Grajew aposta em discussões sobre sustentabilidade ambiental e neoliberalismo

25/01/2009 - 7h57

Amanda Cieglinski e Luana Lourenço
Repórteres da Agência Brasil
Brasília - Considerado “pai” do Fórum Social Mundial (FSM), o presidente doInstituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, Oded Grajew,acredita que desde a primeira edição em Porto Alegre,em 2001, sua criatura “amadureceu, se consolidou e se espalhou pelomundo”.Às vésperas da nona edição do FSM, quetrocou o Sul pela Amazônia e vai estar em Belém (PA)entre 27 de janeiro e 1° de fevereiro, Grajew aposta na discussãosobre a sustentabilidade ambiental e o esgotamento do modeloeconômico neoliberal como os principais assuntos deste encontro. “A escolha da Amazônia não foi fortuita. É o primeiro fórum que vai ter a questãoda sustentabilidade, do modelo econômico como predador do meioambiente, provocador do aquecimento global e do esgotamento dosrecursos naturais”, afirmou em entrevista à AgênciaBrasil.Nove anos depois de Porto Alegre, Grajew acredita que as bandeiras do fórum não sofreram mudanças radicais “porquenão são lutas conjunturais, são estruturais”.No entanto, o empresário reconhece que a relaçãoentre o evento e os governos, principalmente na AméricaLatina, mudou desde 2001. Grajew inclusive atribui ao fórumparte da responsabilidade pela nova configuraçãopolítica do continente, com nomes históricos daesquerda latino-americana ocupando as presidências.“O fórum tem a ver com isso porque naquela época(2001) o neoliberalismo era odominante. O Carlos Ménem, da Argentina, era o herói doFórum Econômico Mundial, era o modelo apresentado paratodos os países em desenvolvimento. E ele acabou levando aArgentina à bancarrota”, avalia.Na entrevista, Grajew também comenta a expectativa do FSM emrelação à gestão de Barack Obama nosEstados Unidos, a presença de nomes como os presidentes LuizInácio Lula da Silva, Hugo Chávez e Evo Morales e orisco de transformação do fórum em um palanquepolítico.Leia a seguir os principais trechos da entrevista com Oded Grajew.AgênciaBrasil: Quais são ostemas que deverão dominar as discussões do FórumSocial Mundial este ano?OdedGrajew: Vai ser primeiro a questão da sustentabilidade, aquestão do modelo econômico como predador do meioambiente, como provocador do aquecimento global e do esgotamento dosrecursos naturais. A escolha da Amazônia não foi umaescolha fortuita. É uma escolha exatamente para estar presenteno lugar onde essas coisas estão mais presentes, num lugar tãosimbólico para o meio ambiente mundial, para o clima mundial.ABr:Da primeira ediçãoem Porto Alegre até hoje, o que o senhor acha que mudou no fórum?Grajew: Desde o momento em que eu tive a idéia do FórumSocial Mundial, em janeiro de 2000, se passou um ano, pouco tempoaté a concretização em Porto Alegre, em 2001. Delá para cá, o que aconteceu foi que o fórum semundializou, se espalhou pelo mundo. No começo era PortoAlegre, depois começou a ser internacionalizado, andou pelomundo, teve várias edições mundiais fora doBrasil. Enfim, um processo que se espalhou e que acabou construindouma série de redes pelo mundo. O fórum virou umarealidade, um ator importante e se consolidou com uma série deconseqüências e de resultados.ABr: As bandeiras defendidas pelo fórum, as lutascontinuam as mesmas após quase 10 anos?Grajew: Sim, porque as lutas do fórum não sãolutas conjunturais, são estruturais. Então nãohá nenhuma luta para uma ação imediata de algumacoisa. Como bandeiras principais, um outro mundo possível ondeos valores da democracia, da justiça social, dodesenvolvimento sustentável, da ética, isso continua,como a questão da solidariedade versus competição,o social como determinante das ações e nãoo econômico e não submetido ao econômico; issocontinua. O fórum trabalha numa mudança cultural, issoleva um tempo.ABr: O senhor acredita que o fórum pode ser usado comopalanque por alguns políticos? Grajew: Éum espaço da sociedade civil, governantes que tem a ver com osprincípios do fórum são bem-vindos, mas eles sãoconvidados das entidades, não há atividadesgovernamentais. De um lado, é bom que essas pessoas estejam láporque inclusive há fóruns paralelos, há  fóruns dasautoridades locais onde vão muitos prefeitos, há fórunsparlamentares. Agora, há sempre o risco de desviar a atençãodo conteúdo do fórum, isso é muito comumacontecer na mídia. Há uma tendência de vocêfolclorizar o fórum, de dar atenção para umrapaz que viajou 300 mil quilômetros para tocar violãona beira do rio. Desvia a atenção do imenso conteúdodo fórum e, muitas vezes, presenças de governantes tambémacabam desviando a atenção do que realmente ocorre nasoficinas, nas palestras, nas conferências. Faz parte porque todopolítico busca um palanque, isso não é sóno Brasil, mas em qualquer país do mundo. Mas isso faz parte,quanto mais gente esteja lá e que tem a er com a carta deprincípios do fórum é melhor.ABr:Os presidente Lula, EvoMorales, Hugo Chávez e Fernando Lugo vão participar do fórum. Essa nova configuração política daAmérica Latina é diferente da que existia na primeiraedição, em 2001?

Grajew: Claro. E o fórum tem a ver com isso porquenaquela época era o neoliberalismo que era dominante. OCarlos Ménem [ex-presidente da Argentina] era o heróido Fórum Econômico Mundial, o modelo apresentado paratodos os países em desenvolvimento. Todos diziam: 'Olha, temque seguir o Ménem porque ele sabe o que está fazendo'.E ele acabou levando a Argentina à bancarrota. O mapa políticoda América Latina era completamente diferente e oneoliberalismo era idolatrado naquela época. E o FórumSocial Mundial, por estar nos três primeiros anos em PortoAlegre, teve e tem muita presença latino-americana; ebasicamente todos os atuais presidentes que você citou faziamparte do fórum, iam para o fórum, o próprioLula. O fórum ajudou muito a mudar o mapa político naAmérica Latina, isso não tem a menor dúvida.ABr:Essa relação maispróxima entre o fórum e as lideranças políticasmuda o tom das discussões?Grajew: Exatamente. Porque uma coisa é você mudaruma política, outra coisa é você implementarpolíticas. Mudou. Mudou o quadro político não sóda América Latina, mas do mundo. Hoje, na América Latina,é muito difícil achar alguém que adote as tesesdo neoliberalismo e hoje acho que é muito difícilalguém no mundo adotar essa tese, depois dessa bancarrotafinanceira. Às vezes, é preciso um grande desastre paraque as pessoas percebam que o caminho estava errado. Hoje, é muitodifícil defender as idéias que o Fórum EconômicoMundial defendia naquela época.ABr: Onovo presidente norte-americano Barack Obama também deveráser assunto das discussões do fórum?Grajew:Ele vai ser parte da discussão como uma possibilidade demudança. Ainda não dá para saber o que vaiacontecer, está muito em cima. Vamos ver o que vai dar,mas sempre com a expectativa do que vai resultar.