Movimentos divulgam números para provar que crédito fundiário é ''armadilha'' para agricultores

06/03/2006 - 18h25

Spensy Pimentel
Enviado especial

Porto Alegre – Movimentos sociais que se opõem a políticas de compra de terra por pequenos agricultores como instrumento de reforma agrária divulgaram hoje (6) os resultados preliminares de uma pesquisa sobre o tema realizada no ano passado em 161 municípios de 13 estados brasileiros.

Um cartaz que divulga números da pesquisa chama de "armadilha" a política de crédito fundiário. Entre os 1677 entrevistados no estudo, escolhidos entre 43 mil beneficiados, cerca de dois em cada cinco agricultores não participaram da escolha (35%) e da negociação (41%) em torno da área adquirida; mais da metade (54%) desconhece o contrato de compra e reclama das terras adquiridas; e 81%, cerca de quatro em cada cinco pessoas, não sabem quais são os juros cobrados na operação.

"Essa pesquisa comprova denúncias que já tínhamos recebido antes. Há um nível muito grande de desinformação. As pessoas só percebem que ficaram endividadas depois que já entraram no programa", diz Maria Luisa Mendonça, ativista da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, uma das entidades responsáveis pelo estudo.

A pesquisa foi executada pela Rede Terra de Pesquisa Popular, ligada à Via Campesina, rede internacional de movimentos rurais da qual fazem parte, no Brasil, o Movimento dos Sem Terra (MST) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), entre outras.

Os resultados apresentados hoje não fazem distinção entre os programas Cédula da Terra e Banco da Terra (do governo Fernando Henrique Cardoso), Crédito Fundiário e Nossa Primeira Terra (do governo Luiz Inácio Lula da Silva), porque considera que todos operam sob o mesmo princípio de "reforma agrária de mercado", originalmente formulado pelo Banco Mundial. Dois terços, 66%, dos entrevistados, foram atendidos no governo anterior; os demais, no governo atual.

Durante o governo anterior, segundo os organizadores da pesquisa, foram atendidos por programas concebidos para atender agricultores pobres cerca de 70 mil pessoas – incluindo os casos de corrupção em que funcionários públicos ou pessoas de origem urbana com interesse de adquirir propriedades rurais para lazer foram beneficiadas.

Em 2003, no início do governo Lula, o programa Banco da Terra foi extinto – segundo a assessoria do MDA, cumprindo compromisso assumido com os movimentos sociais. Foi mantido, porém, o programa de Crédito Fundiário, que é considerado uma opção para atender demandas de pequenos agricultores em regiões onde há dificuldade para obter áreas para desapropriação para reforma agrária. Segundo o ministério, o programa atendeu 27,3 mil agricultores, desde 2003, aplicando R$ 500 milhões.

Os números da pesquisa foram apresentados em evento paralelo à 2ª Conferência Internacional sobre Reforma Agrária e Desenvolvimento Rural, promovida na capital gaúcha pelo Fundo das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, em parceria com o governo brasileiro. Os resultados finais do estudo devem ser divulgados em duas semanas.