Cecília Jorge
Repórter da Agência Brasil
Brasília – Uma década depois da primeira Marcha Zumbi contra o Racismo, pela Cidadania e pela Vida, o movimento negro ficou dividido na hora de realizar outra caminhada. A Marcha Zumbi +10 acontecerá em dois dias diferentes – 16 e 22 de novembro – por falta de acordo entre as lideranças. Apesar da divisão, as mobilizações compartilham mais do que o nome: querem reparação pelas injustiças históricas e a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial.
"Infelizmente não foi possível unificar o movimento, as entidades todas do movimento negro, por conta da concepção da marcha", afirmou a coordenadora da Comissão Nacional contra a Discriminação Racial da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e responsável pelo ato do dia 22, Maria Isabel da Silva. "Nós, do dia 22, estamos sendo chamados pelo povo do dia 16 de governista, chapa-branca. Dizem que vamos a Brasília não para fazer reivindicação do povo negro, mas para aplaudir o Lula", explicou.
Maria Isabel disse que o objetivo da marcha do dia 22 é fazer uma avaliação das ações governamentais e da sociedade civil para redução do racismo nos últimos dez anos e definir as ações para a próxima década. "Então, não se trata, para nós, de ir aplaudir ou gritar ‘Fora Lula’", assegurou.
No balanço dos últimos dez anos, os organizadores das duas marchas concordam que houve avanços, mas ressaltam que ainda é preciso mais ação efetiva no combate à desigualdade racial. A criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) é citada como uma conquista tanto por Maria Isabel quanto pelo representante da coordenação do evento do dia 16 e editor do jornal Ìrohìn, Edson Cardoso.
Para Cardoso, no entanto, os avanços institucionais se traduziram até agora em poucos resultados práticos. "Há, sim, um avanço aqui, outro ali, mas nada que possa alterar ainda o quadro de desigualdade racial que é um abismo entre negros e brancos na sociedade brasileira", disse. Outra conquista, na avaliação de Edson Cardoso, foi a ampliação do movimento negro em todo o país, inclusive nas cidades do interior. "A participação da juventude e das mulheres negras também se ampliou muito. As mulheres são hoje o segmento mais representativo do movimento negro", acrescentou.
Para Maria Isabel, o aprofundamento do debate sobre discriminação racial foi um dos principais avanços da última década. "Conseguimos romper com o mito da democracia racial que existia antes de 1995", afirmou. Outro ponto positivo foi a implementação das cotas para estudantes negros nas universidades e ainda a promulgação da Lei 10.639, que tornou obrigatório no currículo escolar o ensino da história da África e dos negros no Brasil. As duas marchas reivindicam a implantação dessa lei. "Isso para nós é um avanço porque a partir da educação nós vamos desmistificar uma história que a gente tem como não verdadeira", explicou Maria Isabel.