Mylena Fiori
Enviada especial
Acra (Gana) - A alta nos preços mundiais dos alimentos é um fato. Como tirar proveito disso uma vez que a agricultura ainda é a base da economia de muitos países em desenvolvimento? E como reduzir a vulnerabilidade destes países frente às cotações internacionais?As indagações permeiam os debates da 12ª Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad), que se realiza desde o dia 20 na cidade africana de Acra, em Gana. É unânime a avaliação de que é preciso incentivar produtividade, diversificação, investir em infra-estrutura logística e agregar valor à produção dos países em desenvolvimento."Reconhecemos que a produção e o comércio de produtos básicos são o sustento de milhões de pessoas, especialmente na África. A dependência dos produtos básicos é um sintoma de uma economia não muito competitiva", disse o chefe da delegação da Comissão Européia, John Clarke. "A solução, no longo prazo, tem que ser a combinação de aumento da competitividade em produtos básicos e a diversificação, para que não dependam excessivamente de determinados produtos".Como exemplo de ações nesta direção, citou programas da iniciativa Aid For Trade (Ajuda para o Comércio), como reforma na gestão das aduanas, apoio ao setor produtivo e ações sistêmicas orientadas para o investimento, como construção de infra-estrutura de transporte e energia e apoio aos setores produtivos.Clarke também acredita ser preciso criar condições para que o mundo em desenvolvimento possa se beneficiar de maneira positiva e sustentável dos elevados preços das commodities agrícolas. "É necessário que os países que se beneficiam deste aumento de preços comecem a pensar no investimento sustentável de longo prazo deste lucro, e em meios para distribuir os ingressos de maneira equitativa entre a população", opinou. Para que isso ocorra, segundo ele, é necessária uma governançaestatal de qualidade.Carlos Márcio Cozendey, diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, defendeu o uso da tecnologia para melhor proveito da alta dos preços de produtos básicos. "Há quem pense que a Agricultura é menos importante do ponto de vista da tecnologia e é justamente o contrário. Pode e deve ser intensiva do ponto de vista tecnológico", afirmou.A carência logística dos países em desenvolvimento foi apontada por diversos países. O ministro de Comércio da Uganda, Nelson Gaggawala, citou a carência de infra-estrutura de armazenamento e transporte como um dos grandes empecilhos para os países mais pobres."Se queremos tirar proveito dos preços internacionais temos que buscar os alimentos nos lugares distantes onde são produzidos, mas para isso precisamos de estradas", exemplificou. Segundo ele, a falta de tecnologia e mesmo de frigoríficos para preservação de alimentos não permite competitividade à produção de países como Uganda. "Não podemos competir com a tecnologia do Brasil", exemplificou.Na avaliação do ministro de Comércio Internacional e Desenvolvimento de Exportações do Sri Lanka, G. L. Peiris, a falta de infra-estrutura logística é, inclusive, uma das principais causas da escassez de alimentos no planeta. "As causas da escassez alimentar tem menos a ver com produção insuficiente do que com problemas de distribuição", afirmou. "Estamos prestando atenção especial aos mecanismos de entrega", relatou. Também defendeu que se agregue valor aos produtos básicos. "Não podemos competir com economias maiores produzindo os produtos habituais, temos que agregar valor. O Sri Lanka utiliza o látex para produção de botas cirúrgicas e pneus , por exemplo, agregando valor a nossos produtos de exportação", exemplificou.A mesma estratégia foi defendida pelo embaixador argentino Alberto Dumont. Ele lembrou que foi isso que a Argentina fez nos anos 80, quando não pode mais exportar carne congelada em razão dos elevados subsídios europeus. "Os frigoríficos argentinos buscaram um novo produto e hoje vendem quase exclusivamente cortes de qualidade ou carne processada".