Marco Antônio Soalheiro
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Um grampo ilegalfoi implantado em 2001, supostamente, por um delegado da PolíciaCivil do Rio de Janeiro no escritório do seu ex-sócio, então presidente da seccional da Ordem dos Advogados doBrasil. Sete anos depois, o caso, que resultou em procedimentosadministrativos e criminais não concluídos, começou hoje(11) a ser apurado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Escutas TelefônicasClandestinas na Câmara dos Deputados. “Há duasvertentes: um processo e um inquérito policial para investigar a violação de preceito constitucionalfundamental que precisamos saber em que pé se encontra”,disse o relator da CPI, deputado Nelson Pellegrino(PT-BA), para quem o caso se constitui em uma clássica violaçãoilegal de sigilo. Em depoimento hoje àCPI, a vítima do grampo, o advogado Octávio AugustoBrandão Gomes, relatou ter descoberto o esquema em seuescritório em março de 2001, quando assumiu apresidência da OAB-RJ. O gravador encontrado junto ao telefone continha as iniciais AN, que segundo Brandão se referem ao delegado Alexandre Neto, lotado na DivisãoAnti-Seqüestro da Polícia Civil fluminense. “Atribuo o grampo ainveja, rancor e ódio, porque ele [Alexandre Neto] é meu ex-sócio e eu não queria que freqüentasse mais o escritório, por ser delegado. Minha vida é um livroaberto, mas ele queria se vingar e me chantagear”, afirmou Gomes, após ressaltar que quando presidiu a OAB determinou a perda dacarteira de advogado de 95 profissionais envolvidos com crimeorganizado. Brandão alegou ter levado a denúncia da interceptaçãoilegal imediatamente à Corregedoria Geral Unificada das PolíciasMilitar e Civil e do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro, que determinou também a abertura de uminquérito criminal. O delegado Alexandre Neto prestoudepoimento em que confirmou ser o dono do gravador, mas negou a autoria do grampo. E o caso acabou arquivado por falta de provapericial, o que, para Gomes, reflete uma posturacorporativista da corregedoria: “A máquina das corregedoriasnão funciona. Há um corporativismo, um certo descaso,uma certa inércia, e não uma vontade de concluir aapuração de um ato ilícito, garantindo-se ampladefesa e o devido processo legal.” Em 2006, um outropolicial civil fluminense, Marco Antônio Nunes Pereira,procurou o Ministério Público estadual e a Corregedoria para acusar o delegado Alexandre Neto de ser oautor intelectual do grampo no escritório de OctávioGomes. A partir daí foi aberto novo processo naCorregedoria e determinado o desarquivamento do inquéritocriminal. Mas como ambos seguem sem conclusão, a CPI vaienviar ofício aos responsáveis. “Vamos requisitar acópia de todos os autos e aí poderemos pedir o depoimento dos demais envolvidos", informou o relator. "Há fortes indícios da participaçãodo delegado Alexandre Neto e fica a suspeita de um certo corporativismo de proteção ao delegado”,acrescentou. Para Nelson Pellegrino,há pontos no processo a serem esclarecidos: “Amotivação deste grampo não ficou muito clara. Odoutor Otávio alega desavença com um ex-sócio, mastem aspectos pouco explicados.”A reportagem não conseguiu contato com Neto. Na delegacia da Divisão Anti-Seqüestro, recebeu a informação de que o delegado não esteve lá hoje. Em setembro do anopassado, Alexandre Neto foi baleado em frente à casa dele, em Copacabana,zona sul do Rio. Como usava colete à prova de balas,apenas a mão direta ficou ferida. Ele é autor de um dossiê sobre atividades ilegais de um grupo ligado ao ex-chefe de polícia ÁlvaroLins e à chamada máfia dos caça-níqueis. Mas,segundo o relator da CPI, as motivações do atentado nãosão, a princípio, objeto das apurações daComissão: “A linha deinvestigação é saber como os grampos ilegaisestão sendo executados no nosso país e o aparatotecnológico à disposição desta práticacriminosa.”