Juliana Andrade
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Um dos principais canais de interlocução do governo federal com os movimentos sociais na parceria pelo aperfeiçoamento do Sistema Único de Saúde (SUS) é a Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular e Saúde (Aneps). Criada em 2003, a Aneps é composta pela Rede de Educação Popular e Saúde, pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e pelos movimentos Popular de Saúde e das Mulheres Camponesas, entre outros.
"No início de 2003, começamos a discutir com o governo uma agenda pública para a questão da educação popular em saúde, entendendo que uma articulação de vários movimentos poderia ajudar tanto na formulação de políticas quanto pautar alguns pontos importantes para os movimentos", explica o educador e antropólogo Carlos Silvan, representante do Núcleo Executivo de Formação da Aneps.
Segundo ele, a Aneps também articula movimentos sociais de atuação local, além de práticas como as de rezadeiras, parteiras e benzedeiras. "São pessoas que fazem saúde, cuidam da saúde da população, mas que não são médicos, enfermeiros nem estão nas universidades".
Silvan reconhece que as práticas populares, muitas vezes, são vistas com ceticismo. "Há uma disputa muito grande entre o conhecimento da academia e o conhecimento do povo, como se um fosse melhor que o outro". Segundo ele, o entendimento da Aneps é que existem diferentes níveis de conhecimento relacionados à saúde. "Alguns são legitimados pela academia, por pesquisas. Outros, a academia é completamente contra, mas o encaminhamento a ser feito é tentar esse diálogo entre a academia, os serviço de saúde e os movimentos sociais".
O antropólogo trabalha com educação popular em saúde em comunidades do Recife, onde as práticas populares "têm papel fundamental". "Às vezes, são o único cuidado que a comunidade tem, porque os serviços de saúde geralmente não chegam e, quando chegam, o acesso é difícil, a garantia do direito é difícil, então essas práticas se tornam uma rede solidária de cuidado com o outro".
O trabalho junto às comunidades também é importante, de acordo com o educador, porque geralmente é na vizinhança que o doente recebe o primeiro atendimento, antes de ter acesso ao serviço de saúde. "O primeiro atendimento que uma mulher, uma criança recebe quando está doente é o vizinho que faz, um parente, uma rezadeira, uma pessoa mais próxima, porque às vezes o acesso ao serviço de saúde pública não é fácil ou não é garantido".
"Na comunidade, há uma prática de cuidado com a saúde que é impressionante, porque é onde a integralidade, que é o princípio do Sistema Único de Saúde, acontece mais fortemente. Lá estão colocados os princípios da solidariedade, da ajuda mútua, então os vizinhos se ajudam muito, porque eles estão na mesma condição", acrescenta Silvan.
Ele explica que o trabalho do educador popular em saúde é, antes de tudo, uma "escuta atenta, respeitosa e cuidadosa" sobre os problemas de saúde que mais afligem a comunidade. "A gente sempre se encontra para discutir o que é que pode fazer juntos, mas percebe que os problemas de saúde vão desde o direito ao acesso à assistência até o direito à moradia, à luta pelo trabalho", diz.
Segundo o representante da Aneps, uma das formas de atuação do educador popular é ajudar grupos que querem se organizar para lutar pelo direito à saúde, como conselheiros de saúde e representantes de redes solidárias de combate à tuberculose, ao tabagismo, à violência contra mulheres. "A gente trabalha muito com oficinas pedagógicas de formação de pessoas para pensar a saúde individual e coletiva".