Paulo Machado
Enviado especial
Lucas do Rio Verde (MT) – Para a bióloga Lindonésia Andrade, responsável pelo Horto Medicinal da Fundação Instituto Padre João Peter, o dia 1º de março deste ano ficará na história como o dia em que ela perdeu anos de sua pesquisa sobre plantas medicinais e seus efeitos fitoterápicos. Segundo ela, "anos de pesquisa foram por água a baixo, num só dia, devido à irresponsabilidade de um sujeito que passa pulverizando numa área muito próxima à cidade".
Para a população de Lucas do Rio Verde também farão falta as plantas medicinais utilizadas pelo Instituto, uma vez que era a partir delas que a bióloga preparava os medicamentos que servia gratuitamente aos doentes carentes da cidade que a procuravam. "Muitos doentes que estavam fazendo tratamento com nossos remédios tiveram que interromper", afirmou.
Andrade disse que o efeito de veneno foi bem rápido. No dia seguinte à pulverização [dia 2 de março], o efeito já era visível em toda a cidade: hortas, quintais e a vegetação ornamental da cidade foram atingidas. Ela descreve que: "as folhas ficavam como um papel amassado e queimado, outras ficavam todas perfuradas e em volta dos furos logo começava a necrosar [apodrecer]. No quarto dia as folhas entraram em necrose total e começaram a cair".
A bióloga explica que esse veneno também tem o poder de diminuir a ação de crescimento das plantas. "Nós tivemos que fazer uma poda radical e só agora [dia primeiro de abril] as plantas estão começando a soltar novas gemas [brotos]. Nós vamos acompanhar para ver o que vai ser possível aproveitar ou o que teremos que erradicar e plantar novamente".
O Horto Medicinal contava com mais de 200 espécies de plantas catalogadas. Muitas ervas ocupavam canteiros inteiros que hoje estão limpos. As plantas tiveram que ser arrancadas. Um caminhão saiu carregado de galhos, ramos e folhas mortas resultante da poda radical. Ela explica que muitas variedades são bastante raras, só dão sementes uma vez ao ano e demorarão muito para se recuperar.
A responsável pelo Horto Medicinal suspeita que o veneno utilizado tenha sido o Paraquat, um poderoso agrotóxico utilizado para dessecar as folhas da soja e apressar a colheita. "Um veneno que nos países desenvolvidos nem se utiliza mais, porque é do tipo 1, é muito tóxico, alem de prejudicar a vegetação, ainda prejudica outros os seres vivos, inclusive nós", disse.
Nos seres humanos esse agrotóxico tem um efeito cumulativo, explica a bióloga. "Quanto mais lento pior, porque os efeitos rápidos, dor de cabeça, vômito e diarréia, são fáceis de identificar, mas os efeitos lentos, futuramente podem levar a diversas pessoas daqui da cidade e da região próxima, a desenvolver diversos tipos de tumores malignos como, por exemplo, câncer de próstata, de testículos, as mulheres podem ter câncer de ovário, de mama. É uma preocupação, é um caso de saúde pública, porque futuramente nós vamos ter pessoas doentes na cidade".
A Fundação Padre João Peter, junto com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais e a Associação dos Chacareiros de Lucas do Rio Verde, foram as entidades da sociedade civil que encaminharam a denúncia ao Ministério Público e à Universidade Federal do Mato Grosso.