Acordo entre Mercosul e União Européia depende da Rodada Doha, diz embaixador

03/07/2007 - 0h59

Mylena Fiori
Enviada especial
Lisboa (Portugal) - Nestasegunda parte da entrevista concedida à AgênciaBrasil, o embaixador da União Européia no Brasil,João Pacheco, diz que Mercosul e Europa precisam melhorar suasofertas para que se chegue ao acordo bilateral e que isso sóserá possível “quando tivermos a tal clareza daRodada Doha”. Clareza que continua inexistente após mais umareunião em que países desenvolvidos e emdesenvolvimento não chegaram a acordo, recentemente, emPotsdam (Alemanha). O assunto será debatido na CúpulaBrasil-União Européia, amanhã (4), em Lisboa.AgênciaBrasil: Um dos objetivos dePortugal à frente da União Européia éfazer com que a Europa olhemais para a América Latina por intermédio doBrasil. Essa região foi esquecida pela UE nos últimosanos? Como seria esse novo olhar?João Pacheco:Temos muito boas relações. De dois em dois anos, háuma reunião de cúpula entre chefes de Estado da AméricaLatina, Caribe e Europa – a última foi em Viena e no próximoano teremos em Lima. Mas acho que o primeiro-ministro portuguêstem razão quando diz que uma parceria estratégica com oBrasil vai contribuir para que haja um maior enfoque da Europa nasrelações com esta parte do mundo. O Brasil sendo o paísmais importante da América do Sul, e eu diria também daAmérica Latina, tudo quanto seja estreitar relaçõesvai se traduzir numa maior atenção para a AméricaLatina na Europa e nós esperamos, também, uma maioratenção do Brasil e da América Latina àEuropa.ABr: OBrasil também seria um interlocutor na região paraquestões comerciais? A proposta de parceria estratégicamenciona a disposição de retomada das negociaçõescom o Mercosul. Também cita intenção da UE defechar acordos comerciais com América Central e ComunidadeAndina.Pacheco: Aparceria estratégica com o Brasil para nós éalgo muito importante, mas não se dará em detrimento danossa relação com o Mercosul. Somos a favor daintegração regional e tudo quanto seja negociaçãocomercial, como redução de tarifas, deve ser feitoentre os dois blocos, Mercosul e o UE. A relaçãoprivilegiada com o Brasil pode ajudar um melhor entendimento com omaior parceiro do Mercosul e facilitar a conclusão desseacordo UE-Mercosul, que seria, aliás, o maior acordo deassociação de livre-comércio do mundo.ABr: Coma estagnação da Rodada Doha, o acordo passa a serprioridade da União Européia?Pacheco: Oassunto vai ser discutido na Cúpula. Vai ser feita a avaliaçãodas negociações da Rodada Doha e a repercussãoque isso tem nas negociações com o Mercosul. Sempredissemos que precisamos de clareza na Rodada. Agora temos queverificar qual a situação da Rodada e retirar asconclusões em relação ao que podemos fazer com oMercosul. Estou esperançado que ainda seja possívelfazer mais um esforço para fechar a Rodada Doha, mas édifícil. Temos que reconhecer que depois do fracasso dareunião de Potsdam, se tornou mais difícil. Mas aRodada Doha é muito importante, pois é uma rodadamultilateral em que se pode tratar uma série de assuntos quenão podemos tratar a nível bilateral. Um exemplo sãoos subsídios agrícolas. Podem ser reduzidos edisciplinados na Rodada, mas não em uma negociaçãoentre dois blocos.ABr:Na avaliação da UE, o que falta para que as negociaçõescom o Mercosul avancem?Pacheco: O passoque precisa ser dado é melhorar a ambição, asofertas de cada um dos lados. Estivemos perto de um acordo em 2004.Não fechou porque do lado do Mercosul havia a avaliaçãode que a oferta da União Européia em agricultura nãoera suficiente. E, do nosso, houve a percepção de terhavido um recuo na oferta industrial da parte do Mercosul. Portanto,para fechar a negociação é preciso que ambas aspartes melhorem suas ofertas e isso só será possívelquando tivermos a tal clareza da Rodada Doha, em que vamos ter quetodos fazer concessões na área industrial e agrícola.ABr: Entãoo acordo Mercosul-UE continua condicionado aos resultados dasnegociações na OMC?Pacheco: Exato.Mas vamos agora avaliar o que podemos fazer, o que é realistaesperar da Rodada Doha.ABr: Voltandoà proposta de parceria estratégica, o documento sugere,em vários momentos, que o Brasil seja intermediário deum diálogo com países do G 77, do G 20, de línguaportuguesa e latino-americanos. Um dos principais objetivos dessaparceria é utilizar o Brasil como um interlocutor entre ospaíses desenvolvidos e os demais?Pacheco: Achoque é mais do que isso. Parceria estratégica quer dizerque é uma parceria entre países que têm umainfluência de caráter estratégico sobre suaregião e o mundo e podem contribuir para um mundo multipolar epara a estabilidade mundial. Por isso é que não temosparcerias estratégicas com todos os países, temos boasrelações com a maior parte dos países do mundo.A relação entre Brasil e EU não é umarelação só Norte-Sul, nós nãovemos o Brasil como uma porta para falarmos com o Sul porque temosparcerias estratégicas com a China, a Índia e com aÁfrica do Sul. Nós queremos uma parceria estratégicapelo peso que o Brasil tem na sua região e no mundo, nãonecessariamente como um interlocutor por ser um país emdesenvolvimento.ABr: Detoda forma, essa interlocução é parte importanteda parceria na medida em que o Brasil transita bem dos dois lados...Pacheco: Claro,a capacidade de diálogo do Brasil no G 20, no grupo de paísesem desenvolvimento, será sempre muito útil.Leia também a primeira parte da entrevista.