Érica Santana
Repórter da Agência Brasil
Brasília – O ingresso da Venezuela como novo membro do Mercosul irá fortalecer o grupo e facilitar a integração com o outro bloco econômico sul-americano, a Comunidade Andina. A visão é do embaixador José Eduardo Martins Felício, secretário-geral do Itamaraty para a América do Sul. Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, Martins Felício comentou o tema e as perspectivas da política externa do país para a América do Sul.
Agência Brasil: Quais as perspectivas do Brasil nas negociações com América do Sul e o Mercosul em particular?
Embaixador José Eduardo Martins Felício: O Brasil acha que a integração passa pelo entendimento com a Argentina, passa pelo aprofundamento do Mercosul. Já houve um acordo importante entre o Mercosul e a Comunidade Andina, o que já provoca uma convergências das duas uniões aduaneiras que se pretende formar no continente.
O Mercosul é uma peça chave nesse processo. Brasil e Argentina são países grandes dentro do Mercosul. Agora há essa perspectiva da Venezuela se associar do Mercosul, o que desde logo faz com que o Mercosul represente 70% do Produto Interno Bruto (PIB) da América do Sul. O Mercosul fica muito importante e a associação com a Comunidade Andina possivelmente transformará o Mercosul num bloco bastante poderoso.
AB: E como o Itamaraty vê, mais especificamente, a entrada da Venezuela no Mercosul?
Embaixador Martins Felício: A entrada da Venezuela é positiva. O país tem uma base industrial importante, mesmo que não comparável à brasileira e à argentina. E o governo venezuelano está preocupado em aumentar a produção agropecuária. A Venezuela é tradicionalmente um importador de alimentos, mas é possível que consiga se transformar em um produtor agropecuário importante.
Eles têm importado gado da Argentina e do Brasil para formar um rebanho. Eles têm interesse em plantações como soja, frutas. Pela primeira vez, a gente nota no governo venezuelano o interesse em diversificar a produção e não ficar refém da produção de petróleo.
AB: Após a entrada da Venezuela, como ficarão as negociações do Mercosul com outros blocos?
Embaixador Martins Felício: Quando a Venezuela entrar no Mercosul ela vai encontrar diversas negociações em curso as quais certamente ela terá interesse em se associar. O Mercosul está negociando hoje com a União Aduaneira da África do Sul; está iniciando conversas com o Centro do Cooperação do Golfo; com a Comunidade do Caribe, com o Sistema de Integração Centro-Americano. Há também uma proposta do Mercosul de negociar um acordo com os Estados Unidos, no modelo quatro mais um.
Os venezuelanos sabem que existem essas propostas e, como eu disse, a nossa expectativa é que eles se associem a esse esforço e não sendo contra. Eles terão liberdade, evidentemente, e nós esperamos que eles expressem as opiniões de maneira franca e nos ajudem a refletir e em todos essas frentes, inclusive com a União Européia.
E o processo da inclusão da Venezuela não se dá da noite para o dia. A nossa expectativa é que na próxima cúpula do Mercosul em Montevidéu, no início de dezembro, seja tomada uma decisão sobre o início da incorporação da Venezuela no Mercosul. O que se quer dizer com isso é que haverá um processo; haverá uma negociação. Para ingressar no Mercosul, a Venezuela tem primeiro que ratificar o Tratado de Assunção, o protocolo de Ouro Preto, o protocolo de Olivos, que cria a solução de controvérsias no Mercosul. Há todo um acervo de decisões do Mercosul que a Venezuela terá que incorporar.
Sem falar da questão tarifária propriamente dita. Nós temos uma tarifa externa comum, a Venezuela terá que verificar se há algum tipo de incompatibilidade entre essa tarifa externa e a tarifa externa da Comunidade Andina, da qual ela é membro e talvez haja necessidade de algum tipo de prazo para que a Venezuela se adapte às condições do Mercosul.