Próximo desafio é levar “estado de direito” ao Haiti, afirma representante da ONU

23/05/2007 - 17h37

Spensy Pimentel
Enviado especial*
Porto Príncipe (Haiti) - O representante especial do secretário-geral das Nações UnidasEdmond Mulet avalia que a ação das tropas brasileirasda Missão da ONU pela Estabilização no Haiti(Minustah) no país dá início a um “capitulonovo” para o país. O próximo passo, diz ele, éestabelecer um “estado de direito” no Haiti, com a reforma dasinstituições.Com a ocupaçãodo bairro de Cité Soleil pelas tropas brasileiras queparticipam da Minustah, no início do ano, o comando militar damissão avalia que foi vencida uma etapa fundamental de seutrabalho, possibilitar que o poder público possa atuar emqualquer ponto do território do país. “É umcapítulo novo para o Haiti. Cité Soleil estava sob ocontrole do terror, dos líderes criminosos, e mantinha comorefém o resto do país: a imagem de Cité Soleilera a imagem de todo o Haiti”, diz Mulet. “O povo foi libertadocompletamente e vive agora em paz”, continua ele. “Issotransformou não só o povo de Cité Soleil, mas oespírito nacional também, e a imagem internacional quese tem do Haiti. Aquilo que se conseguiu em Cité Soleil, seconseguiu para todo o país. E isso se deve ao trabalhorealizado pelas tropas brasileiras.”O próximodesafio da missão, na avaliação dele, é garantir um ambiente propícioao desenvolvimento do país, com o estabelecimento de um estadode direito. “Acho difícil que para o Haiti venhaminvestimentos, que se possam gerar empregos, que possa haverdesenvolvimento, que venham turistas, se não há umnível mínimo de estado de direito”, explica ele. “Porisso, nós das Naçoes Unidas trabalhamos muito no planode reformas da Polícia Nacional, do sistema judicial, dosistema penitenciário, em criar instituições noHaiti.” Mesmo que a situaçãoesteja sob controle, Mulet afirma que as tropas ainda sãonecessárias no país. “A situaçãode segurança é frágil, então a presençamilitar ainda é importante. Há muito por fazer”, dizele. Segundo o comando daMinustah, a Polícia Nacional Haitiana conta, atualmente, comcerca de 7 a 8 mil homens. O plano da ONU é que esse númerochegue a 14 mil até 2011. O Haiti tem cerca de 8,5 milhõesde habitantes. Quase 1,8 mil policiais das NaçõesUnidas, enviados por cerca de 35 países, trabalham atualmenteno país – juntamente com os 7 mil soldados da Minustah.A políciahaitiana ainda tem problemas para retomar a confiança dapopulação. O país teve governos ditatoriaisdurante a maior parte dos últimos 50 anos, e os policiais eramencarregados de execuções e perseguiçõespolíticas. Durante a ditadura dosDuvalier, entre os anos 50 e 80, foi criado um grupo de policiaisconhecidos como Tonton Macoutes – referência a um personagemdo folclore haitiano que é semelhante ao nosso velho do sacoou o bicho-papão, sendo encarregado de desaparecer com ascrianças mal-comportadas. Esses policiais, ou milicianos,usavam machados e executavam as vítimas em praçapública, levando terror aos bairros. “O país tinhauma polícia nacionalista, considerada corrupta, que começouagora a trabalhar com a polícia da ONU, com as nossas tropas eestá buscando um outro padrão. É umatransformação qualitativa enorme”, explica oembaixador brasileiro no Haiti, Paulo Cordeiro de Andrade Pinto. O trabalho conjunto dastropas da ONU com a policia haitiana gerou protestos de grupos dedireitos humanos nos últimos anos. Segundo as denúncias,como entregavam os prisioneiros que faziam durante suas operaçõespara a polícia, os soldados colaboraram involuntariamente comperseguições políticas no país.O comando da Minustahalega que suas ações estão sob vigilânciada seção de direitos humanos da ONU e reconhece asdificuldades. “Você trabalha no limite da força,exatamente para proteger o pessoal que reage de acordo com as ameaçasque você tem. E as ameaças são violentas”,disse o general brasileiro Carlos Alberto dos Santos Cruz, ementrevista à Agência Brasil, no início doano.