Políticas públicas não devem fechar os olhos para a homofobia, diz presidente de grupo homossexual

25/05/2004 - 16h24

Brasília, 25/5/2004 (Agência Brasil - ABr) - Discriminação e violência contra homossexuais se traduzem em diversas formas de supressão de direitos civis para gays, lésbicas, transgêneros e bissexuais. Para Welton Trindade, presidente do Estruturação, Grupo Homossexual de Brasília, a construção de um Brasil cidadão só acontece em momentos como este, em que as políticas públicas não fecham os olhos para questões como a homofobia. "O Programa Brasil sem Homofobia é um passo importante na luta pelo reconhecimento da cidadania dessa população", afirmou. Ele ressaltou que essa iniciativa não passa de uma dívida que o país tem com os homossexuais.

Entre os principais tipos de discriminação e violência que os homossexuais sofrem estão as piadas, humilhações públicas, isolamento social, ameaças, surras e, em muitos casos, a morte. O secretário executivo do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, Ivair Augusto Alves dos Santos, disse que uma das coisas que mais o assustou foi ouvir de um grupo de travestis, que muitos evitam andar de dia na rua para não serem vítimas de situações homofóbicas. "Eles sentem medo de serem agredidos, ou seja, se sentem cerceados do direito mais básico e simples, garantido pela Constituição Federal, que é o de ir e vir", explicou.

O secretário explicou ainda que o problema dos travestis é maior do que se imagina, pois muitos deles não tiveram oportunidade de freqüentar a escola, sendo a grande maioria analfabeta. "Hoje, uma criança com orientação homossexual sofre muito preconceito nas escolas brasileiras", afirmou. "É para evitar situações como essa que o Programa Brasil sem Homofobia está sendo lançado hoje pelo governo", acrescentou.

A afirmação de Ivair Santos é confirmada pela pesquisa Juventude e Sexualidade, realizada em 14 capitais do país, neste ano, pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – Unesco. De acordo com a pesquisa, cerca de 25% dos alunos afirmam que não gostariam de ter um colega de classe homossexual. O estudo revela ainda que as meninas são mais tolerantes que os meninos. Sobre a questão se a homossexualidade é uma doença ou não, os percentuais assustam. Cerca de 18% a 12% dos entrevistados responderam de forma afirmativa.

Para as meninas, entre seis tipos de violência, bater em homossexuais ocupa o terceiro lugar. Para os meninos, ocupa a sexta posição, perdendo para itens como atirar em alguém, usar drogas, roubar e andar armado. Quando a pesquisa é estendida aos pais desses mesmos alunos, cerca de 35,2% respondem que não gostariam que seus filhos fossem amigos de homossexuais. Os maiores níveis de tolerância estão entre os professores. No Distrito Federal, 6% dos professores não gostariam que seus alunos tivessem orientação homossexual e em Porto Alegre a marca é de 2% dos entrevistados.

A pesquisa revela aquilo que a Secretaria Especial de Direitos Humanos já sabia - o preconceito e a discriminação somente diminuirão por meio da informação e desmitificação do tema. Ivair Santos comemora a repercussão conseguida, antes mesmo do lançamento do programa. "Até grupos religiosos, que geralmente são contrários ao homossexualismo, estão nos procurando para firmarem parcerias na luta contra a discriminação e a violência contra gays, lésbicas e transgêneros e bissexuais", explicou.

A representante da Articulação Brasileira de Lésbicas e presidente da organização não governamental Movimento DELAS, Yone Lindgren, afirma que ser lésbica no país é uma árdua tarefa e traz dois preconceitos: um de ser mulher e outro de ser homossexual. Para ela, o esforço que está sendo feito pelo governo nessa área é bastante positivo. "Se alguém está decepcionado com o governo em alguma outra instância, há de reconhecer o quanto ele busca para uma sociedade igualitária", afirmou. Lindgren ressalta que a tarefa exige muita ousadia. "O governo está sendo ousado sim, dando a cara à tapa e vai apanhar muito ainda", alertou.

A cabeleireira Camila, que há muito tempo não responde pelo nome de Robson José de Oliveira Melo, participou de reuniões para elaboração do Programa Brasil sem Homofobia. Para ela, a vida dos travestis é marcada pela perseguição, o perigo e a marginalização provocada pela própria sociedade. Camila acredita ser uma exceção, pois sempre contou com o apoio de sua família, diferentemente da maioria de suas amigas. "As pessoas precisam saber que os gays, os travestis, são pessoas normais, capazes de fazer coisas belas", explicou. Camila lembrou que seria ótimo as pessoas enxergarem os "gays" como uma forma de evolução para o bem e não para o mal. "Nossa vida é alegria, tanto é que nossos símbolos são o arco-íris e a rosa branca da paz", ensinou.