabilidade de quem comete esse tipo de crime e a necessidade de punição.

Para o promotor José Carlos Miranda Neres Júnior, coordenador do Centro de Apoio Criminal do Ministério Público do Estado de Goiás, há na sociedade brasileira a ideia de que a solução para o crime é “prender as pessoas e afastá-las do convívio social”. Mas, segundo o promotor, as pessoas se esquecem de que os presos vão voltar para o convívio da sociedade. “Não existe pena perpétua nem pena de morte no Brasil. Eles vão voltar um dia. Se não houver investimento em uma política de reintegração social, o problema será sempre como uma bola de neve.”

Neres Júnior explica que o instituto da progressão penal, previsto na Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210 de 1984), existe para efetuar a ressocialização dos presos. “É como se fosse uma escalada para o sujeito atingir a liberdade plena”, define. A progressão penal sem o atendimento psicossocial, entretanto, é inócua. “A partir do momento que tem um sistema progressivo que não permite avaliação para acompanhamento, a ressocialização se torna uma falácia e o sistema progressivo deixa de ter fundamento”, aponta.

O promotor afirma que, além da falta de tratamento durante o período na prisão e, posteriormente, no cumprimento da pena nos regimes aberto e semiaberto, as decisões sobre progressão da pena tem sido tomadas sem o devido balizamento técnico. “Eu cito nominalmente o caso do estado de Goiás: quando você pede o exame criminológico, o estado não tem profissionais suficientes para fazer e fica aguardando mais de um ano para que o exame fique pronto.”

O índice de reincidência das pessoas que cumprem pena de prisão no Brasil é de cerca de 70%. Não existe estatística nacional sobre a reincidência após tratamento e acompanhamento especializados, inclusive para casos de abuso sexual.

 

Pesquisa feita com 3 mil pessoas encarceradas no Canadá, no ano de 2000, apontou 23,6% de reincidência entre aqueles que foram tratados. Outra pesquisa, feita em 2003 nos Estados Unidos, indicou que a reincidência entre quem completa o tratamento é seis vezes menor.

 

 

Edição: Lílian Beraldo