Rosamélia de Abreu
Repórter da Agência Brasil
Brasília - A constatação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de que mais de meio milhão de crianças e adolescentes brasileiros estão envolvidos com trabalho doméstico, mobiliza governo, ongs e a OIT. Mas combater o trabalho doméstico é uma tarefa difícil porque o problema ocorre dentro das casas e este tipo de exploração acaba ficando escondido das autoridades. No ano passado, o Governo Federal conseguiu retirar do trabalho 240 mil crianças, mas somente 13 mil eram trabalhadores domésticos. De acordo com a Secretária Nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Márcia Lopes, o maior problema das autoridades é identificar os locais onde a mão-de-obra infantil é utilizada.
"O trabalho infantil doméstico é oculto e difícil de verificação. É preciso que a sociedade denuncie a ocorrência dessa prática para que possamos melhorar e aperfeiçoar a estratégia do governo para coibir o uso de crianças no trabalho", enfatiza a secretária. Para Márcia Lopes, somente com o envolvimento de toda a sociedade será possível combater o trabalho infantil. "O Brasil tem realidades muito diversificadas e apenas conhecendo cada realidade poderemos transformar esse País", lembra.
A legislação brasileira autoriza o trabalho doméstico apenas para jovens acima de 16 anos. As denúncias de contratação de mão-de-obra infantil podem ser feitas às Varas de Infância, aos Conselhos Tutelares e às Delegacias Regionais do Trabalho dos estados.
Segundo Márcia Lopes, o Governo Federal vai gastar neste ano 500 milhões de reais para combater o trabalho infantil. O programa de Erradicação do Trabalho Infantil atende 810 mil 792 crianças, das quais 495.982 nas áreas rurais e 314.810 nas áreas urbanas. A previsão é que mais 90 mil crianças ingressem no programa este ano.
A Organização Internacional do Trabalho desenvolve projetos em várias capitais do País para acabar com o trabalho infantil doméstico. De acordo com o Coordenador do Projeto de Enfrentamento do Trabalho Doméstico da OIT, Renato Mendes, estão sendo desenvolvidos projetos em Belo Horizonte, Salvador, Recife e Belém e ainda neste ano será ampliado o atendimento para Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraíba e Maranhão. Segundo Renato Mendes, a OIT atua nas cidades onde faz parcerias para combater o trabalho infantil doméstico.
Na periferia de Belo Horizonte, Tatiane Costa Cordeiro, 11 anos, começou a trabalhar cedo, olhando a filha de uma vizinha para ajudar no sustento da família. Começou a trabalhar aos 8 anos para ganhar 50 reais por mês. Tatiane acordava e saía nas primeiras horas da manhã para o trabalho. A rotina era trocar fralda , dar banho, fazer mamadeira e ter sob sua responsabilidade uma criança. Ela conta que precisou arrumar um trabalho porque sua mãe estava desempregada. "Como a vizinha necessitava de alguém que ficasse com sua filha quando ia para o serviço, eu me candidatei. Mas nunca deixei de fazer meus deveres da escola, sempre fui boa aluna", conta a menina.
Outra criança que precisou trabalhar muito cedo é Eliete Cristina de Souza, 15 anos. A vida dela nem sempre foi fácil. Eliete cuidava da filha de uma vizinha que saía todos os dias para procurar emprego. Como a mulher não tinha renda fixa, pagava somente o que podia. "Eu ganhava dois reais por dia, mas algumas vezes recebia menos ou nada porque a minha vizinha estava desempregada e não tinha dinheiro", conta a adolescente.
Tatiane e Eliete foram retiradas do trabalho doméstico por uma organização não governamental chamada Circo de Todo Mundo, que atua em Belo Horizonte com o apoio da Organização Internacional do Trabalho e empresários. A ONG atende 400 crianças e adolescentes, entre 07 e 21 anos. Além de receber uma bolsa de complementação de renda familiar de cem reais, as crianças desenvolvem atividades fora do horário da escola como oficinas de teatro, equilibrismo, malabarismo, acrobacia de solo e aérea e aulas de reforço escolar.