Índios da capital paulista acreditam que novas terras são solução temporária

08/08/2009 - 11h39

Daniel Mello
Repórter da Agência Brasil
São Paulo - As terras que serãoconcedidas às três comunidades guarani mbyá da capitalpaulista pela Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa) comocompensação dos impactos da construção doRodoanel Mário Covas são apenas uma soluçãotemporária para os problemas enfrentados pelas comunidades. Aavaliação é das lideranças indígenasdas aldeias.

A Dersaconcederá cerca de 300 hectares em terras, no valor aproximadode R$ 6 milhões divididos em duas áreas. Uma daspropriedades ficará com a comunidade do Jaraguá (300habitantes), na zona norte de São Paulo, e outra beneficiaráas aldeias Krukutu (300 habitantes) e da Barragem (900 habitantes),situadas em Parelheiros, na zona sul da capital.

Para aliderança indígena da aldeia Krukutu, Marcos Tupã,existe uma “pressão muito forte” sobre a comunidade devido à tendência de crescimento da região. Ele acredita quetransferir parte da população para o novo territóriopode não ser uma solução definitiva para osproblemas da falta de espaço e da ocupação em voltada aldeia.

“Eudiria que daqui a mais alguns anos estaremos passando pelo mesmoprocesso[falta de espaço e pressão externa]”.As terras indígenas da Barragem e Krukutu têm 26 hectarescada uma. Tupã acredita que seria necessário umaquantidade de terras ainda maior do que a oferecida pela Dersa paraque as comunidades tivessem a área necessária paramanter o modo de vida tradicional.

Essenovo espaço poderá garantir a sobrevivência dosguarani, segundo o administrador regional da FundaçãoNacional do Índio (Funai) em Bauru, Amaury Vieira. “Diante dasituação que eles têm hoje em São Paulo, as trêsaldeias, uma área de terra muito pequena e a dificuldade de ampliar isso, qualquer coisa que aumente esse territórioindígena é importante e necessário”.

Um doslíderes do Jaraguá, Pedro Luís Mecena, acreditaque a área é boa, mas teme pelo futuro dacomunidade. “Hoje é grande, mas daqui a dez anos pode serpequena”, avaliou. Ele defende que haja umplanejamento para longo prazo com o objetivo de evitar nova compressão daaldeia pela expansão urbana.

Oantropólogo Daniel Pierri, que trabalha desde 2005 com osguarani paulistanos, explicou que toda a etnia tem umaligação forte entre si, por isso é importanteresolver o problema de todos os índios. “A longo prazo, aúnica solução para um vida decente, digna paraas comunidades guarani é que todas as terras que precisam seridentificadas e demarcadas realmente sejam”, afirmou.

Quandofoi demarcada, em 1987, havia apenas uma família na terraindígena do Jaraguá, hoje são aproximadamente 80 ocupando os mesmos 1,7 hectare. Segundo Mecena, após aconstrução do Rodoanel e da Rodovia dos Bandeiranteshouve um aumento da ocupação em volta da comunidade,que acabou cercada por residências e empresas. O líder indígena afirma que esse adensamento atrapalha o dia a dia dos índios e interfere na preservação dos costumestradicionais.

MarcosTupã teme que um processo semelhante ocorra com as comunidadesde Parelheiros devido à construção do trecho suldo Rodoanel. A obra deverá passar a cerca de oito quilômetrosda aldeia, na zona sul de SãoPaulo. “A tendência é crescer a populaçãono entorno [da aldeia], [haver] ocupaçãode terras e especulação imobiliária”, afirmou

As comunidades do trecho sul ficam em uma região menos povoada que ado Jaraguá, a cerca de 30 quilômetros ao sul do AutódromoMunicipal de Interlagos. No entanto, de acordo com o gerente deGestão Ambiental da Dersa, já existe uma ocupação“consolidada” de 70 mil pessoas entre as aldeias Krukutu eBarragem e o local onde será construído o Rodoanel.

Combase nisso, ele nega que haverá impactos diretos doempreendimento. “Os nossos estudos nãoapontaram nenhum tipo de impacto sobre as aldeias da zona sul [porconta do Rodoanel]”, garantiu.

Para asocióloga Maria Bernadette Franceschini, que trabalhou noestudo etnoambiental para implementação do empreendimento, os impactos sobre as comunidades podem ser pequenos se oprojeto original de não haver acessos ao Rodoanel pela regiãode Paralheiros for mantido.

Eladestaca, no entanto, a existências de pressõeseconômicas para a abertura de acessos à rodovia naregião, o que poderia atingir as aldeias. "Édifícil acreditar [que o projeto original seja mantido].A tendência é agravar os problemas que já existeme criar outros”, avaliou.

Apesardisso, Franceschini não acredita que a comunidades do Krukutue da Barragem sejam “engolidas” pela metrópole. Para ela,mesmo que eles sejam envolvidos pela cidade, ali dentro os guaranicontinuam falando a sua língua e praticando a própriareligião.