Federação aponta falta de recursos no distrito sanitário do Alto Rio Negro que atende 23 mil índios

20/06/2005 - 14h23

Juliana Cézar Nunes e Thaís Brianezi
Repórteres da Agência Brasil

Manaus – A Federação das Organizações Indígenas do Alto Rio Negro (FOIRN) enviou na última sexta-feira uma carta ao ministro da Saúde, Humberto Costa, denunciando os problemas no atendimento da saúde básica dos 23 mil indígenas que vivem nos 110 mil quilômetros quadrados da área do Distrito Sanitário Especial Indígena Alto Rio Negro (DSEI-RN), em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. "Há constantes atrasos no repasse da verba, a gente sobrevive do crédito no comércio local. Mas nem tudo se compra fiado", diz o coordenador do DSEI-RN, Hernane Guimarães dos Santos.

Desde 1999, quando a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) assumiu o subsistema de saúde indígena e dividiu o território nacional em 34 DSEIs, o atendimento em São Gabriel da Cachoeira passou a ser feito, por meio de convênio, pela FOIRN. "Os atrasos no repasse de recursos são comuns. O problema é que no ano passado, com as denúncias de irregularidades na execução dos convênios, a Funasa assumiu as partes gerenciais do processo – antes feito pelas entidades conveniadas", conta Santos.

Segundo o diretor de assuntos indígenas da Funasa, Alexandre Padilha, entre as irregularidades identificadas na prestação de contas estão dados incompletos e compras sem licitação. Com a mudança, a Funasa ficou responsável pela compra de insumos e medicamentos, como informa Santos. "Isso provocou entraves, decorrentes da tecnoburocracia e da falta de planejamento." De acordo com ele, há seis meses o distrito não recebe remédios.

Para Padilha, esse atraso é, na verdade, uma forma de pagamento adotada em conseqüência de problemas identificados na prestação de contas. "Iniciamos o convênio em 2004 com repasse mensal. Mas a prestação de contas nos mostrou a necessidade de unificar algumas parcelas para, então, repassá-las", informa Padilha.

O diretor afirma que, de julho do ano passado até o último domingo, foram repassados R$ 7,1 milhões à federação em quatro blocos de pagamento. "Nesta segunda-feira, foi deposita a parcela final de R$ 2,5 milhões", garante o diretor.

O coordenador do DSEI-RN, no entanto, afirma que os R$ 2,5 milhões que a Funasa deveria repassar nesta semana à fundação – relativos às verbas de maio, junho e julho – estão em grande parte comprometidos com dívidas. "Entre o fim do último convênio e a assinatura do convênio atual (nº 1336/2004, de julho), ficamos 46 dias descobertos. Mas sem parar o atendimento. Tivemos que usar a verba recebida para cobrir gastos desse período", explicou Santos.

"E para não pagar uma multa de R$ 500 mil ao Ministério do Trabalho, fomos obrigados a recontratar imediatamente os 305 funcionários demitidos com o fim do convênio anterior, que continuaram trabalhando. Com isso, nossas contas foram aprovadas com restrição, porque formalmente é difícil justificar gastos com folha de pagamento realizados em um período no qual não havia convênio em vigor. Um ciclo sem fim: a demora na aprovação das contas que gera mais demora no repasse dos recursos."

Os indicadores de saúde traduzem os problemas relatados ao ministro na carta da FOIRN. Em 2004, o índice de mortalidade infantil foi de 50 mortos por 1 mil nascidos vivos, mais que o dobro da média nacional de 24,35 óbitos – o dado é o mais recente da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, porém relativo a 2003.

Os índices de saúde bucal também revelam penúria, quando comparados com as referências da Organização Mundial da Saúde (OMS): apenas 3.8% das crianças com 5 anos estão livres da cárie dentária (OMS preconiza 50%) e só 12,8% da população adulta de mais de 35 anos possui mais de 20 dentes (OMS preconiza 75%).

A Funasa diz que "planeja verificar as dificuldades da FOIRN em administrar os recursos".