Marcia Wonghon
Repórter da Agência Brasil
Recife - No estado de Pernambuco, somente em 2006, mais de 300mulheres – quase uma por dia – foram assassinadas, em sua maioria, por seuspróprios parceiros. As vítimas são principalmente jovens, negras e pobres.Inconformadas com essa situação, que piorou nos últimos dois anos, diversasentidades, organizações não-governamentais, grupos populares e universitários,que integram o Fórum de Mulheres de Pernambuco, saíram às ruas para protestar etentar mudar a realidade.A instituição existe há 17 anos e busca estimular a denúnciapor parte das mulheres violentadas, além de mobilizar a sociedade e pressionaro poder público para enfrentar essa realidade.O número de assassinatos vem crescendo a cada ano. Foram 276registros em 2004 e 290 em 2005. Um estudo realizado pelo fórum indica que osíndices de lesões corporais, ameaças à integridade física e crimes comodifamação e estupros também apresentam percentuais alarmantes. Segundo acoordenadora do fórum, Joana Santos, a instituição está se mobilizando desde oinício de 2006, no esforço de apresentar propostas ao governo do estado paragarantir segurança às mulheres e outras políticas públicas de inclusão social."Fizemos vigílias mensais nas ruas pelo fim da violência, mas a situaçãonão melhorou", destaca.Ela afirma que faltaram proposições por parte do Estado."Estamos falando de iniciativas na área de segurança pública, políticas detrabalho e renda para as mulheres pobres – sobretudo as que habitam pequenascidades do interior do estado – e saúde, entre outros", diz. O trabalho dofórum já conseguiu alguns avanços, como a criação de uma vara civil exclusiva,pelo governo do estado, para julgar crimes praticados em ambiente familiarcontra mulheres.A delegada Vera Lúcia Freire informa que somente este anoforam registradas mais de 7 mil queixas de agressão contra a mulher nas quatrodelegacias especializadas nesse atendimento em Pernambuco. Em todo o ano,aconteceram quase 2.400 denúncias de lesão corporal e 62 de estupro, nasdelegacias da mulher de Petrolina, Caruaru e Recife. Acrescenta que houve umasobrecarga de trabalho nas delegacias em Pernambuco por causa da Lei Maria daPenha, sancionada em setembro do ano passado: "Como ela criou mecanismospara reduzir a violência doméstica e familiar contra mulheres, o número dedenúncias foi bem maior do que o normal".Para a responsável pela Coordenadoria da Mulher, daprefeitura do Recife, Dalvanice Nascimento, situações de violência que provocamdanos físicos e psicológicos muitas vezes não são denunciadas por medo edependência financeira em relação aos agressores. "As mulheres têmvergonha, a questão cultural é forte e existe a forma de pensar ‘ruim com ele,pior sem ele’".Na capital, as pernambucanas vítimas de violência física epsicológica contam com um serviço disponibilizado pela prefeitura, o CentroClarice Lispector. No local já foram realizados 43 mil atendimentos nos últimosquatro anos, prestando assistência social, jurídica e psicológica para mulheresque sofreram alguma agressão. Uma das beneficiadas com a iniciativa é aaposentada Suzana Gomes, 79 anos. Ela morava no bairro de Água Fria com omarido, mas foi obrigada a vender a casa própria e se mudar para um imóvelalugado porque passou a ser ameaçada de morte por um vizinho de 22 anos.O jovem ficou revoltado após Gomes reclamar do volumealto de sua televisão, no meio da madrugada. O trabalho feito na cidade peloFórum de Mulheres incentivou a aposentada, que tomou coragem e denunciou ocaso. “Eu não tinha condições de ficar lá, a não ser que houvesse pessoas parame proteger. Fui forçada a procurar a delegacia da mulher", conta.Dados do fórum indicam que os casos de violência ocorrem principalmente nosmunicípios da região metropolitana de Recife, devido à falta de políticaspúblicas de inclusão social. Além de mobilizar ações em Pernambuco, a rede deorganizações tem participado da construção de outras redes pelo Brasil. Aintenção continua sendo mobilizar a sociedade e os governos locais para mostrarque qualquer violência contra a mulher, dentro ou fora de casa, não pode passarimpune.