Cecília Jorge
Repórter da Agência Brasil
Brasília - De cada 100 mulheres que têm filhos no Brasil 28 engravidam antes dos 18 anos. Desde 1980, o número de adolescentes grávidas aumentou 15%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Gabriela de Jesus Brito faz parte da estatística. Aos 16 anos, ela ficou sabendo que estava grávida de seu primeiro namorado. Teve o filho um mês depois de completar 17 anos.
Hoje, aos 19 anos, ela conta que teve que reorganizar toda a sua vida por conta da gravidez precoce. "Até para sair, para me divertir eu tenho que contar com a compreensão da família e até das minhas amigas", disse.
Cerca de 700 mil meninas se tornam mães a cada ano no país. Aproximadamente 27% dos partos feitos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em 1999, foram em adolescentes de 10 a 19 anos. Desse total, 1,3% são partos realizados em garotas de 10 a 14 anos.
Gabriela teve que superar o medo de contar a novidade para os pais, de perder o namorado e até mesmo o emprego. "Eu tinha conseguido o meu primeiro emprego, estava há um mês trabalhando. Eu fiquei desesperada, pensando que ia dar tudo errado, que meu pai não ia me aceitar, que o meu namorado ia me abandonar", disse.
Seis meses depois que teve o filho, Gabriela teve que buscar apoio psicológico para aprender a lidar com as mudanças. "Eu entrei em depressão. Eu não queria ter filho, mas assumi e tive. Eu não estava conseguindo colocar em ordem a minha vida. Eu tinha um ritmo e tive que entrar em outro. Foi muito difícil", contou Gabriela.
Apesar da maior liberdade entre pais e filhos e da divulgação de informações sobre sexo, doenças sexualmente transmissíveis e gravidez, os jovens ainda enfrentam dificuldades para falar sobre o assunto. "Acho que foi mais por falta de informação, principalmente dentro de casa. Eu comecei minha vida sexual muito cedo, foi meu primeiro namorado". Na época em que engravidou, tomava pílula que obteve num posto de saúde. Sem saber exatamente como usar o medicamento, ela disse que não tomava o comprimido diariamente.
Da sua própria experiência, a jovem tirou uma lição importante para seu futuro. "Acho que as mães que têm filhos adolescentes têm que parar e conversar com eles. O que faltou para mim foi um ‘empurrão’, me pegar e falar: ‘calma, não é assim!", ponderou.
Hoje, Gabriela é integrante da organização não-governamental Mulheres Jovens Trocando Idéias, em Belo Horizonte (MG). Ela acredita que se, há dois anos, tivesse tido acesso a um grupo como esse, que discute e troca idéias sobre assuntos ligados ao universo feminino, teria superado com mais facilidade a maternidade na adolescência.
A falta de serviço de saúde sexual e reprodutiva específico para os jovens é uma das causas para a gravidez precoce, na avaliação da coordenadora de Comunicação da Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, Mônica Maia. A rede é uma articulação política que reúne mais de 250 entidades feministas não-governamentais de todo o país.
"Esse fenômeno do aumento da taxa de natalidade entre adolescentes não tem uma explicação única. Ele ocorre por uma série de fatores", afirmou Mônica. Entre os fatores, ela destacou a falta de qualidade de vida das adolescentes, que não têm possilidades de estudo e trabalho. E ainda o valor dado à maternidade como um dos aspectos indispensáveis à realização e à felicidade das mulheres. "Se o ambiente doméstico é muito violento, muito repressor, a gravidez também pode ser uma estratégia para sair de casa", acrescentou.
Segundo Mônica, o atendimento dado hoje aos adolescentes é inadequado. Um adolescente que procura um posto de saúde para ter acesso a métodos contraceptivos, por exemplo, tem que participar de um grupo de planejamento familiar sendo que ele está numa fase de vida em que esta questão ainda nem está sendo pensada.
Na avaliação de Mônica Maia, o ideal seria criar um serviço que atenda às necessidades dos jovens. "Hoje, existe uma posição muito moralista porque, na medida em que não se reconhece a vivência sexual na adolescência, não é possível dar acesso a métodos e informações de qualidade para esses adolescentes", afirmou.
Mônica acredita que o apoio social e emocional às adolescentes que ficam grávidas é fundamental para que a maternidade não traga graves conseqüências. "A gravidez, em si, não é prejudicial à adolescência porque em termos orgânicos, fisiológicos a primeira menstruação marca a maturidade reprodutiva".
O que agrava a maternidade na adolescência, avalia Mônica, é o tipo de apoio familiar, a forma que o sistema de saúde conduz o pré-natal e a estrutura disponível como creche, a aceitação da mãe adolescente na escola. "É esse conjunto de respostas sociais e comunitárias que pode ocasionar problemas e mais dificuldade em lidar com essa maternidade", disse a coordenadora.