Estudo aponta média de um milhão de abortos ilegais ao ano no Brasil

02/07/2008 - 15h57

Paula Laboissière
Repórter da Agência Brasil
Brasília - O Brasilregistra, ao ano, 250 mil internações de mulheres porcomplicações decorrentes de abortos ilegais. O númeroleva à estimativa de cerca de um milhão de abortosrealizados no país anualmente. Os dados fazem parte do estudoDossiê sobre a Realidade do Aborto Inseguro em Pernambuco: oImpacto da Ilegalidade do Abortamento na Saúde das Mulheres enos Serviços de Saúde do Recife e Petrolina, divulgadohoje (2) pelo Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFemea).

“Encontramosuma situação bastante dramática. Visitamos duasmaternidades, que atendem mulheres que recorrem por complicaçõesde aborto. O volume de casos nessas unidades é muito grande e,muitas vezes, comparável ao número de mulheres quechegam para ter filhos”, diz Beatriz Galli, coordenadora do estudo.

Eladestaca que as mulheres internadas por complicaçõesdecorrentes de abortos sofrem com a discriminação –às vezes, segundo a especialista, chegam a ser colocadas noúltimo lugar da fila, durante o processo de triagem. Beatrizrelata que, em Pernambuco, houve caso, inclusive, de erro dediagnóstico. Uma mulher que deu entrada no hospital, mas nãoexplicou que tipo de procedimento havia provocado o sangramento vaginal, que apresentava,chegou a ser diagnosticada com dengue hemorrágica e leucemia.Em seguida, foi levada ao Recife, onde acabou morrendo.

“Depoisé que se descobriu que ela tinha provocado um aborto e estava com umsangramento por conta disso. É uma situaçãomuito grave, que mostra um descaso do Estado e o impacto dacriminalização do aborto no dia-a-dia dos serviçosde saúde”, disse Beatriz Galli.

A coordenadora do estudo lembra que a questão ainda é muito debatida noCongresso Nacional sob um fundo religioso, quando deveria ser abordadacomo uma questão de saúde pública. Beatrizacredita que também não adianta continuar tratando oassunto dentro da esfera penal.

Odeputado Paulo Rubens Santiago (PDT-PE), que participou das visitas aPernambuco e da elaboração do dossiê, afirma quea visão exclusivamente penal – que criminaliza a prática– não tem impedido a realização de abortosno país. Para ele, descriminalizar o aborto é “dar umpasso adiante” na construção de uma políticade saúde, que trate as mulheres em situação deaborto como cidadãs, e não como criminosas.

“Temosque conviver com parlamentares de vários credos religiosos eateus, mas não estamos em uma disputa. O que temos quediscutir é um Estado que olhe para as pessoasindependentemente do seu credo religioso e que formule políticasuniversais”, disse Santiago.

A Comissão deConstituição, Justiça e Cidadania da Câmara realiza duas audiências públicas nesta semana para debater o PL1135, de 1991, dos ex-deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling, quesuprime do Código Penal (Decreto-Lei 2.84, de 1940) o artigo quedefine como crime o aborto provocado pela gestante ou com o seuconsentimento.