Para Serraglio, cruzamento de dados mostra relação entre repasse de verba e votações no Congresso

29/03/2006 - 21h01

Marcos Chagas e Ana Paula Marra
Repórteres da Agência Brasil

Brasília – O cruzamento de dados estabelecido pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Correios mostra uma correlação temporal dos recursos repassados pelo esquema do empresário Marcos Valério de Souza ao Partido Liberal (PL), com a migração de parlamentares para o partido e votações de matérias polêmicas no Congresso, afirma o relator Osmar Serraglio (PMDB-PR) em seu relatório final apresentado hoje (29).

"Observa-se que o fluxo de recursos, de um modo geral, correlaciona-se temporalmente à ampliação da base de sustentação do Governo (ingressos de deputados no PL), à aprovação de matérias politicamente polêmicas e a supostos acertos de dívidas de campanha declarados pelos beneficiários", diz o relator.

Segundo o relatório, em janeiro de 2003 houve uma "intensa migração de parlamentares para o Partido Liberal". Entre 30 de janeiro e 1 de fevereiro daquele ano, 14 deputados foram para o PL. "A seguir, já no início do segundo mês do atual governo, iniciam-se fluxos periódicos de recursos para o Partido Liberal, via empresa Garanhuns Empreendimentos Ltda", afirma o relator. Ele acrescenta que ocorreram 22 remessas semanais iniciadas em fevereiro de 2003, que se estenderam até o fim de agosto daquele ano. Serraglio ressalta que esta distribuição regular de recursos está próxima à descrita pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) quando denunciou o que chamou de "mensalão".

O cruzamento das informações mostra o fluxo destes recursos: quatro parcelas de R$ 500 mil; cinco parcelas de R$ 300 mil; 12 parcelas de R$ 200 mil; e uma parcela de R$ 100 mil. "Todas distribuídas ao longo do tempo com precisão quase cirúrgica, perfazendo um total de R$ 6.037.500,00", afirma o relator.

Osmar Serraglio mostra em seu relatório que durante o período de pagamento destes recursos houve a migração de nova deputados para o PL. "Diante desses fatos tem-se o entendimento de que nesse período o 'mensalão' atendeu a um objetivo importante: a ampliação da base de apoio parlamentar do governo", diz.

O cruzamento de dados também mostra a atuação dos que seriam os "principais operadores" do PL: o ex-tesoureiro, Jacinto Lamas e o chefe de gabinete do ex-ministro Anderson Adauto, José Luiz Alves. Segundo as informações levantadas pela comissão, em 5 meses, estas duas pessoas receberam R$ 800 mil.

"Nesse período, em datas bastante aproximadas, senão coincidentes com as dos saques, ocorreram votações importantes no Congresso Nacional, a exemplo da Reforma da Previdência, da Reforma Tributária e da proposta de emenda constitucional paralela da Previdência Social", afirma Serraglio.

Serraglio acredita que faltam provas de que o dinheiro repassado pelo empresário Marcos Valério de Souza fazia parte de um esquema ilegal para financiar campanhas eleitorais – tese apresentada pelo ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, em sua defesa. Para Serraglio, o argumento de Delúbio, e da maioria dos parlamentares acusados, representa a tentativa "de explicar o inexplicável".