Núcleo de Pesquisas
Agência Brasil
Reunidos em Brasília, no último fim de semana, 2.300 representantes de empreendimentos da economia solidária e empresas de autogestão discutiram seus problemas e encaminharam carta, com as principais reivindicações do setor, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Veja, a seguir, a íntegra do documento:
Carta dos Empreendimentos da Economia Solidária ao Presidente da República:
"Companheiro Presidente,
Somos mulheres e homens que lutamos e trabalhamos na perspectiva de construirmos uma nova sociedade, baseada em novas práticas sociais e econômicas. Nossas referências são a solidariedade e a igualdade, afirmando a participação ativa e a transparência rumo a uma economia democrática e ao acesso ao fruto do nosso trabalho. Afirmamos, pela nossa prática cotidiana, que outra economia acontece.
Neste primeiro encontro nacional de empreendimentos da economia solidária, reunimos representantes de organizações do meio urbano e rural, dos setores de comercialização, de crédito, das trocas, de consumo, de produção agrícola, da agroindústria, da pesca, do vestuário (têxtil e confecção), do calçado, da mineração, da construção civil, manejo florestal sustentável, limpeza, higiene, beleza, saúde, fitoterápico, educação, produção cultural e prestação de serviços, entre outros. Temos a certeza de que somos uma expressiva parcela dos trabalhadores e trabalhadoras e que nosso movimento é a realidade de outra economia que não pretende amenizar as duras conseqüências do capitalismo, mas ser uma estratégia autônoma e emancipatória de desenvolvimento social e econômico.
Construímos alternativas para solucionar um conjunto de limites colocados aos empreendimentos, como acesso ao crédito e financiamento; uma legislação adequada a atividades produtivas autogestionarias; a formação continuada para a qualificação produtiva, de gestão e de afirmação de princípios e valores; fomento à comercialização com base na lógica solidária do comércio justo e do consumo ético. Essas reivindicações, assim como o acesso à terra e direito ao trabalho, são fundamentais para a afirmação e a consolidação desta nova economia. A valorização do trabalho humano para nós é princípio fundamental e não um meio ou instrumento em benefício de poucos ou a serviço da exploração.
Desenvolvemos, de forma ampla e diversificada, estratégias que sensibilizam e desafiam a sociedade para o compromisso de consolidar a economia, pois temos a certeza de que é com essa nova consciência que seremos capazes de incluir pelo trabalho os milhares de brasileiras e brasileiros que vivem marginalizados.
Assim, desafiamos o governo a dar prioridade às ações de afirmação da economia solidária através de políticas públicas que, ao destinarem recursos orçamentários consistentes, constituam instrumentos permanentes de apoio e fortalecimento da economia solidária, democratizando o acesso aos fundos constitucionais no Norte , Nordeste e Centro Oeste – FNO, FNE, FCO e Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT. Neste mesmo sentido, reivindicamos a democratização da gestão e dos recursos do sistema "S".
Afirmamos a nossa participação na elaboração e no controle social de políticas governamentais como meio de assegurar outra forma de desenvolvimento econômico-social, que vem se expressando na relação com os setores do governo que contribuíram para a realização deste encontro.
Para tanto, queremos que a política de crédito possa viabilizar cadeias produtivas dos empreendimentos solidários visando ao desenvolvimento sustentável dos territórios (local e regional). É necessário também criar condições de desenvolvimento de tecnologias adequadas objetivando agregação de valor aos produtos, melhorando as condições de trabalho, saúde e sustentabilidade ambiental.
Queremos uma legislação adequada a iniciativas de cooperação dos trabalhadores e trabalhadoras, estimulando-as e favorecendo o seu desenvolvimento.
1 - Políticas públicas que garantam aos trabalhadores de empresas pré-falimentares e em massas falidas o direito ao trabalho coletivo, transformando-as em empresas de autogestão.
2 – Legislação que diferencie as cooperativas tradicionais das organizações em economia solidária constituídas como empresas autogestionárias sob o regime de cooperativas, associações e outras formas que tenham como prática a não precarização do trabalho, a distribuição justa do resultado do trabalho, livre acesso às informações e democracia interna.
3 – Legislação tributária, trabalhista, financeira e de seguridade social que assegurem o desenvolvimento da economia solidária.
4 – Criação de mecanismos legais que possibilitem compras governamentais de produtos e serviços solidários e regionalizados, possibilitando maior distribuição de renda.
Estamos convencidos de que o desenvolvimento do país, com emancipação e inclusão social, que se realiza através da Economia Solidária, exige uma nação soberana. Defendemos que os compromissos sociais devam estar acima dos compromissos financeiros com os credores do Estado brasileiro.
Somos muitos e por isso queremos muito,
queremos outra economia, pois na nossa prática ela já acontece".