Curitiba, 22/3/2004 (Agência Brasil - ABr) - São quase quatro horas de espetáculo, divididas em três atos com intervalos de 10 minutos para que o público possa ir ao banheiro, beber água e esticar as pernas. Assim é a apresentação da peça "O que diz Molero", do diretor Aderbal Freire Filho, que pode ser assistida no Festival de Teatro de Curitiba.
Aderbal é um dos nomes mais conhecidos do teatro brasileiro. Entre seus últimos trabalhos, dirigiu Andréa Beltrão em "A Prova", e Marília Gabriela e Reinaldo Gianechini em "A peça sobre o bebê". Em Molero, o diretor optou por colocar no palco o texto integral do livro do escritor português Diniz Machado. A única mudança feita foi a tradução de algumas palavras do português de Portugal para a língua falada no Brasil.
O drama virou comédia e para quem reclama que o espetáculo é muito longo, Freire Filho diz que "o espetáculo é curtíssimo porque, nesse tempo, você não vai conseguir ler o livro inteiro". Se para uns é cansativo, para outros não. "Tem muita informação, tem gente que volta para ver outras vezes", garante a atriz Raquel Iantas.
A produção chegou a pensar em fazer com que o ingresso fosse válido para o dia seguinte. Assim, as pessoas com problemas na coluna, por exemplo, que não pudessem assistir todo o espetáculo em um único dia, poderiam voltar no dia seguinte para terminar a sessão. Mas o projeto foi abandonado por ser, na prática, inviável. Outra hipótese também levantada era a de fazer uma versão editada, uma vez por semana, com menor tempo de duração.
Não é só o tempo de duração que é grande. Em Molero, todos os números são exagerados. O cenário é composto por mais de 100 gavetas, os atores trocam de roupa mais de 300 vezes e usam mais 450 adereços. "Nem que seja uma peruca, um óculos ou um bigode, cada personagem tem sua caracterização", explica o diretor.
"O que diz Molero" conta a história de dois investigadores que analisam o dossiê escrito por Molero, no qual descreve sua vida. O documento faz um panorama de sua infância, juventude, viagens e das pessoas que fizeram parte desse caminho. É aí que mais de 200 personagens entram em cena. Todos interpretados por apenas seis atores da extinta Companhia Centro de Demolição e Construção do Espetáculo (RJ) - Chico Diaz, Orã Figueiredo, Augusto Madeira, Claudio Mendes, Gillray Coutinho e Raquel Iantas.
Chico Dias pode ser visto em papéis bem diferente dos que costuma fazer na televisão. Ao contrário do vilão ou do cangaceiro, na peça, Chico interpreta Molero em várias idades e pode ser encontrado debaixo de uma mesa, com os olhos arregalados e as mãos enroladas na blusa, na pele de um garoto com medo.
Para o ator Orã Figueiredo, Molero "é um espetáculo que tem a cara do Festival porque vai na contramão dos comerciais. É para a platéia que quer ver coisas diferentes", afirma. Além de longo, com exceção de Chico, traz atores que não são conhecidos do público pela televisão. "As pessoas ficam admiradas de ver que a qualidade do ator não está ligada a ele estar na TV. Geralmente é o contrário", conta Freire Filho.
O espetáculo teve três indicações ao Prêmio Shell (RJ) deste ano e concorre nas categorias de melhor cenário, ator (Ora Figueiredo) e diretor.