Congresso Nacional precisa ser fortalecido em relação ao Executivo, avalia cientista político

12/08/2005 - 15h47

Spensy Pimentel
Repórter da Agência Brasil

Brasília – O aperfeiçoamento das relações entre Executivo e Legislativo no Brasil passa pelo fortalecimento do Congresso Nacional, segundo avalia o cientista político Fabiano Santos, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj). "Hoje, o sistema dá várias tentações para que o presidente exerça o poder de forma unilateral", disse ele, durante participação na Conferência Internacional sobre Desafios e Perspectivas do Fortalecimento das Instituições Políticas Brasileiras. O evento, realizado no auditório Nereu Ramos, da Câmara dos Deputados, terminou nesta quinta-feira.

Entre as medidas que Santos propõe para fortalecer o Congresso, estão uma "restrição forte" ao uso de medidas provisórias e a mudança nas regras que hoje permitem ao presidente determinar "urgência" na tramitação de determinados projetos – o que faz, segundo ele, com que deixem de ser devidamente apreciados pelas comissões permanentes do Congresso. Da mesma forma, decisões relativas ao Orçamento da União, como o contingenciamento de verbas, segundo ele, "não poderiam ser decisão unilateral do Ministério da Fazenda".

O cientista político também lembrou em sua palestra que existe uma centralização de poder dentro do próprio Congresso, sobre a figura das lideranças partidárias, além de mecanismos criados pelo regime militar que impedem que parlamentares se especializem no acompanhamento de determinados assuntos – como o rodízio obrigatório entre as comissões, por exemplo.

Fabiano Santos defendeu o presidencialismo de coalizão praticado no Brasil. Ele sublinhou que, por duas vezes, em 1963 e 1993, o povo já foi consultado sobre sua preferência em relação ao parlamentarismo, ou semi-presidencialismo (sistema em que convivem presidente eleito diretamente e primeiro-ministro escolhido pelo parlamento), e optou pelo atual sistema.

O especialista lembrou que, nesse contexto, a formação de maioria no Congresso acontece em alguns governos, como o anterior, de Fernando Henrique Cardoso, como fruto de três condições: unidade em torno de uma agenda (as reformas liberais, no caso), a presença de poucos atores políticos e a homogeneidade ideológica entre eles. Nesse caso, segundo ele, a base funciona como "cartel".

A dificuldade do governo atual de formar maioria no Congresso, segundo ele, seria explicada exatamente pela ausência desses fatores: um grande número de atores políticos na coalizão, com uma agenda que os divide, já que têm heterogeneidade ideológica. Tendo em vista um caso como esse, Santos defende que o país precisa avançar para a discussão da formação de governos de minoria – o que, segundo ele, se verifica atualmente em quase 50% das democracias européias.

Leia a seguir a segunda parte dos principais trechos da entrevista concedida por ele à Agência Brasil, logo após sua participação no evento no Congresso.

Agência Brasil - Como o sr. relaciona o atual regime de presidencialismo de coalizão ao contexto dos últimos governos e das crises que têm surgido?

Fabiano Santos - O fato é que, sob algumas condições, essa operação do presidencialismo de coalizão pode ser muito consistente. Essas condições foram dadas , por exemplo, durante o governo Fernando Henrique e durante o governo Juscelino Kubitschek

Mas, outras condições não são tão favoráveis à formação de maiorias, então acho que temos que pensar em modelos alternativos de governo. Modelos de minorias são experiências muito comuns nas democracias e acho que nós devemos evoluir pra lá, para dar maior consistência ao nosso sistema de governo

ABr - Seria possível ter um governo de minoria no Brasil?

Fabiano Santos - Seria perfeitamente possível.

ABr - Quais as medidas que o sr. defende para melhorar o relacionamento entre o Executivo e o Legislativo? Durante o debate, falou-se até em semi-presidencialismo, como forma de limitar os poderes legislativos do presidente e garantir que as crises de governo não se transformem em crises de regime.

Fabiano Santos - Acho que não é a saída , a população já decidiu que não quer o semi-presidencialismo, não quer o parlamentarismo, isso já foi perguntado duas vezes (em 1963 e 1993).

O que se tem que discutir é como fortalecer o Congresso para que ele seja um ator ativo no processo de produção de políticas públicas. Deveria haver uma restrição forte às medidas provisórias. Também é preciso rediscutir a urgência constitucional regimental, fortalecer as comissões, investir e instrumentalizar o Congresso. Tudo isso é para que, na ausência de um Executivo que tenha o cartel legislativo, o Congresso possa definir uma agenda ele mesmo, por meio de seus partidos, sendo de oposição, com interesse de mostrar à sociedade que é capaz de produzir políticas publicas, e que o faça. Isso depende de mudanças institucionais dentro do Congresso, como descentralização do poder etc.