Para professor, confronto entre discurso emocional e racional polarizou campanha do referendo

20/10/2005 - 14h53

Irene Lôbo
Repórter da Agência Brasil

Brasília – O professor de teoria e técnica da publicidade da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), Eneus Trindade, afirma que a propaganda sobre o referendo do dia 23 de outubro esteve dividida em dois tipos de discurso: o emocional, da frente parlamentar a favor do sim, e o racional, da frente parlamentar a favor do não.

"O Sim optou por um discurso emocional e de tratar a campanha para o referendo como se fosse uma campanha político-partidária, carregada de signos de emoção. E o Não optou por trabalhar dentro de uma lógica mais argumentativa, mais racional, colocando vantagens e desvantagens", afirma o professor.

Na avaliação de Trindade, a opção da frente parlamentar pelo desarmamento foi equivocada. "Eu acho que o assunto é muito sério para ser tratado de forma emocional. Numa decisão dessas as pessoas ficam na dúvida, porque o princípio do Sim é muito justo, nobre, mas os argumentos do não são bastante contundentes e vão dentro de uma lógica de credibilidade".

Trindade criticou também o uso de artistas globais na campanha do Sim: "São pessoas irreais, que vivem na televisão, que não sofrem os perigos da violência, do cotidiano, são pessoas que tem o poder aquisitivo alto, elas não sofrem com a questão das armas, não são pessoas reais, elas não estão no cotidiano vivendo o dia-a-dia, elas estão na mídia", argumenta.

O professor da USP analisa que o programa publicitário do Não mostrou um mundo mais próximo da realidade. "Não é à toa que os dados estão apontando para um crescimento do Não nas pesquisas, embora a gente saiba que tecnicamente temos que considerar um empate técnico", diz o professor, em referência à pesquisa Ibope divulgada na última sexta-feira. Na pesquisa, 49% dos entrevistados disseram que vão votar não, contra 45% que optaram pelo sim.

O acadêmico critica ainda a exposição de situações pessoais no programa veiculado pela frente parlamentar a favor do sim. "Se o meu filho pega uma arma em casa e mata o irmão, isso não é um problema de estado, isso é um problema particular. Tem gente que teve arma a vida toda em casa e os filhos nem sabiam que o pai tinha arma. O princípio do sim é muito válido, mas a situação da forma como foi colocada foi como uma estratégia de manipulação para desviar das discussões do governo", afirma.