Realização de refendo é reconhecimento da soberania popular, diz Konder Comparato

21/10/2005 - 10h27

Juliana Andrade
Repórter da Agência Brasil

Brasília – A realização do primeiro referendo da história do país, sobre o comércio de armas de fogo e munição no país, representa o "reconhecimento oficial" da soberania popular. A avaliação é do jurista Fábio Konder Comparato, professor de Direito Constitucional da Universidade de São Paulo (USP). No próximo domingo (23), segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), cerca de 122 milhões de eleitores devem ir às urnas para responder sim ou não à seguinte pergunta: "o comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?".

"Já houve dois plebiscitos no país, mas nunca houve referendo e isso significa o reconhecimento oficial de que o povo é um soberano ativo, é não apenas um mero expectador da vida política. Os assuntos que dizem respeito essencialmente à vida de todos nós e ao futuro da nação brasileira não podem ser decididos apenas pelos governantes. Tem que ser decididos pelo próprio povo", defende Comparato.

O jurista é um dos idealizadores da Campanha Nacional em Defesa da República e da Democracia, lançada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em 15 de novembro de 2004, no Rio de Janeiro. Um dos pontos defendidos pela campanha é justamente a aprovação de um projeto de lei para ampliar a possibilidade de convocação de plebiscito, referendo e iniciativa popular, que hoje dependem do Congresso Nacional.

"A Constituição declara, no artigo 14, que são manifestações da soberania popular, em igualdade de condições, o sufrágio eleitoral, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Mas a nossa oligarquia política interpreta esse artigo da seguinte maneira: plebiscito e referendo só o Congresso Nacional é que pode decidir pela sua realização. Isso significa que amanhã o Congresso Nacional poderá também dizer que só haverá eleições no país quando ele assim decidir", diz Comparato.

Segundo o jurista, a realização do referendo vai de encontro aos interesses não apenas da oligarquia política, mas da econômica e administrativa. "O que preocupa, na verdade, a oligarquia dominante, não é a proibição do comércio de armas de fogo, mas o fato de que, pela primeira vez, o povo é chamado a referendar uma lei e, portanto, o povo começa a descobrir que é soberano e que a sua soberania foi usurpada", observa. "Isso representa um golpe mortal na oligarquia", completa.

Para Fábio Konder Comparato, a consulta popular também tem função pedagógica. "À medida que o debate se amplia, a população começa a tomar conhecimento de toda a extensão do problema e essa é a função pedagógica dos referendos e plebiscitos". Sobre as propagandas gratuitas das frentes parlamentares Por um Brasil sem Armas e Pelo Direito da Legítima Defesa, veiculadas no rádio e na televisão, o jurista diz que "é impossível evitar que os argumentos sejam falaciosos, mas justamente o controle está no contraditório".

"É preciso permitir sempre a contestação dos argumentos do adversário, e o povo julgará. O povo pode errar, mas ele aprende com os seus erros". De acordo com a 78ª rodada da pesquisa CNT/Sensus, divulgada em 13 de setembro pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), 72,7% dos brasileiros são a favor da proibição da venda de arma e munição no país. Cerca de 24% disseram ser contrários à proibição e 3,3% não souberam ou não responderam. O levantamento foi realizado pelo Instituto Sensus, entre os dias 6 e 8 de setembro, em 195 municípios. Foram entrevistadas duas mil pessoas. A margem de erro da pesquisa é de até 3% para mais ou para menos.

Já pesquisa divulgada pelo Ibope na sexta-feira passada (14) mostra que 49% dos entrevistados são contrários à proibição do comércio de armas e munição, enquanto 45% são favoráveis e 6% não sabem ou não opinaram. A pesquisa foi realizada entre os dias 11 e 13 de outubro, em 143 municípios e ouviu 2.002 eleitores. O resultado mostra um empate técnico entre o sim e o não, uma vez que a margem de erro é de 2,2 pontos percentuais para mais ou menos.