Especial 3 - ''Abril vermelho'' só acaba em junho, afirmam movimentos sociais

30/04/2004 - 14h54

Deigma Turazi
Da redação da Agência Brasil

Brasília - A estratégia do "Abril Vermelho", adotada pelos movimentos sociais que apoiam e participam das manifestações de pressão para agilizar o processo de reforma agrária, será prolongada por mais dois meses e recomeçará após as eleições de 3 de outubro. A informação é do secretário-executivo do Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, Gilberto Portes de Oliveira.

Para maio estão previstas duas grandes manifestações: a Marcha dos Trabalhadores do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), no dia 12, e o Grito da Terra Brasil, até o dia 17. Na primeira, cerca de 500 pessoas caminharão de Goiânia a Brasília (200 quilômetros) com o objetivo de chamar a atenção do governo e da sociedade para o problema das centenas de famílias que perderam casas e terras em conseqüência da construção de hidrelétricas. A marcha também alertará para o risco representado pelas novas usinas previstas, cuja construção desalojará aproximadamente 10 milhões de cidadãos.

E a versão 2004 do Grito da Terra Brasil, organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) – uma das 43 entidades que integram o Fórum –, pretende reunir em Brasília mais de mil pessoas. Elas reivindicam uma negociação política de concessão de crédito para a agricultura familiar, além de recursos subsidiados para mulheres e jovens do campo implementarem pequenos negócios ou prosseguirem os estudos.

Compromisso

Em junho, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) pretende voltar às ruas para lembrar ao governo os compromissos assumidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os que estão contidos no II Plano Nacional de Reforma Agrária. "O objetivo será garantir as conquistas obtidas até hoje pelos movimentos sociais. Não vamos dar trégua e permaneceremos mobilizados", diz Gilberto Portes de Oliveira.

Entre as conquistas ele relaciona, além da elaboração do plano, a garantia de liberação, neste ano, de R$ 1,7 bilhão para implementação da reforma agrária e para o assentamento de 115 mil famílias até dezembro. Outros acordos feitos com o governo tratam da renegociação das dívidas dos assentados; da compra, pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), do excedente da produção gerada nos assentamentos, a ser destinada ao Fome Zero; do repasse de recursos para alfabetização de mais de 100 mil trabalhadores rurais adultos, programa desenvolvido em parceria entre a Contag, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o MST, o Incra e os ministérios do Desenvolvimento Agrário e da Educação.

Os movimentos sociais coordenados pelo Fórum também querem a garantia de que o governo se emprenhará para aprovar, no Senado, o projeto de lei que federaliza os crimes contra os direitos humanos, já aprovado na Câmara dos Deputados. "Será uma vitória não só dos sem-terra, mas de todos os cidadãos", disse Gilberto Portes, em referência ao massacre de Eldorado dos Carajás, onde policiais militares do Pará cercaram, no dia 17 de abril de 1996, um grupo de 1.500 sem-terra que estavam acampados na rodovia PA-150. No confronto, 19 trabalhadores rurais morreram.

O massacre, segundo ele, fez recrudescer a ação do MST em todo o território nacional. Na opinião de Gilberto Portes de Oliveira, o presidente Lula possui "perfil democrático de mudanças" e só conseguirá avançar, inclusive no combate à violência no campo, se os movimentos sociais mantiverem a pressão em manifestações nas ruas do país. Estes movimentos aglutinam 4,8 milhões de famílias sem-terra contabilizadas pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e formam a base de apoio do fórum.

Apoio

O secretário-executivo acrescenta que as manifestações também têm caráter de apoio ao presidente, no sentido de ajudá-lo efetivamente a fazer a reforma agrária. "Nós sabemos que a maior arma dos camponeses não são os fuzis e as espingardas que os latifundiários usam contra os trabalhadores. A nossa arma principal é a organização, é o número de pessoas que arregimentamos para a luta pela terra. Quem usa armas são os latifundiários, para proteger o que não é deles", diz Gilberto Portes de Oliveira.

O espírito dos movimentos sociais, acrescenta, "é fortalecer Lula, um aliado histórico da reforma agrária". O Abril Vermelho, segundo ele, está "casado" com o momento político atual, com o atual governo. "A decisão política do Fórum sempre foi e sempre será de apoio à luta para fazer a reforma agrária", afirma. Em contrapartida, revela preocupação de que pressões políticas afetem o presidente Lula e seu partido, o PT. "O Lula está indo para a direita e queremos puxá-lo para a esquerda. Só com muita gente na rua conseguiremos fazer com que o PT, o presidente e os ministros do PT não se desviem do caminho."

Sobre a ameaça do Maio Verde, Gilberto Portes de Oliveira adverte que o Fórum e seus signatários denunciarão à Justiça os fazendeiros que reagirem com truculência na repressão ao MST. Mas reconhecem o direito do protesto: "Eles têm direito de fazer a pressão deles, têm o direito de se manifestar, desde que não usem violência contra os nossos trabalhadores. Estamos mobilizados não para enfrentá-los, mas para ajudar o governo Lula a fazer a reforma agrária", reafirmou.