Brasília, 23/5/2006 (Agência Brasil - ABr) - O governo federal quer prevenir a corrupção limitando a atuação de ocupantes de cargos públicos na iniciativa privada. Esse é o foco da proposta de projeto de lei sobre conflito de interesses, encaminhada na última semana pela Controladoria Geral da União (CGU) à Casa Civil. "É mais um instrumento na dimensão preventiva, para prevenir conflitos de interesse e, portanto, prevenir a prática de atos de improbidade e corrupção", reiterou o ministro-interino da Controladoria, Jorge Hage, em entrevista exclusiva à Agência Brasil.
O anteprojeto visa adaptar a legislação brasileira a convenções internacionais de combate à corrupção: estabelece requisitos e restrições para a atuação, na iniciativa privada, de ocupantes de cargos ou empregos públicos com acesso a informações privilegiadas que possam trazer vantagem econômica ou financeira para o servidor ou terceiro. É o caso de ministros, comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica; cargos de natureza especial, como secretários-executivos; presidente e diretor de autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista e cargos de Grupo de Direção ou Assessoramento Superiores, como DAS níveis 6 e 5.
Se aprovadas, as regras também valerão para empregados de áreas relacionadas à auditoria, arrecadação, diplomacia, regulação, fiscalização, planejamento, orçamento ou gestão, finanças tributação, advocacia pública, investimentos no mercado financeiro e também às atividades de natureza policial, cujo exercício proporcione acesso a informações.
Segundo Jorge Hage, o anteprojeto prevê vedações de caráter permanente, que valem enquanto a pessoa está no cargo. Ele citou como exemplo "auditores fiscais da Receita Federal que tomam licença sem remuneração durante um ou dois anos e, neste período, prestam serviços a empresas privadas, montam até escritórios de consultoria na sua área de atuação – isso obviamente é conflituoso, é absolutamente incompatível porque vão vender informações sobre as quais têm conhecimento em função do cargo de ocupam".
Também estão previstas vedações para depois que o funcionário deixar o cargo: em caráter permanente, fica proibido divulgar ou fazer uso de informação privilegiada obtida quando exercia a atividade; durante um ano, a prestação direta ou indireta de qualquer tipo de serviço à pessoa física ou jurídica com quem tenha estabelecido relação relevante em função de seu cargo; e também por um ano, aceitar cargo de administrador ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que atue em área relacionada com aquela em que atuava e celebrar contratos de consultoria ou assessoria com órgãos do poder Executivo. "A legislação brasileira sobre quarentena é muito restrita, insuficiente e incompleta", justifica Hage.
O ministro informou que para se adequar plenamente às convenções internacionais o Brasil ainda precisa aprovar o projeto de lei que transforma enriquecimento ilícito em crime, com penas de três a oito anos de reclusão – encaminhado ao Congresso Nacional pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em junho do ano passado.
Segundo Jorge Hage, "o Brasil ainda precisa se ajustar melhor" em outras questões, como a flexibilização dos casos de garantia de sigilo bancário e fiscal. "Hoje ainda são extremamente rígidos e dificultam a investigação e o combate à corrupção", disse. Ele também defende agilização do poder Judiciário para um maior número de punições dos casos de corrupção: "Há poucas condenações consumadas, transitadas em julgado, por conta do excesso de recursos e outros meios protelatórios que existem em nosso processo judicial".