Luciana Vasconcelos
Repórter da Agência Brasil
Brasília – O Estatuto da Criança e do Adolescente foi instituído para substituir o chamado Código de Menores, criado em 1979. Diferente do Código, que era dirigido a menores de 18 anos em situações especiais, o Estatuto é destinado a todas as pessoas com menos de 18 anos de idade e está pautado nos princípios da Constituição Brasileira de 1988, e na Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança. Em seus 267 artigos, o estatuto revolucionou ao tratar crianças e adolescentes como cidadãos, com direitos pessoais e sociais garantidos. E passou a exigir dos municípios a implementação de ações que atendem os direitos básicos, como saúde e educação, dos jovens.
O ministro Nilmário Miranda, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, disse que muito já foi conquistado desde a criação do Estatuto, porém considera o posicionamento frente ao adolescente infrator a maior dificuldade de ser implantada. "Porque a gente vem de uma tradição repressiva. As pessoas acham que colocar na cadeia vai resolver", afirmou ontem na abertura do 1º Encontro Nacional de Adolescentes, em Brasília.
O Estatuto prevê que verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente deverá aplicar as seguintes medidas: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade ou internação em estabelecimento educacional.
Para Nilson Alves, diretor de projetos de cidadania e adolescência da Unicef, ao invés de se discutir aumento da maioridade penal ou aumentos das penas, é importante aplicar as medidas socioeducativas previstas no Estatuto. "Permite uma recuperação mais viável ao jovem infrator", ressaltou.
Um dos redatores do ECA, Edson Seda, disse que as regras estabelecidas no estatuto estão sendo aplicadas progressivamente e destacou a importância do cidadão compreender a necessidade de colocar em prática o documento. "Ao longo do século XXI, os brasileiros vão tomar consciência lendo as regras que criança não pode ser espancada, os pais devem proteger os filhos, as prefeituras e municípios devem ajudar os pais, que criança tem que freqüentar escolar", explicou.
O ECA conseguiu avançar em alguns setores, segundo Seda. Ele citou, por exemplo, o aumento de crianças nas escolas. Segundo Seda, antes da implantação do Estatuto 30% da crianças estavam fora das salas de aula e hoje são apenas 3%. De acordo com Nilson Alves da Unicef, o momento pede novas políticas, que garantam a qualidade do ensino. "Precisamos ter criança na escola aprendendo", destacou.
Um dos redatores do estatuto Edson Seda defende que para o estatuto ser mais efetivo é preciso que as burocracias, tanto a federal como as estaduais ou municipais repensem a sua forma de organizar os serviços para abrir espaço para organizações não-governamentais.
A Unicef considera o ECA uma das mais avançadas legislações sobre os direitos das crianças no mundo. Mas destaca que o estatuto só se tornará realidade com a superação das disparidades e a oferta de oportunidades iguais para cada um dos 61 milhões de meninas e meninos brasileiros. Dados do IBGE mostram a desigualdade no país:
– Crianças com menos de um ano, nascidas nas regiões Norte e Nordeste, têm quatro vezes mais chance de morrer do que aquelas nascidas em outros lugares;
– Crianças da zona rural têm oito vezes mais chance de não ter água limpa em casa do que aquelas que vivem em áreas urbanas;
– Meninos e meninas pobres têm 21 vezes mais chance de chegar analfabetos à adolescência;
– As chances de analfabetismo na adolescência entre indígenas são sete vezes maiores do que entre crianças brancas e os meninos menores de 16 anos são duas vezes mais vulneráveis ao trabalho infantil do que as meninas da mesma idade.