Edla Lula
Repórter da Agência Brasil
Brasília - Ministros da Argentina, Paraguai, Uruguai e Brasil discutem e decidem hoje, no Rio, durante almoço no Copacabana Palace, a posição do Mercosul em relação ao destino do acordo de livre comércio com a União Européia. Com prazo para serem concluídas no dia 31 deste mês, as negociações não prosseguiram no final de setembro, quando ambos os blocos apresentaram as suas "propostas pré-finais" para a entrada de produtos livre de tarifas nos respectivos mercados. Nem os negociadores da União Européia gostaram da proposta do Mercosul nem o grupo sul-americano ficou satisfeito com a do grupo europeu.
O almoço de trabalho é oferecido pelo ministro brasileiro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e prepara também reunião entre chanceler e o comissário de Comércio da UE, Pascal Lamy,
inicialmente marcada para o dia 20 deste mês, em Lisboa.
Para os europeus, a proposta do Mercosul representa um retrocesso em relação a proposições anteriores, especialmente porque diminuiu o número de produtos da Europa que entrariam nos países membros com alíquota zero no Imposto de Importação. Os negociadores do Mercosul se defendem afirmando que a última oferta, feita no dia 24 de setembro, abre o leque de redução tarifária na área de bens para 90% das exportações européias para a região. Além disso, o Mercosul cedeu, ao privilegiar a União Européia em áreas como compras governamentais, investimentos e serviços.
Do lado sul-americano, a contra-proposta da União Européia foi recebida como inaceitável, porque, além de diminuir espaço anteriormente cedido para entrada de mercadorias
importantes para a região, como as do setor agrícola, impõe regras consideradas prejudiciais para os países do Mercosul como a exclusão, no acordo, de mercadorias beneficiadas pelo
sistema de drawback, que isenta ou reduz os impostos sobre insumos de produtos fabricados com a finalidade de exportação.
No caso da carne bovina, por exemplo, a proposta da UE prevê, na primeira etapa, quota de 60 mil toneladas para os quatro países do Mercosul, a ser implementada ao longo de dez anos. Pela regra o Brasil ficaria, no primeiro ano, com uma quota de 2,4 mil toneladas. No Itamaraty conta-se que o estabelecimento dessas quotas foi até motivo de piada entre os ministros do Mercosul: "não dá nem para fazer um churrasco", teria dito a ministra paraguaia, Leila Rachid de Cowles.
Segundo o chefe do Departamento de Negociações Internacionais do Itamaraty, Regis Arslanian, o Mercosul não tem pressa em concluir o acordo até o dia 31 de outubro, data de interesse
da comissão européia, tendo em vista que este será o último dia do mandato dos atuais integrantes da Comissão Européia. "É melhor fechar um bom acordo depois do prazo, do
que fechar um mau acordo", defendeu o diplomata.
Enquanto isso, os observadores acompanham com preocupação o desenrolar das negociações. "O grau e a natureza das divergências entre os dois blocos são tamanhos, que tornam complicada a pretensão de encerrar as negociações até outubro", diz o diretor do Instituto de Relações Internacionais da UnB, Alcides Costa Vaz.
Para o professor, no entanto, o Mercosul deve insistir no acordo de livre comércio com a Europa. "Estamos numa posição muito delicada porque em fracassando as negociações com a
União Européia não teríamos extraído êxito em nenhuma de nossas negociações em bloco, nem no que se refere à Alca, nem ao acordo com a União Européia. Este é um aspecto preocupante
porque os acordos regionais continuam ocupando um espaço importante na estratégia comercial.
De outra maneira, só nos restará a Organização Mundial do Comércio", ponderou o diretor.
Os exportadores comungam da tese de que é melhor extrapolar o prazo a fechar um mau acordo. "O Mercosul ficaria muito mal colocado se as ofertas feitas pela União Européia fossem
aceitas", disse o presidente do Conselho de Integração Internacional da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Osvaldo Douat.
"A União Européia recuou na decisão do estabelecimento de quotas agrícolas e se não houver uma revisão dessa posição por parte dos negociadores europeus, teremos um ganho muito
pouco expressivo para justificar o acordo", opinou Douat.
Ele ressalta ainda que mais 10 novos países estarão representados na comissão que a partir de primeiro de novembro passa a comandar as negociações e "isso significa a
demanda de mais tempo para se chegar a um acordo".
A União Européia representa hoje 25% das exportações brasileiras e, para Douat, o país não vai conseguir uma "ampliação expressiva" das vendas para a região caso o acordo retroceda.