Sociedade brasileira precisa conhecer sua história, defende grupo Tortura Nunca Mais

26/10/2004 - 15h58

Brasília – Criada há quase 20 anos, a organização não-governamental Tortura Nunca Mais, formada por familiares de mortos e desaparecidos políticos, defende que, para consolidar a democracia no país, é preciso colocar os arquivos da época da ditadura militar à disposição da sociedade. "A sociedade brasileira precisa conhecer a sua história", afirmou hoje a vice-presidente da ong, Cecília Coimbra, durante entrevista à rádio Nacional AM.

"Nós consideramos que é inadmissível para qualquer democracia construir alguma coisa se ela não conhece sua história recente e se ela não resgata esta memória. Desde a época que nosso grupo se formou, época do governo José Sarney, já exigíamos e reivindicávamos a abertura de todos os arquivos".

Após a publicação de reportagem do jornal Correio Brasiliense exibindo supostas fotos do jornalista Vladimir Herzog preso, antes de ser assassinado pela repressão em 1975, o grupo voltou a questionar a existência desses arquivos.

"São arquivos que pertencem à sociedade. Não são arquivos de propriedade de ninguém e sistematicamente as autoridades negavam a existência destes arquivos. Esta negativa aconteceu nos diferentes governos, inclusive no atual, pois semana passada nós estivemos com o Secretário Nacional dos Direitos Humanos, Nilmário Miranda, que nos afirmou que estes artigos não existiam. Mas nós sempre soubemos da existência de tais arquivos."

Nacional AM - O jornal Correio Brasiliense publicou fotos que supostamente são de Vladimir Herzog, jornalista que foi morto nas dependências do Departamento de Operações de Informações e Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), trazendo à tona o assunto dos desaparecidos políticos e outras questões. A grande questão que esta na pauta do dia é esta: abrir ou não abrir os arquivos do regime militar. Qual é a posição do Movimento Tortura Nunca Mais?

Cecília Coimbra - O Grupo Tortura Nunca Mais, desde a sua criação em 1985 - no próximo ano estará fazendo 20 anos - vem afirmando que os arquivos da ditadura, os chamados arquivos sigilosos da repressão, eles vão ser abertos para que a sociedade tome conhecimento da sua história. Nós consideramos que é inadmissível para qualquer democracia construir alguma coisa se ela não conhece a sua história recente e se ela não resgata esta memória.

Desde a época que nosso grupo se formou, época do governo Sarney, já exigíamos e reivindicávamos a abertura de todos os arquivos. Os arquivos do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) do governo estadual, foram os únicos colocados à disposição de pesquisas que nós fizemos. Nós, inclusive, colocávamos que os outros arquivos a nível federal, como o do Serviço Nacional de Informações (SNI), do DOI-CODI e dos Serviços de Informação do Exército, Marinha e Aeronáutica, são arquivos que pertencem à sociedade. Não são arquivos de propriedade de ninguém e sistematicamente as autoridades negavam a existência destes arquivos.

Esta negativa aconteceu nos diferentes governos, inclusive no atual, pois semana passada nós estivemos com o Secretário Nacional dos Direitos Humanos, Nilmário Miranda, que nos afirmou que estes artigos não existiam. Mas nós sempre soubemos da existência de tais arquivos.

Então, este é um momento muito importante para a história e para o resgate da memória do país porque é fundamental não só para aquelas pessoas que tiveram envolvimento direto com a repressão, como no caso dos familiares dos mortos e desaparecidos ou dos ex-presos políticos. A sociedade brasileira precisa conhecer a sua história e esse é um momento muito importante para resgatar esta memória.

Nacional AM - O que poderá nos revelar estes arquivos secretos do regime militar?

Cecília - Eu acho que não só informações históricas muito importantes dos fatos que ocorreram neste país - que são fatos ainda mantidos em sigilo, em segredo - mas também uma coisa fundamental e que diz respeito a toda a sociedade brasileira e, em especial, aos familiares de mortos e desaparecidos políticos.

Vocês devem saber que muitos desaparecidos políticos e muitos mortos políticos, até hoje, não tiveram seus restos mortais entregues às suas famílias e, além disso, não se sabe como e em quais circunstâncias estas pessoas foram mortas. Isso é fundamental para que estes familiares possam resgatar um pouco de sua história. Nós temos um pensamento que diz o seguinte: "A gente só pode esquecer aquilo que a gente sabe". É fundamental que nós e, em especial os familiares dos mortos e desaparecidos políticos, possamos conhecer esta história.