Flávio Dieguez
Repórter da Agência Brasil
Brasília – O professor Tadao Takahashi, presidente do Conselho de administração da TVE Brasil, sediada no Rio de Janeiro, participa ativamente dos debates sobre a implantação da TV digital no Brasil.
Ele critica especialmente a ênfase excessiva que se dá à discussão sobre o modelo de TV digital que seria melhor para o Brasil – há três padrões, atualmente, em escolha: o americano, o europeu e o japonês, cada modelo com pontos fortes e pontos fracos. O que importa, na opinião de Takahashi, é saber onde se quer chegar com esse novo tipo de televisão.
Takahashi explica que a TV digital é uma tecnologia que pode reunir várias outras: pode funcionar como uma TV comum, transmitindo programas, pode ser usada para entrar na internet ou para transmitir ligações de telefone, inclusive celulares.
O desafio de juntar essas tecnologias, diz ele, tem a ver com o marco regulatório – um conjunto de leis que organizem o funcionamento, na prática, de todos os setores envolvidos. Leia abaixo a entrevista em que ele expõe seus pontos de vista sobre o assunto.
Agência Brasil: Por que o senhor diz que o debate sobre a TV digital está fora de foco?
Tadao Takahashi: Esse negócio de televisão digital, para o cidadão, é o sintoma mais visível de todo esse assunto de convergência tecnológica, onde se junta a internet, a televisão, o celular e assim por diante. Então não é muito surpreendente que chame muito a atenção das pessoas. Mas tem vários aspectos. O grande problema para um país como o Brasil tem a ver e começa com o marco regulatório.
Abr: Como assim?
Takahashi: O marco regulatório deriva de uma visão política sobre o processo, e nada disso tem sido discutido pra valer. Se a gente não souber exatamente qual é o marco regulatório que a gente quer, tem conseqüências. Por exemplo, discutir se você quer exportar aparelho de televisão ou não, isso tem a ver com a política industrial. E saber se você vai priorizar a televisão de padrão normal em relação à televisão de alta definição, isso tem a ver com o marco regulatório. Então, me espanta um pouco que esse alarido todo exista. Primeiro, deveria haver uma conversa técnica. Segundo, o lado que não é técnico, é extremamente político, e tem a ver com o marco regulatório, a gente não vê discutido.
Abr: Ou seja, a TV digital pode ter diversos usos, e é preciso ter uma prioridade, que tipo de uso é mais interessante para o país.
Takahashi: É. Por exemplo, um pedaço de fibra ótica transmite um sinal que tanto pode ser um pedaço de uma conversa telefônica, como pode ser um programa de televisão. Então o marco regulatório teria de partir de uma visão geral e, a partir daí, definir grande diretrizes. Por exemplo, se a gente realmente quer que televisão digital seja um veiculo de inclusão social, é uma coisa. Vai ser totalmente diferente se a gente simplesmente quer que televisão no Brasil possa ser comparável com o cinema – e quem puder paga por isso. Então, o marco regulatório é importante, mas ele emana de uma certa visão do que você quer para o país, que eu não vejo discutida em nível nenhum.
Abr: É verdade que a TV digital tem um limite – não se pode ter uma infinidade de canais, por exemplo? E é correto dizer que quanto mais alta a resolução menos canais e menos usos a TV digital pode ter?
Takahashi: Sim: quanto maior a definição, maior a banda que você ocupa no espectro [o espaço total disponível para fazer transmissões]. E quanto maior a banda, menos concessões ou outorgas você pode fazer. Significa que menos empresas podem entrar para produzir conteúdos e difundir conteúdos na teve aberta. Então, se a pessoa for olhar do ponto de vista estrito de permitir que mais players [participantes] entrem no negócio de produção e de difusão de conteúdos, fica mais importante você economizar espectro do que priorizar a máxima definição.
Abr: E como se enfrenta essa situação?
Takahashi: Imagina, por exemplo, que você vai transmitir quatro programas com a definição só um pouco melhor que a atual, para que o cidadão que tem um aparelho de televisão comum poder pegar com um conversor. É que a alta definição é socialmente perversa, porque você, no fundo, está incentivando o cara a comprar um novo aparelho de televisão, como se o dele não servisse para a TV digital.
Abr: A imagem de uma televisão comum poderia ser melhorada com um processo digital de produção?
Takahashi: Se você digitalizar [o processo], já elimina todo aquele negocio de pé-de-galinha, de tremor. Essa coisa toda, é só digitalizar que já desaparece. Na prática, precisa explorar as duas coisas, a alta definição e também a definição normal. O grande problema é que as empresas de televisão acham que vai ter muito mais custo para menos retorno, então, para elas, é muito mais negócio ter uma televisão analógica, como as de hoje, com sinal aberto, e uma de altíssima definição, com canal aberto também, que será usada para grandes ocasiões, tipo Copa do mundo ou algo assim.
Abr: A definição do governo sobre o modelo de TV digital deveria ter saído em janeiro e ainda não saiu. O senhor acha que deve demorar?
Takahashi: Acho que houve uma certa queixa em relação a como o ministro das Comunicações [Hélio Costa] vinha encaminhando a questão. Acho que o lado positivo é ele ter uma certa pressa em resolver a questão. O lado negativo é a consulta ao próprio conselho que ele tem no grupo do sistema. A coisa mais perigosa nessa coisa toda é fixar uma data para iniciar a transmissão, porque você precipita algumas decisões em função de quem topa fazer a tal inauguração para você.