Especial Ensino 2: No nível médio, modalidades separadas facilitaram obtenção de recursos

04/05/2004 - 8h56

Marina Domingos
Repórter da Agência Brasil

Brasília - O Decreto 2.208, de 1997, deixou às escolas a opção pelo currículo do ensino médio ou pelo de ensino profissional. Para receber recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), segundo Francisco Dana, coordenador geral de Políticas da Educação Profissional e Tecnológica da Setec/MEC, as escolas tiveram de escolher apenas uma das modalidades de ensino. Por causa do alto custo de manutenção das escolas, com a contratação de professores qualificados e conservação de laboratórios, a maioria se viu obrigada a oferecer apenas o ensino médio para não fechar as portas. O estado do Rio Grande do Sul, por exemplo, optou por ficar apenas com o ensino médio e começou a oferecer curso superior de tecnologia.

"Ou a instituição adotava a nova orientação, ou não recebia os recursos. Na verdade o aluno não era impedido de fazer os dois cursos, mas não acontecia na prática, porque causava dificuldades de coordenar os horários e os custos, por exemplo. Como ele iria administrar dois cursos no mesmo dia?", denuncia Dana.

Com isso, o que se viu foi um crescimento na oferta de cursos superiores de tecnologia. Escolas, alunos e governo passaram a investir nos cursos pré-vestibulares e a dar preferência à busca por uma vaga no ensino superior. O professor ressalta que esse processo dificultou ainda mais a chegada do aluno ao mercado de trabalho, porque exige mais tempo de formação. "Antes, isto ocorria logo que o aluno saía do segundo grau, o que também causava evasão escolar. Mas agora houve um direcionamento para o vestibular e ele tem que fazer o curso superior", ressalta.

Ofício

A idéia de um currículo enriquecido, voltado para a formação profissional do jovem, ainda no segundo grau, surgiu no início do século XX, com as primeiras escolas profissionalizantes do país. Eram centros de excelência, onde o aluno cursava as disciplinas normais do ensino médio e ainda aprendia um ofício, naquela época focado especialmente na indústria paulista que começava a surgir, movida pela Primeira Guerra Mundial.

Até então, prevalecia a formação do aluno em técnico de nível médio, com até quatro anos de curso, no qual se mesclavam o ensino médio e o profissional. O currículo era integrado e a formação era nas grandes áreas de atuação: Humanas, Exatas e Saúde. Quem já possuía o ensino médio poderia voltar à escola e se profissionalizar mais tarde.

O enfraquecimento dos cursos profissionalizantes de nível técnico dentro das instituições começou a ser notado a partir dos anos 70, com o surgimento das chamadas profissões tecnológicas, ligadas ao avanço da tecnologia de ponta, principalmente no Estados Unidos, Inglaterra e França. A idéia era enfatizar a formação do tecnólogo, como eram chamados os profissionais formados.

"Era uma tendência trazida de fora, com a pressão neoliberal, pois surgiu uma demanda a partir dos anos 70. O aluno cursava o ensino médio normal e depois partia para o curso superior em tecnologia na área desejada", explica o coordenador geral de Políticas da Educação Profissional e Tecnológica da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação, professor Fran-cisco Dana.

A educação tecnológica, que era de nível médio, passa a ser de nível superior, com vertentes em pós-graduação, inclusive. A universidade tradicional não conseguia dar respostas profissionais rápidas e, a partir da aceleração tecnológica, a própria estrutura universitária dificultava a absorção de tendências para habilitação de novos cursos. "Esse cenário possibilitou o crescimento rápido da educação tecnológica, tanto no ensino médio quanto ensino superior. Na Inglaterra, houve até pós-graduação voltada mais para a parte prática. O ensino profissional e tecnológico vinha para resolver o problema real. Teses abordariam temas reais da área de engenharia, por exemplo, como construir pontes, estradas", relata o professor.

Tradição

Mas apesar da pressão, acrescenta Francisco Dana, as tradicionais escolas técnicas se mantiveram. E para atender a demanda do mercado de trabalho surgiram, ao lado delas, os Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefet) e as Escolas Agrotécnicas Federais (EAF). Em 1978, os Cefets começaram a atuar em todos os níveis de ensino e em todos os setores da economia, para formar profissionais visando imediatamente o mercado de trabalho. "O Cefet veio para dar suporte maior aos alunos, um conhecimento além da qualificação simples", lembra.

Outra vertente da educação profissional que tomou força, na época, foi a criação das escolas do Serviço Social da Indústria (Sesi), Serviço Social do Comércio (Sesc) e Serviço Nacional de Aprendizagem da Indústria (Senai), que inicialmente ofereciam apenas cursos de qualificação profissional. Em função das transformações tecnológicas, a qualificação teve de dar lugar à profissionalização do aluno e, hoje, o Sistema S já forma técnicos de nível médio e superior. "Chegaram próximo ao nicho dos Cefets, que priorizam a formação ampla do profissional", comenta.