Governo defende uso de células-tronco embrionárias no país, mas especialistas divergem

09/06/2005 - 0h55

Marcela Rebelo
Repórter da Agência Brasil

Brasília – A discussão sobre o uso de células-tronco embrionárias no país foi o tema do debate do programa Diálogo Brasil de ontem (8). O ministro da saúde, Humberto Costa, que participou do debate, disse estar confiante de que o Supremo Tribunal Federal (STF) permita as pesquisas com esse tipo de células no país.

No dia 30 de maio, o procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no STF contra o artigo da Lei de Biossegurança, que possibilita pesquisas com células-tronco embrionárias. Para Fonteles, as pesquisas vão contra o artigo 5º da Constituição, que garante o direito à vida. Isso porque, na opinião do procurador, a vida começa na fecundação e os pesquisadores estariam destruindo um embrião. Ele já declarou ser a favor da pesquisa com células-tronco adultas.

"Esperamos que o parecer da maioria dos ministros do STF seja pela garantia da constitucionalidade da lei", declarou Humberto Costa. O ministro afirmou que as células embrionárias têm mais capacidade de se diferenciar do que as adultas, e por isso manifestou a posição do governo de que elas possam ser usadas em pesquisas no Brasil. "Confio no bom-senso do STF, pois se trata de um artigo muito importante para o desenvolvimento do país."

Para ele, a conduta de alguns setores da sociedade, como a Igreja, não pode prevalecer aos interesses da maioria da população.

Mas a professora da Universidade de Brasília (UnB), especialista em microbiologia, Lenise Garcia, que também participou do programa, discordou do ministro. Ela é contra o uso de células-tronco embrionárias. "A visão da igreja coincide com a da ciência. A maioria dos cientistas concorda que a vida começa com a fecundação. A visão de que o ser humano começa com o sistema nervoso é uma visão daquele que está interessado em usar as células-tronco", disse.

A professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Cláudia Batista, que é especialista em células-tronco, concordou com Lenise. "Após a fecundação, estaríamos interferindo em todo o programa de desenvolvimento de um indivíduo da espécie humana", afirmou. Ela disse ainda que o assunto deveria ser mais debatido com a sociedade. "Não houve uma discussão nacional. A informação é importante para formar a opinião pública", ressaltou. Ela também participou do programa dos estúdios da TVE Brasil, no Rio de Janeiro.

O ministro afirmou que "a lei foi clara ao estabelecer limites éticos na utilização das células-tronco embrionárias". A lei de Biossegurança permite o uso de células-tronco embrionárias apenas quando os embriões são doados, com o consentimento dos pais, e estejam congelados há mais de três anos. A legislação proíbe a clonagem humana. Mas a professora Lenise Garcia ressaltou que a lei não traz sanções claras para quem não a cumpre.

Na TV Cultura, a professora da USP, especialista em genética humana, Mayana Zatz, defendeu a pesquisa com células-tronco embrionárias. "Eu trabalho com doenças genéticas letais. Com crianças que estão morrendo em cadeiras de rodas. Posso olhar para esses olhos e dizer que existe uma possibilidade, a partir dessas células que, no futuro, talvez sejam o tratamento", relatou a especialista. "Será justo deixar esses embriões morrerem e nada fazer com eles? Será que a gente pode comparar a vida de uma criança, de um jovem, com a de um embrião congelado?"

Mayana afirma que as células-tronco adultas têm um potencial limitado e as embrionárias podem formar mais tecidos.

O Diálogo Brasil é uma parceria entre a Radiobrás, a TV Cultura de São Paulo e a TVE Brasil do Rio de Janeiro. O programa é mediado pelo jornalista Florestan Fernandes Jr. e exibido ao vivo todas as quartas-feiras, com uma hora de duração. É gerado pelo canal de TV a cabo da Radiobrás (NBR) para 822 pontos de transmissão no país. Em Brasília é transmitido também pela TV Nacional e integra a rede pública de televisão, sendo veiculado em 19 estados e no Distrito Federal.