Spensy Pimentel
Repórter da Agência Brasil
Brasília – O Brasil encontra-se atualmente numa "armadilha" que impede o país de baixar em curto prazo sua taxa de juros, afirma o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente, os juros brasileiros reais, segundo ele, encontram-se entre 13% e 14% ao ano, quando o ideal seria chegar a 4%.
Belluzzo explica que, hoje, parte das operações internacionais do país está atrelada aos contratos "non deliverable forward", relacionados à taxa de câmbio. Isso significa que, "se baixar muito depressa os juros, os aplicadores mudam de posição muito rápido, o que impacta o câmbio. Só que ninguém quer um choque cambial, porque isso impacta a inflação".
Nossa moeda, segundo ele, deveria ser desvalorizada em relação ao dólar, a exemplo do que fazem países asiáticos como a China. "O câmbio tem que ser relativamente desvalorizado, para favorecer o desenvolvimento, e tem que ser estável, que é um sinal importante para os investidores", afirma. "Enquanto isso, o que o BC faz por aqui? Usa o câmbio como instrumento de combate à inflação. Isso não é política de metas de inflação. Essa política não está desenhada para usar o câmbio como instrumento."
O economista diz ainda que uma taxa básica de juros real de 4% no Brasil seria "suficiente" e afirma que a única explicação para que a taxa, historicamente, se mantenha sempre acima de 9% ao ano é "uma relação muito esquisita entre o BC e o setor financeiro privado".
Ele lembra que outros países com problema de endividamento, como a Argentina e a Turquia, tratam o problema de forma muito diferente. Na Argentina, por exemplo, a taxa de juros real é negativa hoje, e o nível de câmbio é mantido estável, mas com o peso ligeiramente desvalorizado, para incentivar o desenvolvimento. "E nem por isso acontece nada. Teve fuga de capitais? Não teve", diz ele.
O câmbio desvalorizado influi em dois sentidos: primeiro, nos preços dos produtos que o país exporta. Eles ficam mais baratos em dólar, o que os torna mais competitivos. Segundo, fica menos vantajoso para um investidor estrangeiro remeter divisas para seu país de origem. O nível do câmbio incentiva o reinvestimento desse dinheiro no próprio país onde ele é gerado. Desta forma, o atual preço do dólar em relação ao real, segundo a visão de Belluzzo, prejudica duplamente o país: torna as exportações menos competitivas e favorece o envio de divisas para o exterior.
Sobre a recente queda de 0,5 ponto percentual na taxa Selic, decidida semana passada pelo Banco Central, Belluzzo diz que "é melhor que se tivesse subido meio ponto. Mas é preciso acelerar essa queda".
Para o economista, a economia brasileira encontra-se estagnada. "Quanto é que vai dar esse ano? Uns 2,5%, 2,8¨% de crescimento?", diz ele. "Sempre digo isso para os meus amigos que estão no governo: não adianta vocês virem com história, porque nossa economia está crescendo muito abaixo de seu potencial. Isso se deve ao fato de nós termos uma taxa de câmbio desalinhada, por causa de uma taxa de juros absurda".
Belluzzo disse ainda que não se chegou ao nível atual da dívida pública, prestes a chegar a R$ 1 trihão, nos primeiros meses de 2006, por excesso de gastos do governo, mas por uma situação "ridícula" do ponto de vista macroeconômico. O nível de endividamento do país é medido pela relação entre a dívida total e o Produto Interno Bruto, total de riquezas produzido no país durante o ano.
Os altos juros têm efeitos opostos nos dois termos dessa fração. Fazem aumentar a dívida (o numerador) e atuam contra o crescimento do denominador. Assim, o superávit primário, economia que o governo faz para pagar a dívida, é sempre insuficiente.
Belluzzo é considerado um dos "pais" do Plano Cruzado, que, durante parte do governo Sarney (1985-1989), estabilizou a economia com medidas como o congelamento de preços. Na gestão de Dílson Funaro na Fazenda, Belluzzo assumiu o cargo de secretário na Secretaria Especial de Assuntos Econômicos.
À época, ligado ao PMDB, também foi secretário estadual durante os governos estaduais de Orestes Quércia e Luiz Antônio Fleury Filho, em São Paulo. Entre 2001 e 2002, o economista contribuiu com sugestões para a elaboração do programa de governo do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva.