Centro dará liderança ao Brasil no estudo com células-tronco para tratamento cardíaco

02/02/2005 - 14h21

Lana Cristina
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O Brasil vai liderar o maior estudo com células-tronco adultas para tratamento de doenças do coração já realizado no mundo, pela quantidades de casos a serem avaliados e pelo número de instituições envolvidas. São quase 40 instituições médicas e de pesquisa avaliando 1.200 pacientes portadores de quatro enfermidades, infarto agudo do miocárdio, doença isquêmica crônica do coração, cardiomiopatia dilatada e cardiopatia chagásica. A pesquisa já em desenvolvimento no país para um tratamento efetivo contra a doença de Chagas, por exemplo, é inédita no mundo.

O ministro da Saúde, Humberto Costa, anunciou o início do estudo em solenidade no Instituto Nacional de Cardiologia de Laranjeiras (INCL), no Rio de Janeiro. A iniciativa tem o nome de Estudo Multicêntrico Randomizado de Terapia Celular em Cardiopatias e envolverá recursos da ordem de R$ 13 milhões, previstos no orçamento do Ministério da Saúde.

O objetivo é substituir tratamentos cardíacos tradicionais - que incluem cirurgias, medicamentos e até transplantes – pela terapia com células-tronco. Essas células têm sido estudadas há alguns anos para cura de diversas doenças, inclusive degenerativas como o Mal de Alzheimer. Abundantes em embriões e, em menor quantidade, em tecidos celulares mais maduros como o cordão umbilical e a medula óssea, as células-tronco são as matrizes que se especializam para dar origem a células de órgãos específicos como neurônios, do músculo cardíaco, fígado, pele etc.

Segundo o ministro, o governo decidiu investir na terapia celular porque a técnica vem apontando resultados promissores no mundo todo e oferece um tratamento menos invasivo, com uma cirurgia mais simples e com menos tempo de internação. A pessoa que tem células-tronco implantadas no coração volta para casa no dia seguinte. Além disso, observou Costa, haverá uma economia da ordem de R$ 450 milhões por ano nos gastos com o tratamento de doenças coronárias.

Pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o governo desembolsou, em 2003, R$ 500 milhões com consultas, cirurgias para implante de ponte de safena ou mamária, transplante, internação e distribuição de medicamentos para hipertensão e melhoria de insuficiência cardíaca. Calcula-se que, ao substituir o transplante pela terapia celular, o custo do tratamento seja reduzido em 10 vezes. "É uma redução muito expressiva", disse o ministro, embora tenha ressaltado que o maior benefício é o conforto e qualidade de vida que o paciente ganha. "É um procedimento mais simples de ser realizado, o tempo de internação é de 24 horas, não há risco de rejeição, nem efeito colateral, e a melhoria do funcionamento do músculo cardíaco é evidente", completou.

Os estudos vão durar três anos e, nesse período, metade dos pacientes receberá o tratamento tradicional, com os melhores recursos farmacológicos e cirúrgicos disponíveis. A outra metade será submetida à terapia celular. O objetivo é mostrar a eficiência da técnica, algo que vem sendo comprovado em pesquisas isoladas no Brasil, para adotá-la como tratamento se os resultados forem positivos. Hoje, duas instituições já realizam pesquisas na área, o Hospital Pró-Cardíaco do Rio de Janeiro e o Instituto do Coração (InCor) da Universidade de São Paulo (USP).

Depois de confirmada a eficácia da terapia celular, o ministério da Saúde adotará o tratamento em toda a rede de hospitais do SUS. "Este é, sem dúvida, o maior estudo já realizado com terapia celular para problemas cardíacos feito no mundo. E nos dará todo um conhecimento, know-how, para quem sabe, num espaço de tempo não muito longo, adotar a própria realização da terapia no Sistema Único de Saúde", prevê.

No Brasil, quatro milhões de pessoas sofrem de insuficiência cardíaca grave. Se, ao final do estudo, for comprovada a eficiência das células-tronco na recuperação da capacidade cardíaca como já se prenuncia pelos estudos preliminares, estima-se que 200 mil vidas serão salvas em três anos.

A direção do Estudo e Terapia Celular em Cardiopatias ficará por conta de uma comissão coordenadora formada por pesquisadores envolvidos nas pesquisas. O INCL será o centro coordenador, responsável por escolher os pacientes que participarão do estudo, monitorá-los, prestar assessoria técnica, criar e manter uma base de dados, e também por selecionar e acompanhar os monitores externos que vão avaliar os resultados.

Haverá quatro centros-âncora, o INCL, o InCor, o Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em colaboração com o Hospital Pró-cardíaco e o Hospital Santa Isabel em colaboração com o Centro de Pesquisa Gonçalo Muniz (BA), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

Cada um cuidará, respectivamente, do estudos com uma das doenças-alvo da pesquisa, cardiomiopatia dilatada (INCL), doença isquêmica crônica do coração (InCor), infarto agudo do miocárdio (UFRJ) e cardiopatia chagásica (Sta. Isabel). Algo em torno de 40 centros colaboradores (do Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo, Paraná, Pernambuco, Ceará, Bahia, Goiás, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais) serão vinculados aos "âncora" para realização dos estudos.

Na visita ao INCL, o ministro da Saúde inaugura também o Laboratório Multidisciplinar de Terapia Celular, unidade que será essencial para os estudos com uso de células-tronco. "O laboratório será um parâmetro importante para esse estudo", explicou Costa.