Personalidades negras avaliam data dedicada ao combate à desigualdade racial

20/11/2008 - 15h21

Da Agência Brasil

Brasília - Músicos, atores, intelectuais e autoridades negras foramconvidados pela Agência Brasil a avaliar o significado do Diada Consciência Negra para o combate às desigualdadesraciais no país.Eles comentam a situação do negro no Brasil e acreditamque a data ajuda a população afro-descendente a sereconhecer como parte importante da formação e dahistória do Brasil.Na opinião doator MiltonGonçalves, a imprensa e a sociedade não deveriam sepreocupar em ouvir o negro somente no dia 20 de novembro mas promoveros avanços necessários a esse segmento da população,como por exemplo, o reconhecimento das terras quilombolas, durante o ano todo. “Eu gostaria que no ano que vema gente não estivesse tão preocupado com o 20 denovembro, mas que pudéssemos festejar, homenagear algumprogresso. Ainda está no Congresso a posse definitiva dasterras daqueles que estão nos quilombos, isso vem sendo adiadosempre e não acontece absolutamente nada”O ator lamentou o fato de que os negros correspondem "à metade da população do Brasil,mas não têm, por correspondência a metade do que éproduzido no Brasil" e afirmou estar decepcionado com a falta demudanças“Issome deixa muito angustiado, porque será que eu vou para o“andar de cima” sem poder notar, de maneira nenhuma, alguma umamelhoria na situação do negro? Ultimamente tem-sefalado e elogiado muito a eleição do Barack Obama nosEstados Unidos. Lá, o negro representa 12% da população.Aqui, nós somos mais da metade. Onde está o nossoBarack Obama? Essa é a minha dúvida. Não estouamargurado, estou apenas decepcionado porque, entra ano e sai ano, agente não vê um saldo qualitativo, a gente não vêabsolutamente nada”.Parao cantor Martinho da Vila, o dia 20de novembro é importante porque homenageia Zumbi dosPalmares, segundo ele, um herói nacional nomesmo nível de Tiradentes e que agora está sendoreverenciado.“Éum dia de reflexão, por isso, fala-se que é o Dia daConsciência Negra. Mas, acima de tudo, é o dia de Zumbidos Palmares. Eu prefiro até dizer que o 20 de novembro éo dia da consciência racial, porque não é umacausa só dos negros.PauloLins, autor do livro Cidade de Deus, considera a data justa.Numpaís como o Brasil, que teve 400 anos de escravidão, élógico que depois de cento e poucos anos o negro estáem uma situação pior. Tem pouco acesso a todos os bens,sejam materiais, culturais ou educacionais, então esse dia marca,na vida do Brasil, essa luta do negro para conseguir ter acesso aoque o resto da sociedade tem." A atriz Zezé Motta avalia o Dia da Consciência Negra como a expressão máxima da lutado negro no Brasil "pela sua dignidade, pelo seu espaço, pelos seusdireitos." Para ela, apesar de avanços em algumas áreas, ainda é necessário lutar muito para resolver questões como o salário e e a saúde população negra."As pessoas sempre me perguntam se eu acho que ascoisas melhoraram desde o início do movimento negro. E da nossa lutapara cá as coisas estão mudando devagarinho. Por exemplo, no caso damídia, a gente já vê no horário nobre a distribuição dos papéis nasnovelas, a gente já percebe uma preocupação dos autores em diversificaros papéis dos negros. Então a gente jáavançou, já temos conquistas, mas ainda temos muita luta pela frente. Aquestão do salário do negro que é mais baixo, a questão da atenção desaúde da população negra".Ao falar dos avanços, Zezé lembrou de mudanças ocorridas na publicidade contando uma situação vivida por ela na década de 60. "Hoje você já vê negro fazendo publicidade de produtosdiversos que a gente nem podia sonhar em alguns anos atrás em ver umnegro fazendo publicidade de celular, de jóias, de tecido. Aliás, há 40anos eu fiz uma foto para uma loja de tecidos que foi recusadapelo cliente dizendo que a clientela dele era de classe média e nãoaceitaria sugestões de uma negra."Parao ministro do Superior Tribunal Justiça (STJ), Benedito Gonçalves adata é um modo de unir as pessoas da raça negra e mostrar aos outros “queé possível chegar lá”, desde que eles tenhamelevadas a auto-estima e a ousadia. Segundoo magistrado o momento de preservação da dignidade dapessoa humana, de igualdades de direito inaugurado com Constituiçãode 1988 é um dos fundamentos para que os negros possam pensar“eu posso vencer”.“Aodeficiente físico falta alguma coisa, falta um braço,uma perna, um olho e ele com a perseverança, com ousadia eauto-estima alta, entra por exemplo naquela cota de concurso e passa.E a questão do negro, o que falta? Ele tem braço,perna, inteligência, olhos. O que falta a ele éexatamente isso ter momentos como esse para sentir a auto-estimaelevada, apresentar-se à sociedade”.Gonçalvesfez questão de ressaltar que não é sua posiçãode destaque que o habilita a pensar dessa forma e defendeu o papel do Estado no combate a desigualdade racial.“Alguémme disse que para mim é fácil falar isso, porque sou ministro do Superior Tribunal de Justiça, mas eu nãocomecei pelo teto, comecei pelo piso. É preciso tambémque haja um incentivo do Estado, que hoje está muitoconsciente desse papel, seja apoiando os movimentos negros oucolocando na legislação essas proibiçõesde desigualdade”, afirmou o ministro que nasceu no subúrbiodo Rio de Janeiro.