Eduardo Mamcasz
Repórter da Agência Brasil
Tucuruí (PA) - A Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará, que tem investimentos de R$ 1,08 bilhão previstos para este ano, instala na manhã desta segunda-feira (03) a peça principal da 17ª turbina, de um total de 23, chamada rotor e que pesa 950 toneladas. A nova turbina tem capacidade de gerar energia para uma cidade de um milhão de habitantes.
A instalação da peça, que se encaixa na roda da turbina, e que levou oito meses para ser concluída nesta segunda fase, faz parte das comemorações dos 20 anos de funcionamento da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, a maior do Brasil, e que está interligada ao sistema nacional, com destaque para o Nordeste. Os trabalhos ocuparam mais de dois mil operários.
O técnico da Eltronorte encarregado da montagem das turbinas, Massilon Gomes Filho, destaca que nesta fase das obras de conclusão, que vai até o final de 2006, todas as peças são fabricadas no Brasil, que hoje, segundo ele, tem conhecimento suficiente inclusive para exportar produtos necessários para a construção e operação de uma usina hidrelétrica de grande porte.
"Estamos com 14 turbinas funcionando e mais duas auxiliares. Em pouco tempo entra (em funcionamento) a décima sétima", disse. Ele explica ainda que todo um trabalho coordenado está em andamento com relação às 23 turbinas que a Usina terá no final. "A primeira fase das obras civis com relação à turbina de número 22 já estão começando, enquanto a roda e o eixo que recebem o rotor, na turbina 18, estão adiantadas".
Mulheres
São quase dois mil operários de diversas empresas envolvidos nesta fase da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, com destaque para a presença de diversas mulheres, inclusive em trabalhos que, há 20 anos, eram considerados "tipicamente masculinos". Uma delas, Gilza Carolina, mãe de uma filha, e que tinha seis anos de idade quando a Usina foi inaugurada, foi considerada, inclusive pelos colegas, como a melhor soldadora especializada da obra.
"O pessoal entendeu que a mulher é mais atenciosa em certos tipos de serviço, presta mais atenção, se concentra melhor, e por isso eu tive meus serviços de solda sempre aprovados", diz Gilza. Ela nasceu na própria cidade de Tucuruí, onde fez os cursos necessários. E garante que na hora em que a Usina estiver completa, ela está pronta para seguir em frente para a próxima obra, "em qualquer parte do Brasil e até do mundo".
A solda que ela faz no rotor de 950 toneladas, tem que ser de altíssima definição, sem o mínimo erro.
Outra mulher que trabalha na segunda fase das obras da Usina é a encarregada da parte de bobinagem, técnica em eletricidade Luzia Lima Souza, 31 anos, três filhos. Apesar de ser "pai, mãe e avó’ , como se define, ela disse que na hora da concentração na obra "preciso esquecer de qualquer problema que eu possa ter em casa, mesmo que esteja com vontade de chorar ou muito preocupada, por exemplo, quando minha filha de 15 anos ficou grávida".
Lago
Nestes 20 anos de existência da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, que continua sendo a maior obra de infra-estrutura em andamento no Brasil, o que mudou junto foi a situação do Lago de Tucuruí, que represa as águas do Rio Tocantins numa área de quase 3 mil quilômetros quadrados. Desse lago, a cada mês, hoje saem 500 toneladas de peixe, dando trabalho para quase 10 mil pescadores.
O técnico encarregado das questões de Meio Ambiente, Takachi Hatanaka, disse que a capacidade de pescado, no entanto, agora chegou no limite e precisa ser controlada.
Outro assunto relativo ao lago e ao meio ambiente é quanto às árvores, muitas delas de lei, que foram submersas na primeira fase, porque a empresa contratada não conseguiu retirar a tempo. Takachi explica que, no começo, quando ainda havia folhas, foi preciso um trabalho permanente de limpeza mas que com o tempo aconteceu inclusive o que não se esperava. "Estamos fazendo uma licitação para retirada de madeira do lago porque, com os anos, submersa, no lugar de apodrecer, ela até melhorou de qualidade".
Quando o Lago de Tucuruí precisou ser formado, foi preciso retirar muitas famílias de colonos e inclusive toda a tribo dos Pakarnã, que na época estavam num processo acelerado de perda da identidade cultural, até pela proximidade da Rodovia Transamazônica e da reforma agrária.
Há 17 anos existe o Projeto Pakarnã, um convênio da Eletronorte com a Fundação Nacional do Índio, com uma reserva demarcada, homologada e registrada em cartório. Os próprios indígenas administram a Reserva e muita da cultura deles já foi recuperada no dia a dia.
"Tudo bem que, ao lado da cultura recuperada, os indígenas Pakarnã agora têm alguns equipamentos modernos, como as placas de energia solar e até aprenderam a fazer rappel, com instrutores trazidos de São Paulo", diz Takachi Hatanaka.
Segundo cacique Uaretê Pakaranã, com o aprendizado do rappel – técnica de escalar rochas e prédios, mas que pode ser usada para subir rápido em árvores muito altas -, agora está muito melhor porque a tribo pode, por exemplo, colher e vender sementes de mogno e de castanheira sem precisar derrubar.
Eclusa
Em compasso de espera, com a obra praticamente parada devido aos altos custos, está a questão da construção da eclusa que vai permitir a continuação do uso navegável do Rio Tocantins até chegar a Belém, a 400 quilômetros de distância. Com isso, mais a ligação com o Rio Araguaia, poderá haver a sonhada Hidrovia Araguaia-Tocantins, ligando o Distrito Federal, Goiás, Tocantins e Pará até chegar ao Oceano Atlântico. Em Tucuruí, com as eclusas, os barcos poderão "subir ou descer" uma diferença de 72 metros, em duas etapas e mais um canal de passagem.
A questão dos desalojados por causa do represamento das águas para a barragem e usina de Tucuruí também voltou a tona com a formação de várias Associações dos Atingidos pela Barragem e há dois meses existe um acampamento instalado em frente à sede da Eletronorte, em Tucuruí. Manoel Alexandre Sampaio, presidente da Associação de Jacundá, um dos 11 municípios existentes em volta do Lago, cuja população vem aumentando a cada dia, hoje em torno dos 300 mil habitantes, garante que tem direitos.
"Na época muita gente assinou documentos em branco, ou porque foi enganada com as promessas ou então porque os militares pegavam a gente na marra e levava para outro lugar", conta Miguelinho, como o líder é conhecido. A administração da Eletronorte explica oficialmente que o assunto está sendo tratado em termos jurídicos e que é preciso fazer um levantamento, até porque teve gente que recebeu mais de uma vez e há outros que podem não ter recebido nada de indenização.
A função social da Eletronorte na região em volta do Lago de Tucuruí também é destacada, uma vez que a empresa paga "royalttie" pelo uso das terras para fazer o Lago deTucuruí e administra vários projetos de desenvolvimento da comunidade, como comercialização do pescado, pesquisa de sementes nativas, apoio à comunidade indígena entre outros projetos.