Irene Lôbo
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Em 1995, o radialista João Lara de Mesquita, na época diretor da Rádio Eldorado de São Paulo, liderou o movimento da União de Rádios do Brasil contra a transmissão obrigatória do programa Voz do Brasil. Na época, das três mil emissoras de rádio que existiam no país, 850 se filiaram ao movimento, alegando que a obrigatoriedade é inconstitucional, agredindo aos artigos 5º e 220º da Constituição de 1988, que tratam da liberdade de comunicação e informação jornalística.
Ao participar do seminário Voz do Brasil: tradição e modernização - uma discussão sobre as formas de transmissão, Mesquita disse que o programa é inconstitucional. Segundo ele, não há nada na Carta Magna que ampare a obrigatoriedade. "Ora, se todos são iguais perante a lei, porque o rádio, que é uma concessão, tem a Voz do Brasil, e a televisão que é uma concessão, não tem a Voz do Brasil?", questiona.
Para o professor titular da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (USP), Bernardo Kucinski, a discussão sobre o programa Voz do Brasil nada tem a ver com os problemas da comunicação no Brasil.
"Temos problemas gravíssimos, temos um sistema digital entrando sem que a sociedade tenha a oportunidade de discutir adequadamente, temos uma revolução na internet que ainda nem sequer está sendo absorvida adequadamente por todos, temos uma repressão às rádios comunitárias muito intensa no Brasil todo e aí estão discutindo um programa de rádio que ocupa um espectro durante uma hora por dia e que as pessoas até gostam de ouvir e que não está fazendo mal a ninguém. Não estou entendendo realmente o porquê dessa discussão hoje", disse.
O professor defende a flexibilização do horário para melhorar a audência e compatibilizar o programa com as regiões que têm fuso horário diferentes. "O programa faz parte da nossa história, já está entranhado no povo brasileiro".
A coordenadora da pós-graduação do Instituto de Educação Superior de Brasíia (Iesb), Elizabeth Brandão, acha que o que deve ser questionado não é a transmissão da Voz do Brasil, mas se o programa é uma comunicação pública e está a serviço da cidadania.
"A Voz do Brasil não pode ser apenas a Voz dos três poderes, deve ser também, mas não apenas. Onde está o local dos movimentos populares, onde está o local na Voz do Brasil dessas várias vozes que existem hoje e que são tão brasileiras e que precisam de espaço para se apresentar?", afirmou Elizabeth.
Uma pesquisa do Instituto Datafolha, feita em dezembro de 1995, informou que 88% dos brasileiros com idade acima de 16 anos conhecem a Voz do Brasil. Mais da metade aprova que o programa seja obrigatório. A pesquisa mostrou também que as maiores audiências do programa estão nas regiões Norte e Nordeste do país.
O perfil do brasileiro que ouve o programa também foi traçado: é de classes mais baixas, vive distante dos grandes centros urbanos, das facilidades tecnológicas da comunicação e da informação político-administrativa.