Brasília, 26/5/2004 (Agência Brasil - ABr) - A classificação de consumidores de energia elétrica de baixa renda, que hoje se dá pelo consumo e a renda familiar, divide o governo, a sociedade e as empresas do setor. Durante audiência pública realizada hoje na Comissão de Defesa do Consumidor, na Câmara dos Deputados, representas do Ministério de Minas e Energia, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), das concessionárias de energia, de consumidores de baixa renda e de entidades da defesa do consumidor foram unânimes em concordar que os critérios de enquadramento não respondem às reais necessidades dos consumidores de baixa renda.
O presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Luiz Carlos Guimarães, ressaltou que as concessionárias têm dificuldades em classificar quem efetivamente possui o direito aos descontos previstos para os consumidores de baixa renda – que pela legislação atual são os que consomem mensalmente até 80 kw/h, ou entre 80kw e 220kw e estão cadastrados em programas sociais do governo, entre outros critérios. "A maneira de cadastrar afeta a maneira de conceder o benefício. A gente não pode garantir que quem está recebendo é efetivamente pobre. Ou quem não está, que não é pobre. Essa questão não pode ser deixada para as concessionárias. É o governo quem deve cadastrar e solucionar", defendeu.
Pelas regras atuais, quanto menor o consumo de energia, maior é o desconto para os consumidores de baixa renda. Segundo dados do Ministério de Minas e Energia, existem hoje no Brasil 14 milhões de consumidores de energia enquadrados como de baixa renda. Em 2002, esse número era de 8 milhões.
O secretário de Energia do Ministério, Ronaldo Schuck, informou que em 31 de julho termina o prazo para o cadastramento de novos beneficiados. "É o prazo que as pessoas terão para comprovar que têm direito ao benefício", ressaltou.
O objetivo do governo, segundo o secretário, é garantir um cadastro único que corrija as atuais falhas do sistema.
O representante da Aneel, Gilberto Pimenta, fez um relato sobre as distorções encontradas hoje nos critérios de enquadramento dos consumidores de baixa renda. Ele deu um exemplo pessoal como prova das irregularidades. Morando em um flat em Brasília, ele disse ter sido considerado como de baixa renda por viver sozinho, não passar os finais de semana na capital e, além disso, pouco utilizar eletrodomésticos. "Eu sou um exemplo vivo disso. Tenho certeza que existem domicílios com renda superior a meio salário mínimo que recebem o benefício sem ter esse direito", relatou.
A presidente da União de Moradores, Veônica Kroel, disse que os consumidores mais pobres estão sendo os mais prejudicados. Ela apresentou à Comissão uma série de contas de luz pagas por moradores de baixa renda de São Paulo com valores muito acima dos previstos pela legislação. "Para nós, é a lei do cão. Nós não temos mais como pagar energia. Esse programa não chega a quem precisa", denunciou.
Para a representante da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, Flavia Lefreve, o problema está na classificação dos que consomem entre 80 kw/h e 220kw/h – que são obrigados a comprovar o enquadramento nos critérios de consumidores de baixa renda. "A lei coloca uma série de requisitos que não correspondem à realidade", disse.
Os participantes da audiência fizeram uma série de sugestões para modificar a atual legislação e garantir uma classificação justa aos efetivos consumidores de baixa renda. O representante da Organização Não-Governamental Ilumina, Paulo Eduardo de Grava, propôs, entre outras medidas, estabelecer o critério da moradia – pelo qual seja caracterizado como baixa renda quem viver em construções de até 90 m2, ou em localidades comprovadamente pobres, como favelas e cortiços. "O padrão de construção pode ser atribuído na cobrança do IPTU. Invertemos, assim, o ônus da prova para o padrão da construção", disse.
O secretário Ronaldo Schuck admitiu, porém, que todo critério enfrentará problemas ao ser implementado. "Ao Ministério, cabe cumprir a lei de forma mais justa. Estamos fazendo um grande esforço para garantir o acesso à energia com economicidade a todos os brasileiros, e para que pessoas não sejam injustamente descadastradas nesse processo", afirmou.