Especial - Na periferia de Fortaleza, banco da comunidade emite a própria moeda

11/05/2004 - 8h39

Olga Bardawil
Repórter da Agência Brasil

Fortaleza - O Conjunto Palmeiras surgiu há cerca de 30 anos com um destino certo: tornar-se mais uma grande favela removida da zona nobre para a periferia de uma grande cidade – no caso, a capital do Ceará. Mas um grupo de moradores decidiu mudar esse destino. Marinete Brito da Silva, secretaria executiva da Associação de Moradores do Conjunto Palmeiras, emociona-se ao falar nesse tempo em que "as pessoas tinham vergonha" de dizer que moravam ali.

Para inverter essa situação, porém, um longo caminho foi percorrido. Em 1991, com o apoio da GTZ (Agência de Cooperação Técnica alemã), por meio do programa Pró-renda, foi realizado o seminário "Habitando o Inabitável". Essa parceria com os alemães, que durou até 1996, foi fundamental, segundo Marinete, para a associação se estruturar e desenvolver seus próprios projetos.

Outras parcerias se formaram ao longo do caminho, com outras instituições como Sebrae. Hoje eles podem se orgulhar de várias conquistas, algumas inacreditáveis como o Banco Palma, fundado em 1998.

A assistente social Sandra Magalhães, coordenadora do Banco Palma, ri ao se lembrar do espanto do próprio Banco Central, que mandou um funcionário ver de perto o que estava acontecendo. "A gente colocou o nome de banco porque era uma forma de prestigio. Afinal, aqui ninguém nunca ia ter uma conta num banco comercial. Então por que não ter nosso próprio banco?"

O Banco Palma começou com um capital de R$ 2 mil e hoje tem R$ 30 mil em carteira. Seus clientes são todos os sócios da Associação de Moradores do Conjunto Palmeiras. Ninguém precisa oferecer garantia para obter um empréstimo, que deve ser para investimento em alguma atividade rentável. "Pode ser de R$ 20, para comprar uma ferramenta, ou de R$ 100, para comprar mercadoria de um pequeno comércio ou uma máquina", explica Sandra. A garantia do pagamento vem da própria condição de morador local. Afinal, são os amigos e vizinhos que fazem a "avaliação".

Cartão e treinamento

Como um banco de verdade, o Banco Palma também tem o seu Palmacard, que pode ser usado até um limite pré-determinado, em estabelecimentos comerciais do bairro. O objetivo é incentivar o consumo local e assim reter na comunidade os recursos que ela própria gera. Como se não bastasse a ousadia, o Banco Palma emite uma espécie de moeda, o Palma, que vale um Real. As "notas" lembram tíquetes de alimentação e foram imprensas por uma organização não-governamental holandesa, a Stroholm, num total equivalente a R$ 30 mil.

Movida pelo Banco Palma, há uma efervescência empreendedora inteiramente voltada para a geração de emprego e renda. O centro de treinamento, Palm-Tec, está promovendo um curso de capacitação de jovens para a área de comunicação. Um grupo de costureiras aprende a confeccionar roupas em jeans e o primeiro lote da produção já tem destino certo: uma ong italiana com sede em Roma. E a incubadora de empresas já abriga a pequena fábrica de produtos de limpeza, a Palmlimpe, cujos donos são seis jovens da comunidade.

Por tudo isso, hoje a Associação ostenta com orgulho o slogan: "Deus fez o mundo e nós construímos o Conjunto Palmeira".