Presidente da Anamatra defende a modernização do Poder Judiciário

08/12/2003 - 16h16

Brasília, 8/12/2003 (Agência Brasil - ABr) - Em entrevista à Rádio Nacional, o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Grijalbo Coutinho, defendeu uma reforma processual para modernizar o Poder Judiciário. Segundo Coutinho, o Poder Judiciário precisa ser democratizado internamente. Coutinho disse ainda que a Anamatra continuará lutando para melhorar o Poder Judiciário, com democracia, transparência e independência. Ele também falou sobre morosidade, Conselho Nacional de Justiça, nepotismo e os atuais escândalos envolvendo magistrados.

P - Quais são as posições da Anamatra em relação aos variados temas que têm sido levantados em relação à Justiça? O que chama mais atenção, pelo menos para a sociedade, é sua lentidão. A gente houve muito falar do acúmulo de processos, da demora no andamento dos processos e muitas vezes as pessoas se sentem desestimuladas a lutar por um direito porque acham que vai demorar demais e não valerá a pena. Como a Anamatra vê esse tipo de problema?

R - Acho que a iniciativa do ministro Mauricio Correa (presidente do STF) é louvável, porque o Judiciário sempre esteve muito afastado da sociedade, sem ter um contato direto. Realmente o grande problema do Poder Judiciário é a morosidade, a demora. E como dizia Rui Barbosa, a demora significa muitas vezes a negação da Justiça. Você acabou de relatar que algumas pessoas chegam a desistir de levar suas pretensões por conta dessa demora. O que nós vamos esclarecer, nesse contato com a sociedade, é que essa demora decorre de fatos que não têm a participação do Poder Judiciário. Nos temos um sistema processual ultrapassado, arcaico, que permite a utilização de recursos e medidas de forma indefinida. Por exemplo, se uma das partes estiver acompanhada de um bom advogado poderá se valer de vários recursos e a ação irá demorar vários anos. O outro aspecto da morosidade é que a relação da população com o número de juízes no Brasil é muito pequena. Então, a gente precisa esclarecer à sociedade sobre esses fatos e também assumir nossa responsabilidade nas eventuais falhas. Os juízes têm que manter o contato com a sociedade para esclarecer sobre os reais problemas do Poder Judiciário nacional.

P - Então são vários fatores encadeados que acabam atrasando o andamento do processo. O senhor acha que teria uma solução em curto prazo para combater isso?

R - Acho que deve se fazer uma reforma processual urgente para se valorizar as decisões proferidas pela primeira instância. O recurso tem que passar a ser uma exceção e não uma regra geral. Esse é um aspecto. Também temos que melhorar o quadro de juízes e servidores. Para que os juízes possam fazer cumprir aquelas decisões de caráter urgente, precisamos ampliar as medidas cautelares e as medidas antecipatórias. E além do mais, o Poder Judiciário precisa se modernizar e ser democratizado. Criar uma democracia efetiva no Poder Judiciário e dar maior transparência. Essas são realmente falhas do Poder Judiciário. Não há democracia interna.

P - Em relação aos escândalos, eu acredito que como em qualquer profissão deve haver bons e maus profissionais, no Judiciário não deve ser diferente. Como a Anamatra vê isso?

R - Nós juízes temos um dever maior ainda. Somos nós que julgamos, então temos que dar o exemplo. São casos isolados, mas a Anamatra defende apuração rigorosa, punição, afastamento da magistratura e processo criminal. Não deve haver contemporização para os juízes que se desviam do seu caminho natural. A Anamatra tem uma postura de defesa intransigente da apuração de todos os desvios e irregularidades. E mais, deve haver uma punição mais severa para todos os membros de poder que cometerem qualquer, seja ele magistrado, deputado ou prefeito.

P - E quanto ao nepotismo, que é a contratação de parentes? Como está esta situação nos Tribunais do Trabalho?

R - Na Justiça do Trabalho existem alguns casos, cerca de 50 no Brasil. A Anamatra, nos últimos dois anos, tem denunciado ao Tribunal de Contas da União e à imprensa esses casos e com isso já conseguiu afastar cerca de 10 parentes de juízes contratados irregularmente. Estamos enfrentando algumas dificuldades para afastar todos, mas existe uma ação no Supremo Tribunal Federal e várias reclamações no Tribunal de Contas da União. E é aí que eu entro na questão da transparência. O Poder Judiciário precisa ser absolutamente transparente e romper com essas mazelas. Talvez a principal seja o nepotismo, mas também há também uma falta de democracia interna, só a cúpula que define as políticas do Poder Judiciário e não pode ser assim. Todos os juízes devem participar do orçamento, das questões administrativas e tem que dar esclarecimentos à sociedade e por isso a necessidade de criação de ouvidorias, que são fundamentais nesse processo de renovação do Poder Judiciário.

P - Em relação a uma fiscalização do Poder Judiciário. Qual é a posição da Anamatra?

R - Os juízes sempre repudiaram o controle externo, porque partem da premissa que as decisões judiciais poderiam ser afetadas por esse controle. Mas, na Anamatra, estamos discutindo uma idéia de um Conselho Nacional de Justiça democrático, formado por juízes de todas as instâncias e com a participação da sociedade civil. Esse Conselho teria como função principal gerenciar o Poder Judiciário do ponto de vista administrativo e orçamentário. Esse Conselho daria maior transparências às questões internas e externas. Essa é uma idéia que está sendo discutida e espero que consigamos fechar uma proposta. A independência dos Tribunais é importante, mas os atos devem ser praticados com transparência. A Anamatra continuará lutando para melhorar o Poder Judiciário. Há muito que fazer internamente e temos que dar o ponta pé inicial. Mudar o Poder Judiciário é uma necessidade.