Conflitos com países vizinhos refletem as transformações na América do Sul, diz Amorim

18/02/2009 - 16h01

Mylena Fiori
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Os recentes conflitos do Brasil com países vizinhos - como no caso da nacionalização das refinarias da Petrobras na Bolívia e da expulsão da Odebrecht do Equador - são consequëncias naturais das transformações políticas da região. A avaliação é do ministrodas Relações Exteriores, Celso Amorim.

“São mudanças importantes, como no Brasil foi uma mudança muito importante. Mas, de alguma maneira, como o Brasil tinha uma institucionalidade democrática mais bem estabelecida, essa transição se deu de maneira mais suave. Em outros países, ela se deu com maior turbulência”, afirmou o chanceler brasileiro, em entrevista ao programa 3 a 1 da TV Brasil, que vai ao ar nesta hoje (18) às 22h.

Amorim frisa que os atritos também resultam do aprofundamento das relações do Brasil com os países sul-americanos - uma das prioridades da política externa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde seu primeiro mandato. A proximidade se intensificou com a eleição de líderes de esquerda como Evo Morales na Bolívia, Hugo Chávez na Venezuela, Rafael Correa no Equador e, mais recentemente, Fernando Lugo no Paraguai.

“É como sair de um cemitério e ir para uma escola de samba. Há turbulência, dificuldades, diálogo, às vezes pode haver até estridências. O samba pode desafinar aqui ou ali, atravessar aqui ou ali, mas o fato é que há uma interação muitíssimo maior do que havia”, compara o ministro.

Como exemplo da maior interação com os países vizinhos, Amorim cita a disparada do comércio com a região nos últimos seis anos. Neste período, as exportações do Brasil para as nações sul-americanas, que representavam 12% de nossas vendas externas, ampliaram essa fatia para 20%. “É claro que quando você tem uma interação maior, também pode ter problemas, pode ter atritos, isso é normal”, reitera Amorim.

Ele acredita que as medidas adotadas pelos governos populares da América do Sul, ainda que contrariem interesses de empresas brasileiras, são legítimas e necessárias. “É um processo que reflete mudanças sociais que são necessárias, a região precisa de maior igualdade, os países tem que se sentir mais donos dos seus respectivos narizes e o Brasil tem que compreender isso, tem que fazer a política da boa vizinhança. Não gostamos de carregar um porrete.”.

Questionado sobre o desequilíbrio da reação brasileira nos casos envolvendo Petrobras e Odebrecht, Amorim frisou que o governo defendeu o interesse brasileiro da maneira adequada. O governo brasileiro foi alvo de críticas, especialmente da imprensa, porque teria se posicionado mais firmemente no conflito com o Equador. Nesse caso, o Brasil chegou a cancelar a missão do Ministério dos Transportes que discutiria o apoio brasileiro a obras de infra-estrutura viária naquele país.

Quanto ao conflito com a Bolívia, o chanceler garante que o governo se empenhou em uma solução para a situação da Petrobras e assegura que o atrito foi inteiramente superado. “Nunca faltou nenhuma molécula de gás no Brasil. Conseguimos contornar todos os problemas, as tropas foram retiradas em uma semana ou dez dias, fui à Bolívia para pedir que isso acontecesse e isso ocorreu”, relata.

“Acho que é um direito haver nacionalizações, desde que sejam respeitadas as regras. Com o Brasil, não tivemos problema. As empresas brasileiras estão bem e estão prosperando, talvez porque atenderam a condições que outras empresas que estavam acostumadas a ter lucros exorbitantes não tenham feito”, avalia o ministro.

Após o carnaval, o governo brasileiro se reúne com os representantes para tratar da Usina de Itaipu. O governo paraguaio de Fernando Lugo pede a revisão do contrato de criação da hidrelétrica binacional, quer o direito de revender a energia que não utiliza a outros países e pede que o Brasil pague valores de mercado pelo excedente adquirido do Paraguai. 

"Acho que o Paraguai vai continuar reivindicando algumas outras coisas. Temos que estudar e discutir tudo isso como bons sócios. Estamos ligados por Itaipu queiramos ou não, não adianta pensar como seria se tivéssemos feito de outra maneira", pondera Amorim no programa que vai ao ar hoje à noite. "Temos que trabalhar como bons sócios e encontrar soluções pragmáticas que atendam ao interesse dos países", disse Amorim.