Thaís Brianezi
Enviada especial
Pinhais (PR) - No Brasil, todo produto ou processo cuja invenção tenha envolvido acesso a recursos genéticos (informações de moléculas de plantas ou de animais) ou a conhecimentos tradicionais associados deve ter certificado do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN) antes de ser patenteado.
No entanto, pesquisa inédita da organização não-governamental (ONG) Instituto Socioambiental (ISA) revelou que nenhum dos 110 pedidos de patentes estudados - feitos ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi) entre julho de 2000 e maio de 2005 – apresentava o documento exigido.
O CGEN foi criado em 2001, por meio da Medida Provisória (MP) 2.186-16. A legislação – publicada pela primeira vez em julho de 2000, atualmente na 16ª edição - estabelece como requisitos fundamentais para que uma pesquisa com recursos genéticos seja autorizada: a anuência prévia e expressa das comunidades envolvidas, um termo de consentimento que estabeleça os critérios e limites do estudo e um contrato de repartição de benefícios (no caso de bioprospecção, ou seja, de pesquisas que tenham fins comerciais).
No Artigo 31, a MP obriga que o processo de concessão de patentes relativas a esses recursos leve em consideração as suas exigências – que, em 2001, foram reunidas no certificado do CGEN, órgão responsável por autorizar essas pesquisas.
O estudo do ISA considerou inicialmente os 82.504 pedidos de patentes registrados no Inpi no período delimitado. A partir daí – e pelas informações que constavam no resumo dos pedidos, disponíveis no site do Inpi – considerou apenas aqueles que possivelmente se relacionavam com recursos genéticos e conhecimentos tradicionais, da maneira como eles são definidos pela medida provisória. "Ficamos com um universo de 1.874. Então, solicitamos do Inpi cópias do processo todo de 110 desses resumos", explicou o biólogo responsável pelo levantamento, Henry Novion.
"Desses, apenas 18 declaravam o local da coleta do material do material genético, sendo que apenas 10 diziam inclusive qual a localidade [município]", contou Novion. "Os outros oito citavam a instituição de pesquisa, apenas". Outro dado tabulado pelo estudo foi o de que 27 desses pedidos citavam o uso do recurso natural feito por comunidades locais como referência de garantia de eficácia da "descoberta" – mas nenhum deles apresentava qualquer documento que mostrasse que essas comunidades autorizaram o estudo.
"O Inpi não obriga o interessado a apresentar o certificado do CGEN, e a pessoa que pede a patente também não declara espontaneamento a informação", lamentou Novion. "Isso cria um círculo vicioso, que faz com que a legislação não seja cumprida". De acordo com Novion, o Inpi ainda está analisando os pedidos de patentes feitos em 1999. "Assim, ainda há tempo de que essa exigência, que passou a ser válida apenas em 2000, seja cumprida", afirmou. "A gente pretende apresentar esse estudo ao CGEN, para que o órgão faça valer sua responsabilidade".
As reuniões do CGEN são mensais. Novion falou sobre o estudo em um debate promovido hoje (27) pela Rede Andina de Combate à Biopirataria, da qual o ISA faz parte. O estudo foi tema de uma das discussões paralelas do sexta dia da 8ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (COP-8), que reúne no Paraná 3.600 representantes de 173 países.