Benefícios e desvantagens na compra da Ipiranga pela Petrobras

20/04/2007 - 0h03

Paulo Machado
Ouvidor da Radiobrás
Brasília - Aleitora Vera Lucia S. Albuquerque, depois de ler as matériaspublicadas na Agência Brasil, quer saber se a populaçãoterá benefícios ou desvantagens com a compra do GrupoIpiranga pela Petrobras. Achei bastante pertinente a pergunta, umavez que é missão da Agência noticiarfatos, eventos e processos ocorridos no espaço públicopolítico (governo, Estado e cidadania), com foco nosinteresses do cidadão. Consolida-se, assim, como um veículode informação online público de altacredibilidade.Para ver se a resposta à pergunta daleitora estava contemplada na cobertura sobre o assunto, estaOuvidoria fez um levantamento. Foram publicadas em um primeiromomento 30 matérias entre 19 de março e 03 de abril de2007. Em um segundo momento, entre os dias 17 e 18 de abril, forampublicadas mais duas matérias. Separamos a análise emdois momentos, pois entre eles, no dia 11 de abril, recebemos amensagem da leitora e a encaminhamos à redação.Vamos ver como esse fato influenciou a cobertura.Para chegaràs conseqüências desse negócio para apopulação, precisamos saber exatamente o que é aPetrobras do ponto de vista do seu patrimônio (públicoou privado), se pertence ou não ao Estado brasileiro e quemtoma as decisões na empresa. As matérias da Agêncianão fornecem essas informações.Umapergunta que nos ocorreu foi saber quem decide sobre a políticade preços dos combustíveis. O diretor de Abastecimentoda Petrobras, Paulo Roberto Costa, a define da seguinte maneira: “Apolítica de preços não depende só dadistribuição, mas do preço do petróleo nomercado internacional, de custos logísticos, de impostos e deuma série de fatores geopolíticos para a formaçãodo valor final”. Essa informação está namatéria: “Compra do grupo Ipiranga não afetará preço dos combustíveis, diz diretor da Petrobras".Das30 matérias publicadas inicialmente pela Agência,quatro tratam das conseqüências para os consumidores doponto de vista de pessoas que defendem interesses dos grupos querepresentam, que são diferentes dos interesses dosconsumidores. Por exemplo, foram entrevistados o presidente daFederação Nacional do Comércio de Combustíveise de Lubrificantes (Fecombustíveis), um dos sócios dogrupo Ipiranga, que é também presidente da Federaçãodas Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), um diretor daPetrobras e um ministro de Estado. Nenhum dos quatro admite apossibilidade de haver conseqüências negativas para oconsumidor. Todos tinham algum tipo de interesse em que o negóciose realizasse.Não foi ouvida a opinião denenhum economista independente nem de nenhuma organizaçãode defesa do consumidor. A orientação do Manual deJornalismo da Radiobrás, ao tratar de eqüidade narelação com as fontes, é: “Fontes da sociedadecivil organizada devem ser consultadas e cidadãos nãoorganizados devem ser considerados”.Constatamosque as matérias também não explicam em quemedida o aumento do patrimônio da Petrobras com a compra doGrupo Ipiranga pode trazer ou não benefícios para apopulação. Nelas, a questão da concentraçãodo mercado de combustíveis é tratada pelo presidente daFederação Nacional do Comércio de Combustíveise de Lubrificantes (Fecombustíveis), Gil Siuffo. Segundo ele,a venda não representará nenhum problema para adistribuição de combustíveis que possa afetar oconsumidor. No entanto, teoricamente, a concentração domercado de combustíveis numa região por uma únicadistribuidora leva a uma possível formação demonopólio que poderá impor o preço que quiser.Uma das pessoas ouvidas pela Agência Brasil, quediscorda dessa teoria econômica, é também um dosvendedores, o sócio do Grupo Ipiranga Gouvêa Vieira.“Quanto maior uma empresa, mais ela adquire capacidade decompetitividade para competir e para ganhar mercado. Só ganhamercado se oferecer melhores condições ao consumidor”,disse o empresário. A esse respeito a Agênciaouviu o governo na pessoa do Ministro das Minas e Energia, SilasRondeau, que declarou: “Essa é uma discussãoabsolutamente normal em que todos os organismos que estãoenvolvidos fazem suas avaliações e comprovações”.Nenhuma das três declarações sobre o assunto écontextualizada ou explicada.Sete matérias trataram dovazamento de informações sobre a venda da Ipirangabeneficiando alguns acionistas do grupo em detrimento de outros. Em“CVM investiga ocorrência de informaçãoprivilegiada na venda da Ipiranga”, a Agência Brasilembarcou nos meandros da transação financeira com umtipo de informação relevante para quem detémações da empresa ou trabalha na Comissão deValores Mobiliários (CVM), sigla utilizada no título dequatro matérias. Mas, para o leitor(a) que não domina alinguagem do mercado de ações, frases como: “Casofique comprovado o vazamento de informação, as pessoasenvolvidas estão sujeitas a penalidades, dependendo doilícito” pouco contribuem. Não dá para saberse a população será ou não beneficiadapela transação mobiliária ou ainda se o“ilícito” deu prejuízo ao cidadão, nãoao acionista.Nas 23 matérias restantes, publicadasnesse primeiro momento da cobertura, são ouvidas 29 pessoas.Dezoito (62%) são da Petrobras (o presidente, um dosdiretores, dois presidentes de empresas subsidiárias e aassessoria de imprensa), enquanto cinco (17%) são sóciasdas empresas parceiras da Petrobras na compra, três (10%) sãopresidentes de sindicatos de trabalhadores no comércio dederivados de petróleo ou da indústria petroquímicae uma é sócia do grupo Ipiranga. Além delas,foram consultados a governadora do Rio Grande do Sul e o ministro deMinas e Energia.Nas matérias as declaraçõesdos sindicalistas manifestam quase exclusivamente suas preocupaçõescom a manutenção do emprego dos funcionáriosda empresa vendida e os planos de investimentos das empresascompradoras. Feitaessa análise, é possível entender o porquêda pergunta da cidadã. Mas parece que o próprio governotambém fez essa pergunta e se dispôs a responder. No dia17 de abril, a Agência Brasil voltou ao assunto devido auma ação da Secretaria de Direito Econômico, doMinistério da Justiça, e da Secretaria deAcompanhamento Econômico, do Ministério da Fazenda,pela qual os órgãos se declaram contra a compra daIpiranga pela Petrobras e concluem que a operação tem“potencial de causar danos à concorrência” nosmercados de distribuição e petroquímica. Namatéria, a Agência Brasil, já conhecedoradas demandas da cidadã, mudou a forma de abordar o assunto eexplicou não só as razões do governo federalpara se opor à compra, mas também como os interesses dapopulação poderão ser afetados se ela seefetivar. No dia 18 de abril, foi publicada a matéria “Medidacautelar restringe gestão de grupo Ipiranga para evitar danosà concorrência”, dando conta do desenrolar da açãodo governo federal no Conselho Administrativo de Defesa Econômica(Cade), a quem cabe julgar a ação.EstaOuvidoria guardará esse exemplo de como a cidadania podemelhorar a qualidade da informação quando reivindica efiscaliza o agente noticioso e também de como a AgênciaBrasil reconheceu o direito da cidadã à informação.Até apróxima semana.