Consumo consciente de informações

30/11/2007 - 9h44

Paulo Machado
Ouvidor da Radiobrás
Brasília - Em março deste ano a Agência Brasil publicou a grande reportagem “Consumo Consciente”, com algumas dicas de como o consumidor pode se informar por meio da rede mundial de computadores sobre a origem de alguns produtos largamente consumidos como: óleos vegetais, roupas, tênis, perfumes, matinais, produtos de limpeza e refrigerantes,  industrializados por 58 empresas multinacionais.A reportagem reproduziu listas de produtos elaboradas por organizações ambientalistas e de direitos humanos que pesquisaram as cadeias produtivas em busca de emprego de trabalho escravo ou infantil, utilização de organismos geneticamente modificados (OGM), popularmente conhecidos por transgênicos, desrespeito aos direitos trabalhistas e agressão ao meio ambiente.A Agência enviou correspondência a todas as empresas convidando-as a responder às acusações que lhes foram imputadas. Poucas se manifestaram, mas aquelas que o fizeram tiveram suas respostas publicadas juntamente com as acusações. Nos últimos trinta dias dois leitores se manifestaram sobre a reportagem a esta Ouvidoria. Robson Fernando reclamou que faltou divulgar duas razões a mais para boicotar produtos de algumas dessas empresas: desmatamento da Amazônia e a grilagem de terras. A esserespeito a redaçãorespondeu: “A proposta da listaapresentada em ‘AlgunsBoicotes’ nãoera esgotaras razões dos boicotes.O texto presentena reportagem diz: “As marcas presentes nesta lista foramencontradas em uma brevepesquisa feitaem sitesde busca, comoqualquer cidadãopoderia terfeito”. Ouseja, ao encontrar uma lista deboicote , não secontinuou a busca, tendo se considerado suficiente para que entrasse na reportagem. Não haveria problemanenhum emacrescentar outras razõespara boicotardeterminadas empresas ou marcas, mas a opção foipor organizaruma busca simplificada em um recorte temporal (até ofechamento da reportagem).Ou seja, a Agênciaparou a apuração onde supostamente o leitorpararia, por exemplo,se entrou ou nãotransgênico na composiçãode determinado alimento.Na reportagem não sãoapresentadas informações a favor ou contra a utilização de alimentos contendo organismosgeneticamente modificados, apenas são indicados os endereçoseletrônicos das organizaçõesnão governamentaispara que os leitores conheçam umdos lados da polêmica,se tiverem disposição paracontinuar a busca.É a partir desse ponto da busca que outro leitor nosescreveu. Identificando-se apenas como Rubens J. N., elecontesta os argumentos utilizados por uma das entidadesambientalistas e questiona os critérios para incluir produtos na lista daqueles quedevem ser boicotados porconter transgênicos.Sem entrar no mérito da questão, aOuvidoria considera que se a Agência remeteu os leitorespara as páginasde outras organizações caberia a ela a responsabilidadede explicitar pelo menos quais osprocedimentos adotados para elaboraras listas, uma vezque elesforam disponibilizados por essas fontes.Na “GrandeReportagem” o nome do Greenpeace, organização alvodos questionamentos do leitor, aparece apenas na seção “Alguns Boicotes”,na qual consta comoa organização responsávelpela denúnciade 19 produtos de umtotal de 56, ouseja, um terço,e, em umdos vídeos, pelomesmo motivo.A “GrandeReportagem” enfatiza a importância de avaliar as informaçõesprovenientes de sites da internet na seção “Como Escolher Seu Produto”, naqual dá dicaspara verificar a credibilidade de uma informação:Internet pode ajudar consumidor a ter informações sobreempresas e produtos. Mas a Agência não seguiurigorosamente suas próprias dicas na preparação da reportagem. Em vez de exporos critérios e procedimentos adotados pelas organizações que fizeram denúnciasde produtos, ela simplesmente as referiu por meio de links para os sitesdas organizações responsáveis e de empresas que fabricam os produtosdenunciados.No casodo Greenpeace, por exemplo,a fonte mais adequada das informaçõesnecessárias para a avaliação das denúncias teria sido: Greenpeace Guiado Consumidor: Listade produtos comou semtransgênicos, página5: “Como foi feitoeste guia”:www.greenpeace.org.br/transgenicos/pdf/guia consumidor.pdfOutra questão importante, pelo que se pode deduzir da demanda do leitor,é a questão da rotulagem. Apesarda Lei nº.11.105, de 2005, a chamada Lei deBiossegurança, obrigar quetodo alimentoque contenha OGMs na sua composição traga na embalagemuma advertência sobrea sua presença,essa lei nuncafoi cumprida. Essa questão tambémnão aparece na reportagem da Agência Brasil, apesarde constar na página6 do Guia do Consumidordo Greenpeace. O único lugar na “GrandeReportagem” que dá alguma indicação da importânciada rotulagem e dos interesses envolvidosnessa disputa está na resposta enviadapela Cargill emrelação aos óleosLiza e Mazola apresentada na seção “Alguns Boicotes”.Para uma discussão mais aprofundada sobrerotulagem no Brasil esta Ouvidoria recomenda a leitura do artigo Ciência égarantia de segurança? que pode ser encontrado em: http://www.comciencia.br/reportagens/transgenicos/trans03.htmJá os ouvintesda Rádio Nacionaltiveram acesso a maisuma informação importantesobre a rotulagem pormeio da reportagem quefoi ao ar no jornalNotícias da Manhã do dia21 de novembro:“Locutor: E desdeo início deste mêstodos os alimentosque contêm substânciasgeneticamente modificadas, conhecidas comotransgênicos, precisam conteressas informações no rótulo dos produtos.Até entãoapenas os alimentoscom maisde 1% de transgênicos em sua composição eram obrigadosa cumprir a regra.Repórter: Nos supermercadosde todo o paísalimentos transgênicosnão podem estarà venda semapresentar de formaclararótuloa presença de organismosgeneticamente modificados. A determinaçãoda Justiça Federalvale para todos os alimentostransgênicos, independentedo percentual. Em2001 o Ministério PúblicoFederal no DistritoFederal e o Institutode Defesa do Consumidor– Idec – propuseram a ação. Na época,a identificação no rótulosó eraobrigatória paraalimentoscommais de 4% de transgênicos.Em 2003 umdecreto passou a exigirque produtoscom 1% desses componentesalerta. De acordo com o Ministério Publico, apesarde um alimentocom 1% de elementosgeneticamente modificados ser considerado seguro para a saúde, a juíza responsável pelo caso entendeu queo consumidor tem o direitode saber sobrea presença de transgênicosno produto da suaescolha. De Brasília, Isabela Vieira.” A notícia, apesar de ter sido produzida pelojornalismo da Radiobrás, não apareceu nas páginas da Agência Brasil.As demandas dos leitores parecem indicar queas questões da procedência e da composição dos produtos disponíveis no mercado merecemum espaço público permanente de discussão onde o cidadão encontre informaçõesobjetivas e atualizadas que o ajudem a decidir conscientemente sobre queprodutos são seguros ou não para consumo, bem como sobre a responsabilidadeética, social e ambiental das empresas produtoras. Esse espaço pode ser aprópria Agência Brasil.  Até a próxima semana.