Gabriela Guerreiro e Iolando Lourenço
Repórteres da Agência Brasil
Brasília - A idéia de desviar parte das águas do rio São Francisco para regularizar o abastecimento de água potável, minimizar os efeitos da seca e favorecer a irrigação no Nordeste setentrional brasileiro está perto de se tornar realidade com o possível início das obras no fim de agosto. O plano é antigo e vem sendo discutido há mais de 15 anos no Congresso Nacional.
Ao longo desse período, os deputados e senadores não conseguiram chegar a um consenso sobre a importância da obra da integração de bacias (antes, chamada "transposição") para a região Nordeste. Nem a própria bancada nordestina na Câmara é unânime na defesa da atual proposta do governo federal - que prevê a transferência de águas do Velho Chico para abastecer pequenos rios e açudes da região Nordeste que possuem déficit hídrico durante o período de estiagem.
Em sua versão mais recente, a chamada transposição do rio São Francisco é uma idéia que começou a ser discutida pelo governo federal em 1985, quando o projeto ainda estava submetido ao extinto Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS). Em 1999, a proposta foi transferida para o Ministério da Integração Nacional - onde permanece até hoje.
Com a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o projeto deixou de ser considerado apenas como a transposição do rio para ser chamado de integração do São Francisco às bacias do Nordeste setentrional. Outra mudança foi a ampliação do número de participantes nas discussões sobre o desvio de curso do rio, como o Ministério do Meio Ambiente, a própria sociedade civil e as três esferas de governo.
O coordenador da bancada do Nordeste na Câmara, deputado Benedito de Carvalho Sá (PSB-PI), o B. de Sá, explica por que os parlamentares nordestinos divergem sobre a necessidade da obra. Segundo o deputado, a maioria da bancada é favorável à integração, com exceção de um grupo de deputados do sul do Nordeste, que teme prejuízos para as economias locais se houver danos às margens do rio. "Eles entendem que essa retirada do rio provocaria mais danos ao rio do que já possui. No entender deles, o rio precisa de revitalização, e nós concordamos inteiramente. E o governo federal está realizando ações práticas para revitalização do rio", ressaltou o deputado.
Para o deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA), um dos maiores críticos do projeto na Câmara e líder da minoria na Casa Legislativa, o projeto é inviável tanto do ponto de vista da transposição das águas do rio como do impacto ambiental da obra. "É claro que não é viável fazer irrigação com água transposta do rio. Nós temos mais de dois milhões de hectares disponíveis no Vale do São Francisco para irrigar. Como as pessoas vão ter produtos irrigados na transposição para concorrer com aqueles que irrigam na margem do rio? É evidente que esse projeto é inviável", criticou Aleluia.
O deputado pefelista afirmou que, além dos parlamentares da Bahia, os representantes de Pernambuco, Sergipe e Alagoas estão preocupados com a execução da obra - especialmente no que diz respeito à diminuição da água que chega ao Atlântico. Aleluia garantiu que sempre foi um crítico do projeto, mesmo durante o governo Fernando Henrique Cardoso. "O projeto do Fernando Henrique era tão ruim quanto o do Lula. Eu fui contra o do FHC, o do Mário Andreazza (ex-ministro do Interior do governo militar), sou contra qualquer projeto de transposição", disse.
Na opinião de Aleluia, a idéia viável é a construção de uma adutora de 10 m³ por segundo (o plano atual prevê 26m³/s - anteriormente, o projeto previa até 360m³/s) "para levar água para a Paraíba, para as pessoas e os animais beberem, além de alimentar as fábricas - mas nunca para fazer irrigação".
Já o senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), ex-governador do Rio Grande do Norte, discorda da opinião do líder da minoria na Câmara e entende que o projeto é a realização de um sonho dos nordestinos. "A retirada de água é mínima, como já foi demonstrado, e vai se constituir justamente nessa garantia que os nordestinos esperam. Trata-se de um projeto que vem sendo estudado tecnicamente há muito tempo, então a sua viabilidade técnica está plenamente assegurada", ressaltou.
O senador disse que os parlamentares baianos precisam compreender que a obra de transposição é essencial para os nordestinos. Na opinião de Garibaldi, a integração do São Francisco vai resolver um dos maiores problemas dos nordestinos: a falta de água. "A água como um bem essencial não pode ser negada, uma vez que ela poderia ser disponibilizada com tão pouca quantidade de retirada do rio São Francisco".
Segundo o deputado B. de Sá, a grande vantagem do projeto do governo federal é levar água aos estados mais carentes do Nordeste - a Paraíba, o Ceará, o Rio Grande do Norte e Pernambuco. "Hoje, a Paraíba tem limitação de água abaixo do recomendado per capita por ano pela Organização Mundial da Saúde. A obra vai oferecer água para o consumo humano para milhares de habitantes dessa região", disse.