Americanos pedem ajuda para mobilizar politicamente a sociedade dos EUA

18/01/2004 - 15h46

Verena Glass
Repórter da Agência Brasil

Mumbai, Índia - "Estamos na barriga do monstro e cabe a nós mobilizar a sociedade americana contra os desmando do nosso governo." Essa afirmação foi feita pelo grupo de organizações americanas presentes ao Fórum Social Mundial (FSM) num seminário sobre a luta pela paz dos movimentos sociais do país. Segundo a avaliação geral, após os atentados de 11 de setembro e da reação violenta do governo no sentido de criminalizar minorias, violar direitos fundamentais e iniciar a campanha militar contra o Afeganistão e o Iraque, a sociedade civil americana, até então majoritariamente ignorante dos efeitos da política externa do Estados Unidos, começou a questionar as ações do governo tanto no próprio pais quanto no exterior.

Um dos movimentos mais fortes nos EUA hoje é a campanha nacional pela paz, que conseguiu mobilizar, de forma inusitada, um número surpreendente de jovens e ativistas em 15 de fevereiro do ano passado, definido no FSM de 2003 como dia internacional de luta contra a guerra no Iraque. Segundo Jessica Marchal, uma das coordenadoras do movimento de paz, o trabalho de mobilização vem se concentrando principalmente nas escolas e universidades. "Estamos conseguindo conscientizar um número cada vez maior de estudantes, unindo grupos de jovens homossexuais, ambientalistas, trabalhadores, socialistas, algo nunca visto antes. Mas a falta de cultura política de organização ainda é um grande obstáculo para o nosso trabalho. Quando, apesar dos nossos protestos, os EUA atacaram o Iraque, o movimento desabou desanimado", lamenta Jessica.

Nhoki Nehu, da organização "50 Years is Enough" -contra o pagamento da dívida externa dos países em desenvolvimento - vai mais longe. "Precisamos que nos ensinem a nos organizar e que nos apóiem em nossas lutas, já que nós ativistas somos violentamente reprimidos em nosso país. Os americanos precisam de solidariedade internacional."

O recente despertar de uma consciência civil nos EUA se deve muito à perda de confiança do povo americano no presidente G.W. Bush e a impactos sentidos muito perto, na própria pele, avaliaram os ativistas. A morte de soldados no Iraque, por exemplo, levou ao surgimento de um novo movimento antiguerra liderado por pais e parentes das vítimas, assim como o corte dos gastos sociais, vitimados pelo inimaginável orçamento bélico de mais de 5 mil bilhões de dólares, está levando a população a protestar. O grande problema em se manifestar contra as políticas do governo, diz Jason Erb, da organização Americana Friends Service Committee, é que o contra-ataque vem em forma de criminalização e acusação de anti-americanismo.

Essa relativa "comoção" da sociedade civil, no entanto, não deve impactar as próximas eleições, avalia Erb. Segundo ele, são poucos os movimentos que têm uma relação direta com algum partido, e não existe vontade de intervir diretamente no processo macropolítico do país. "Os EUA cultivam há muito o centrismo como caminho, e tudo que cai à esquerda ou à direita é visto como extremista. O problema é que as forças conservadoras empurraram o centro para a direita de forma gradativa, e esta direita está institucionalizada hoje." Mesmo assim, Erb acha que as mudanças propostas pelos movimentos sociais devem seguir o mesmo trajeto gradativo de volta para um "centro equilibrado", não havendo muito espaço para radicalismos revolucionários e abruptos.