Brasília, 18/12/2003 (Agência Brasil - ABr) - Os futuros desafios para a melhoria das condições de saúde das populações dos países do terceiro mundo são enormes, principalmente levando-se em conta a grave situação econômica em que eles se debatem. Conscientizar a população da necessidade de cuidar da alimentação em bases saudáveis exige esforços do governo, da comunidade e de comunicação.
As pessoas devem entender a promoção da saúde como um processo, e não um passo, mesmo porque não há uma receita única para todos. Os processos podem ser diferenciados, dependendo dos distintos contextos dos países; mas, independentemente das variações, envolvem sempre a participação das pessoas, da comunidade em conjunto com os governantes, e tem como objetivo central à contribuição para a melhoria da qualidade de vida.
Construir uma vida saudável implica adotar certos hábitos - como é o caso da atividade física e da alimentação saudável -, enfrentar condições ou situações adversas e também estabelecer relações afetivas solidárias e cidadãs, estabelecendo uma postura de ser e estar no mundo com o objetivo de bem viver. Compreender a importância do estilo de vida para a saúde das pessoas é ampliar esta concepção de vida saudável e dar passos importantes neste caminho que nos leva à sua construção. É agir em favor de uma saúde que se faz e se melhora a cada dia. É promover saúde.
A professora Denise Coitinho, coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição da Universidade de Brasília (UnB), explica que, este ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) compôs um grupo de pesquisadores de vários países para desenvolver diretrizes para a promoção da saúde. "O documento, que já está pronto, proporciona um marco para elaborar uma estratégia mundial sobre a alimentação saudável, atividade física e saúde, de acordo com o enfoque integrado recomendado pela OMS para precaver e controlar as enfermidades crônicas", relata.
O documento, que será oficializado em maio de 2004, foi discutido e aprovado por todos os países participantes. Em Oxford, na Inglaterra, Denise participou recentemente de um congresso que foi o primeiro passo na direção para a instalação dessa estratégia. Participaram representantes de indústrias alimentícias, consumidores, fornecedores e pesquisadores. Os países que compareceram foram Brasil, China e África do Sul.
"Reunimos todas essas pessoas para implementar ações concretas e atribuir responsabilidades para os países no intuito de melhorar a qualidade de vida. Estabelecemos que é preciso mais controle na área de marketing e propaganda de alimentos e bebidas, principalmente naquelas voltada para as crianças. Para isso é necessário que cada país trabalhe com indústrias de alimento e agências de propaganda para estabelecer um novo marketing; mostrar a importância do trabalho da alimentação dentro do contexto escolar; trabalhar com as rotulagens (conteúdo e alegações saudáveis) para fornecer mais informações para o consumidor; estabelecer a importância sobre a política dos preços e impostos, dessa forma contribuindo para o consumidor balancear os alimentos; programas sociais, estilo do fome zero, devem priorizar a alimentação saudável; entre outros", explica Coitinho.
Ela diz que para que o programa dê certo é necessário que as indústrias também façam sua parte, mudando seu portifólio, diminuindo os ingredientes não saudáveis de seus alimentos, que o governo distribua recursos no sentido de aprimorar a qualidade da cesta básica, dando uma orientação maior e diversificando a dieta. "As pessoas de maior carência precisam de uma dieta balanceada, a cesta básica contribui para uma dieta monótona, com os mesmos alimentos. É necessário uma mensagem educativa para que a população não distorça a prioridade dos alimentos para a saúde", observa.
A estratégia mundial da OMS sobre "Alimentação saúdável, atividade física e saúde" tem como alvo orientar a nível local, nacional e internacional o desenvolvimento de atividades que, empreendidas conjuntamente, redundarão em melhoras quantificáveis do nível dos fatores de risco e reduzirão as taxas de morbidade e mortalidade da população acometida por enfermidades crônicas relacionadas com o regime alimentar e a atividade física.
Com a repercussão global da promoção da alimentação saudável, algumas indústrias alimentícias já fazem a sua contribuição. Um dos exemplo é dado pela multinacional Nestlé que coordena um programa que orienta o uso de sobras de verduras, por meio do voluntariado, na região de Belo Horizonte (MG). Este ano, a iniciativa foi premiado com o troféu Voluntários das Gerais. "Trabalhamos com receitas de aproveitamento integral dos alimentos, para que não se jogue nada fora", conta Amália Drumond, coordenadora do Comitê de Mobilização do Programa Nutrir.
O projeto, criado há dois anos, é desenvolvido uma vez por mês em escolas onde os multiplicadores do Nutrir passam um dia mostrado como aproveitar sobras de alimentos como casca de cenoura e laranja, de forma econômica e nutritiva. "Utilizamos todos os tipos de alimentos, como cereais e grãos, verduras, legumes, leites e derivados, carnes e ovos", conta Amália.
Outro exemplo é o da rede McDonald´s que vem modificando seu cardápio para ofertar pratos mais leves e nutritivos. "Quando o diretor da Sociedade de Pediatria de São Paulo assinou o programa de educação funcional com a rede de lanchonete, fiquei pensando como uma sociedade que promove uma alimentação saudável apoiaria uma rede de fast food. Mas acabei concordando com a posição do diretor, pois a empresa tem que fazer o marketing dela, mas cabe a população ter uma educação nutricional para selecionar", diz a nutricionista paulista Valéria Paschoal.
Um outro estudo que o Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição tem em andamento é a respeito das propagandas e da influência dos brindes na compra de produtos alimentícios para as crianças e na compra de salgadinhos. Janine Giuberti, nutricionista e integrante do Observatório, é a responsável pelo levantamento em Brasília. "Ainda existem poucos estudos que tratam do brinde como fator de influência na compra de alimentos. Os nacionais se referem muito a televisão e seus comerciais, já que esta atinge grande parte da população. Porém, é necessária a investigação de outras estratégias de marketing que podem, inclusive, estar atuando junto aos comercias de televisão", relata Jeanine.
Na pesquisa foi observado que nos salgadinhos quase a totalidade dos brindes tem como prioridade o público infantil. Já para os outros públicos, como adolescentes e adultos, têm-se outras estratégias motivacionais para a venda como promoções de viagens, prêmios específicos, maiores qualidades do alimento pelo mesmo preço, além dos comerciais de televisão serem direcionados a públicos específicos, selecionando atores de idade do público alvo em situações e ocasiões próprias para a idade. Jeanine destaca que "esta última estratégia reflete o desejo do fabricante do produto em identificá-lo com o personagem".
Valéria Paschoal complementa afirmando que a legislação nacional é bastante rigorosa nesse sentido. Ela proíbe qualquer ligação do produto com a saúde se não foi feita uma pesquisa científica com esse produto comprovada pelas escolas de medicina e Universidades Federais. "Não sai nenhuma informação nas embalagens sem que antes ela tenha sido confirmada", informa.
Janine conclui enfatizando que é de extrema importância e necessidade a intervenção da vigilância sanitária no processo de combate ao marketing apelativo, que tem prejudicado a saúde das crianças no que diz respeito a uma legislação que regule o uso dessas estratégias motivacionais de compra. "Os profissionais da área de saúde podem passar a se utilizar de estratégias já conhecidas e comprovadamente eficazes dos profissionais de marketing e propaganda para aumentar a aceitação dos alimentos mais saudáveis, como o uso dos próprios brindes que muitas vezes é tão atacado pelos pais", observa.