Mylena Fiori
Enviada Especial
Pequim (China) - Oshutongs são considerados a alma de Pequim. Morada da elite da cidade no passado, esses labirintos de ruelas povoadas de casinhas amontoadasestão sendo postos abaixo pelo governo em nome da modernização. Dãolugar a conjuntos residenciais semelhantes aos nossos antigos prédiosdo extinto Banco Nacional da Habitação (BNH).Eles existem há mais de 700 anos. O nome vem do mongol – hong tong, que significa poço. Inspiradosnos palácios imperiais, são compostos por construções quadriláteras,com um pátio no meio. Endereço de altos funcionários do imperadordurante as três últimas dinastias, passaram a ser habitados porburgueses e aristocratas. Com a Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung,cada casa passou a alojar diversas famílias. Ocrescimento desordenado e a construção de “puxadinhos” transformaram oshutongs em verdadeiros cortiços em extinção. Especialmente depois doarrastão urbano promovido para preparar a cidade para os JogosOlímpicos. Previsão não confirmada indicada que 70% dos velhosquarteirões de Pequim seriam colocados abaixo até este ano. Não se sabeao certo quantos, mas a verdade é que muitos desapareceram do mapa dacapital.Alguns,no entanto, foram preservados em nome do turismo e ganharam roupa novapara os Jogos Olímpicos. É o caso dos hutongs na região do Hou Hai, nazona leste de Pequim – uma das mais prósperas nos tempos das dinastias.Ali, os muros foram pintados de cinza e as portas de marrom, as ruasasfaltadas e os moradores recrutados como cidadãos voluntários. NoNanguanfang Hutong, uma antiga casa de arquitetura típica chinesa, comtijolos e telhados cinza e um pátio interno no centro, foi reformadaespecialmente para receber os turistas olímpicos. Para mostrar como oschineses viviam, explica a guia. Paga-se ingresso para entrar (20yuans, equivalentes a R$ 5).Quem quiser uma experiência mais pitoresca pode alugar algum dos inúmeros Rickhaws (aquelasbicicletas com lugar para passageiros), com direito a motoristauniformizado e preço internacional – 180 yuans (R$ 45) por um passeiode meia hora. Omovimento traz dinheiro, mas incomoda a vida daqueles que ainda moramali, em cortiços que sobrevivem à especulação imobiliária por trás dosmuros recauchutados.Éo caso do motorista, Liu ChunHong – guia há sete anos. “Ficou umpouco barulhento, atrapalha um pouco os moradores”, admite. Ele tambémnão gosta da pintura que esconde os originais tijolinhos cinza. “Eramais bonito antes”, diz.Liuconta que muitos conhecidos tiveram que mudar de outros hutongs. Ali,felizmente, o governo decidiu preservar. Mas não faltam investidoresestrangeiros tentando comprar as casinhas a peso de ouro paraabrir prósperos negócios à espera de euros, dólares, yens. “Quem temmuito dinheiro vem aqui e oferece fortunas pelas casas”, conta. Elenão descarta vender a dele, mas diz que também depende dos vizinhos.Nada menos do que 10 famílias ainda vivem numa dessas antigas casas compátio no meio onde outrora vivia uma família só. “Até a Revolução Cultural aqui era uma região muito rica. Acho que no futuro voltará a ser”, prevê. Sabedoria chinesa.Leiamais matérias da enviada especial Mylena Fiori e acompanhetoda a cobertura olímpica multimídia da equipe daEmpresa Brasil de Comunicação no siteChina 2008.