Por Marwaan Macan-Markar
Repórter da IPS/Envolverde
Bangcoc – Um grupo de 30 operários tailandeses estará representado no Fórum Social Mundial para compartilhar com os participantes do evento uma experiência única em seu país. Há um ano, homens e mulheres ex-funcionários de uma tradicional fábrica têxtil de Bangcoc se uniram determinados a construírem melhores condições de trabalho. Eles ficaram desempregados depois que indústria onde prestavam serviços declarou falência. A solução foi se juntar em torno de um projeto para colocar em marcha a criação de uma fábrica coletiva. Projeto realizado.
Eles criaram a marca "vinchas", que em tailandês significa "retorno da dignidade". Diariamente, homens e mulheres compartilham da mesma carga horária e do mesmo salário para produzir centenas de camisetas que levam ao consumidor a mensagem que os fizeram se reunir. A fábrica ainda é pequena, mas diferentemente de outras indústrias tailandesas, ali se respeita a dignidade dos trabalhadores. O local contrasta com os lúgubres galpões que proliferam na zona industrial da periferia de Bangcoc, onde os trabalhadores vivem em regime de semi-escravidão.
Kanchan Wongpan e Sunee Narmso, duas jovens nascidas no nordeste da Tailândia, a região mais pobre do país, trabalham como costureiras. "Aqui é muito diferente de outras fábricas onde trabalhei antes. Não sofremos exploração, nem abusos, por isso este lugar é único", afirma Sunee.
A fábrica "pertence completamente aos trabalhadores e estes podem expressar suas opiniões e se envolver nas decisões da empresa", explica Kanchan. Diferentemente das outras 2.641 fábricas da Tailândia, os integrantes do Grupo Solidariedade, como foram batizados, não têm de usar uniforme, podem ouvir música, trabalham em ambiente arejado com as paredes enfeitadas por cartazes que celebram os direitos trabalhistas. "Demonstremos aos capitalistas que a solidariedade mundial dos trabalhadores é real", diz uma das mensagens.
Gerenciamento coletivo
A fábrica foi criada em março de 2003, depois de um conflito de três meses entre a maioria dos membros do Grupo Solidariedade, entre eles Kanchan e Sunee, e os proprietários da fábrica de roupas para os quais trabalharam até o final de 2002. Essa fábrica havia quebrado por má administração e mais de 800 empregados ficaram na rua sem aviso nem promessa de compensação.
Posteriormente, os trabalhadores se uniram para criar sua própria fábrica. Para isso, precisaram de créditos de diferentes fontes, entre elas o Ministério do Trabalho e amigos pessoais. Alguns equipamentos, inclusive máquinas de costura, são emprestados. "Vamos demorar cerca de dois anos para pagar os empréstimos, e então a fábrica será realmente nossa. Estamos tentando aumentar nossa base de clientes. Oitenta por cento da produção fazemos como subcontratistas", explicou Manop Kaewphaka, encarregado da comercialização.
Todos os membros do Grupo Solidariedade ganham o mesmo salário de 4,5 mil bahts mensais (cerca de US$ 110) e trabalham a mesma quantidade de horas, seis dias por semana. "Aqui não temos gerente, mas três pessoas foram encarregadas do controle de qualidade. As decisões são tomadas em reuniões regulares", acrescentou Manop. "Este empreendimento único demonstra ao setor empresarial que os trabalhadores são capazes de manejar suas próprias fábricas de maneira satisfatória", afirmou a ativista dos direitos trabalhistas Junya Yimprasert, fundadora da Campanha Tailandesa pelos Trabalhadores, grupo com sede em Bangcoc. "É um desafio à exploração. Estes trabalhadores estão demonstrando que uma alternativa é possível", acrescentou.
A exploração nas fábricas de confecção foi uma característica da Tailândia por muitos anos, afirmou Wichai Narapaiboon, funcionário do novo Museu Tailandês do Trabalho. "Quanto menor é a tecnologia nas fábricas, maior é a exploração", afirmou. Com freqüência, os trabalhadores não conhecem seus direitos e, portanto, não podem reconhecer a exploração a que estão sujeitos. "Isto se agrava porque as leis nacionais não protegem os trabalhadores que tentam formar sindicatos em suas fábricas", afirmou Narapaiboon.
Atualmente, há cerca de 40 mil trabalhadores na indústria tailandesa do vestuário. Outros 65 mil trabalham em 741 fiações e 118.520 tecelagens. Em 2002, o valor das exportações de têxteis e roupas da Tailândia somou US$ 2,98 bilhões, segundo estudo feito por Junya. Kanchana e Sunee sabem que o caminho que iniciaram é torturoso, "mas se esta fábrica tiver sucesso, nos sentiremos orgulhosas, porque terá sido por nosso próprio esforço", disse Kanchana.