Reforma do ensino fundamental é o grande desafio, diz presidente da SBPC

17/07/2005 - 8h59

Olga Bardawil
Repórter da Agência Brasil

Fortaleza - Há mais ciência em uma tesoura que em um celular. Só que a maioria das pessoas não percebe. Essa é a opinião do professor Enio Candotti, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que participa, a partir de hoje (17), da 57ª reunião anual da entidade. Os trabalhos, simpósios, conferências e exposições promovidas pela SBPC prosseguem até sexta-feira (22), na Universidade Estadual do Ceará (UECE), nesta capital.

Para Candotti, a idéia de que o brasileiro não se interessa por ciência é equivocada. "O que existe é uma dificuldade ainda de formação dos próprios professores. O ideal seria que o interesse pela ciência começasse no primário. Isso não acontece, em parte, porque os professores não têm formação adequada para isso. É o que queremos mudar", diz. Acrescenta, ainda, que a formação deficiente acaba por gerar uma falta de percepção da ciência em coisas simples do nosso dia-a-dia.

"Uma tesoura, uma alavanca ou um palito de fósforo, a seu tempo, foram invenções tão importantes quanto hoje é o celular ou o microondas. Para entender como funciona o microondas e o celular é preciso entender como funciona uma tesoura, prestar atenção à tesoura, ao fósforo à vela", observa Candotti. Ele reconhece que nos últimos vintes anos o Brasil deu passos importantes na formação acadêmica. Mas lembra que "as exigências agora são maiores". "Onde andávamos, agora precisamos correr. E a turma está meio fora de forma para correr", avalia.

Enio Cadotti lembra que o Brasil tem uma carência de 200 mil professores de ciências no ensino fundamental e que vai levar mais de 50 anos para suprir essa necessidade, principalmente por causa da dimensão geográfica do país e das diferenças regionais. Considera que o grande desafio não é a reforma universitária, que envolve apenas 3 milhões de alunos, mas a reforma do ensino fundamental, que vai atingir 50 milhões.

Declarando-se fundamentalmente otimista, Enio Candotti diz que o Brasil não deve aspirar a ser país de primeiro mundo porque "o Primeiro Mundo só é primeiro mundo visto de fora". "O que importa é reconhecermos o que somos e a partir de uma boa avaliação das nossas próprias forças procurar dar alguns passos para frente e não para trás", afirma. Nesse sentido, acrescenta Candotti, a primeira condição para se chegar lá é levar a sério a questão da igualdade social. Segundo ele, um país com as desigualdades regionais e sociais que nós temos não chegará nunca ao Primeiro Mundo dos nossos sonhos. E "será sempre uma paródia, uma imitação".

Para Candotti, é importante insistir em uma educação na área de ciências lá nos primeiros anos da escola para que todos convivam com ela. "A Ciência não morde. Pode se conviver com ela e ao conviver com ela se descobre dimensões do mundo que muitas vezes permanecem distantes. Eu acho que essa é a função da SBPC: aproximar o mundo, assim como ele é, à nossa capacidade de entendê-lo e mostrar que afinal há mais ciência em uma tesoura que em um celular", ensina Cadotti.

A 57ª Reunião Anual da SBPC que vai até o dia 22, tem este ano como tema "Do sertão olhando o mar: cultura e ciência".